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História
Eclesiástica de Eusébio de Cesaréia
Livro
II - Capítulos 3 a 7
III - De como a doutrina de Cristo em pouco tempo se
propagou por todo o mundo
IV - De
como, depois de Tibério, Caio estabeleceu Agripa como rei dos judeus
e
castigou Herodes com o desterro perpétuo
V - De
como Fílon foi embaixador junto a Caio em favor dos judeus
VI - Dos males que desabaram sobre os judeus depois de
sua maldade contra
Cristo
VII - De como Pilatos também se suicido
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III - De como a doutrina de Cristo em pouco tempo se propagou
por todo o mundo
1. Assim, sem dúvida por uma força e uma assistência de cima, a doutrina salvadora, como um
raio de sol, iluminou subitamente toda a terra habitada. De pronto, conforme as divinas Escrituras, a voz de seus
evangelistas inspirados e de seus apóstolos ressoou em toda a terra,
e suas palavras nos confins do mundo[1].
2. Efetivamente, por
todas as cidades e aldeias, como numa época fervilhante, constituíam-se em
massa igrejas formadas por multidões inumeráveis. Os que por herança ancestral
e por um antigo erro tinham suas almas presas da antiga moléstia da superstição
idólatra, pelo poder de Cristo e graças ao ensinamento de seus discípulos e aos
milagres que os acompanhavam, tendo rompidas suas penosas prisões,
afastaram-se dos ídolos como de amos terríveis e cuspiram fora todo o
politeísmo demoníaco e confessaram que não há mais do que
um só Deus: o criador de todas as coisas. E a este Deus honraram com os ritos
da verdadeira religião por meio de um culto divino e racional, o mesmo que
nosso Salvador semeou na vida dos homens.
3.
Pois bem, como quer que a graça divina já se difundisse pelas
demais nações, e em Cesaréia da Palestina Cornélio e toda sua casa haviam sido
os primeiros a aceitar a fé em Cristo por meio de uma aparição divina e do
ministério de Pedro, também em Antioquia ela foi aceita por toda uma multidão
de gregos aos quais haviam pregado os que foram dispersados quando da perseguição
contra Estevão[2].
A Igreja de Antioquia já florescia e se multiplicava quando, estando presentes
numerosos profetas chegados de Jerusalém[3],
e com eles Barnabé e Paulo, além de uma multidão de outros irmãos, pela
primeira vez o nome de Cristãos brotou dela, como de uma fonte caudalosa e
fecundante.
4.
Ágabo era também um dos profetas que estava com eles e
predizia como iminente uma grande fome, devido a isto Paulo e Barnabé foram
enviados para pôr-se a serviço da assistência aos irmãos"[4].
IV - De
como, depois de Tibério, Caio estabeleceu Agripa como rei dos judeus
e castigou Herodes
com o desterro perpétuo
1. Morreu pois Tibério depois de
reinar por cerca de vinte e dois anos. Depois dele tomou o poder Caio[5],
que em seguida pôs sobre Agripa a coroa do comando sobre os judeus, fazendo-o
rei das tetrarquias de Felipe e de Lisanias, às quais não muito depois juntou a
de Herodes, depois de condenar este (que era o Herodes do tempo da paixão do
Salvador), junto com sua mulher Herodías, ao desterro perpétuo por causa de
seus muitos crimes, Josefo também é testemunha destes fatos.
2.
Por este tempo tornava-se conhecido
por muitos um tal Fílon, varão notabilíssimo, não
somente entre os nossos mas também entre os que procediam de uma educação
profana. Descendia de família hebréia, mas não era em nada inferior aos que
brilhavam por sua autoridade em Alexandria.
3.
A extensão e a qualidade de seus trabalhos acerca das
ciências divinas pátrias se evidencia por
sua obra, e quanto a sua capacidade para os conhecimentos filosóficos e
os estudos liberais da educação profana, nada há que dizer quando a história dá
conta de seu cuidado especial pelo estudo da filosofia de Platão e de Pitágoras
ao ponto de suplantar todos seus contemporâneos.
V - De como
Fílon foi embaixador junto a Caio em favor dos judeus
1.
Fílon conta em cinco livros as
calamidades dos judeus nos tempos de Caio, e ao mesmo tempo
comenta a demência deste ao proclamar-se deus e cometer mil desmandos em seu governo, assim como as misérias dos judeus sob seu
império e a embaixada que a ele (Fílon) foi confiada na cidade de Roma em favor de seus
compatriotas de Alexandria. Descreve como se apresentou perante Caio em defesa das leis pátrias e como não conseguiu ao final
mais do que zombarias e sarcasmos, faltando pouco mesmo para perder sua
própria vida neste incidente.
2.
Estes fatos são também mencionados por Josefo no livro XVIII
de suas Antigüidades; escreve textualmente:
"E houve uma
revolta em Alexandria entre os judeus ali residentes e os gregos, e foram eleitos três embaixadores de cada
facção para apresentar-se perante Caio.
3.
Um dos embaixadores alexandrinos
era Ápion, que havia caluniado muito os judeus dizendo,
entre outras coisas, que viam com maus olhos o honrar a César, pois enquanto todos os que estavam submetidos à soberania de Roma construíam altares
e templos a Caio e em tudo o mais o equiparavam aos deuses, somente os judeus achavam indigno honrá-lo com estátuas e jurar
por seu nome.
4.
Muitas e graves acusações foram
proferidas por Ápion, naturalmente com a esperança de exaltar
o ânimo de Caio. Fílon, que presidia a embaixada dos judeus, homem ilustre em
tudo, irmão do alabarca[6] Alexandre e
hábil filósofo, tinha suficiente capacidade para lidar com as acusações em seu
discurso de defesa.
5.
Mas Caio interrompeu-o e ordenou que se retirasse para longe.
