quarta-feira, 27 de dezembro de 2023

246 - Hilário de Poitiers (315-368) - O Tratado da Santíssima Trindade - Livro Décimo Primeiro (Capítulos 35 - 46)

 

Na aula de hoje: 
Genisson, Demétrius, Leopoldo, Isaac, Rodrigo, Nathalye, Adriana, Marisa e Elonede.



246

Hilário de Poitiers (315-368)

O Tratado da Santíssima Trindade

Livro Décimo Primeiro (Capítulos 35 - 46)

 


O livro XI fala da diferença entre a humanidade e a divindade de Cristo e da glorificação da