Estava irritadíssimo e era claro que
tomaria sérias medidas contra eles. Fílon saiu dali ultrajado e disse aos judeus de sua comitiva que precisariam ter
ânimo, que Caio havia se enfurecido contra eles, mas que na verdade
estava atentando contra Deus."
Até aqui Josefo.
6.
Mas o próprio Fílon, em sua obra Embaixada,
expõe com todos os detalhes e exatidão o que fez
na ocasião. Deixarei de lado quase tudo e citarei somente aquilo que ajude os leitores a ter uma prova manifesta das desventuras que
ao mesmo tempo ou em rápida seqüência caíram sobre os judeus por causa dos crimes contra
Cristo.
7. Narra pois, em primeiro lugar, que nos tempos de Tibério, Sejano, homem
então de grande ascendência e influência junto ao imperador, tomou muito a
sério a idéia de acabar por completo com a raça dos judeus na cidade de Roma; e que na
Judéia Pilatos, sob o qual havia sido cometido o crime contra o Salvador, havia atentado contra o templo, que ainda se erguia
em Jerusalém, de uma forma que ia contra o que está permitido aos
judeus, exacerbando-os terrivelmente.
VI - Dos males que desabaram sobre os judeus depois de sua
maldade contra
Cristo
1.
Fílon segue narrando que, depois da
morte de Tibério, Caio assumiu o poder e começou a cometer muitas atrocidades
contra muitos, mas sobretudo de forma a
prejudicar tanto quanto possível a toda a raça judia. Mas será melhor conhecer
isto brevemente por suas próprias obras, nas quais escreve textualmente:
2.
"Extraordinariamente
caprichoso era o caráter de Caio para com todos, mas muito especialmente contra a raça judia, à qual tinha um ódio implacável. Nas cidades,
começando por Alexandria, apoderou-se das sinagogas e encheu-as de imagens e estátuas com sua própria figura (pois ele que
permitia a outros erguê-las, também as erigia por seu próprio poder), e
na Cidade Santa o templo, que até então
saíra intacto por ser considerado digno de toda inviolabilidade, foi por
ele transformado em seu próprio templo, chamando-o: Templo de Caio, Novo Zeus
Epifano."
3.
O mesmo autor, num segundo livro
que escreveu, intitulado Sobre as virtudes, narra outras
inumeráveis e indescritíveis calamidades ocorridas aos judeus em Alexandria
nesta época. Com ele concorda também Josefo, ao notar igualmente que os
infortúnios que caíram sobre toda a raça judia tiveram início nos tempos de
Pilatos e dos crimes contra o Salvador.
4.
Mas ouçamos o que este declara
textualmente no livro II de sua Guerra dos
judeus quando diz:
judeus quando diz:
"Enviado por Tibério à Judéia como procurador, Pilatos
faz entrar durante a noite em Jerusalém, encobertas, as
efígies do César, as chamadas insígnias. Ao nascer o dia isto
produziu enorme comoção entre os judeus, que aproximando-se para ver, ficaram aterrorizados: suas leis tinham sido
pisoteadas, já que de forma alguma permitiam que na cidade se levantassem
imagens."
5.
Se comparamos tudo isto com a
Escritura do Evangelho, veremos que não tardaram muito para serem alcançados pelo
grito que proferiram em presença do próprio
Pilatos quando gritavam que não tinham outro rei que não o César[7].
6.
Mas há ainda outra calamidade que alcançou os judeus e que o
mesmo escritor narra em continuação como segue:
"E depois disto causou outra agitação quando esvaziou o tesouro
sagrado chamado Corbã, gastando-o para trazer as águas desde uma distância de trezentos estádios. Ante isto o povo enfureceu-se
e, quando Pilatos se apresentou em Jerusalém, rodearam-no vociferando a
uma só voz.
7.
Mas ele contava já com a agitação dos judeus e tinha ordenado
que se misturassem entre eles soldados
armados, camuflados com trajes do povo, proibidos de usarem as espadas,
mas com ordem de golpear com bastões os que
gritassem. De seu assento ele deu o sinal. Os judeus foram feridos, muitos
morreram sob os golpes e muitos foram esmagados pelos demais em fuga. A plebe,
impressionada pelo infortúnio dos caídos, emudeceu."
8. O mesmo autor faz
saber ainda que além destas ocorreram em Jerusalém muitas outras revoltas, afirmando que desde aquele tempo, nem na cidade
nem em toda a Judéia faltaram
sedições, guerras e maldosas tramas de uns contra outros, até que finalmente
chegou o assédio de Vespasiano. Assim é que a justiça divina alcançava
os judeus por seus crimes contra Cristo.
VII - De como Pilatos também se suicidou
1. Não se deve ignorar uma tradição que nos conta como também o
mesmo Pilatos dos dias do Salvador viu-se envolto em tão grandes calamidades
nos tempos de Caio - cuja época foi explicada -, que se viu forçado a suicidar-se e converter-se em carrasco de si
mesmo: a justiça divina, ao que parece, não tardou muito em alcançá-lo. Também os gregos que deixaram escritas as séries
de olimpíadas junto com os acontecimentos de cada época a isto se
referem.
O que mais te chamou a
atenção neste texto?
O que o texto contribui
para a sua espiritualidade?
* Este livro foi composto com extratos de
Clemente, de Tertuliano, de Josefo e de Fílon.
[1] Sl 18:5 (19:4); Rm 10:18.
[3] At 11:27.
[4] At 11:28-30.
[5] Caio
César Augusto Germânico, mais conhecido como Calígula.
[6]
Alabarca, arrecadador superior de impostos.
[7] Jo
19:15. Mas parece que Josefo indica que isto ocorreu pouco depois da chegada de
Pilatos, portanto antes da paixão.
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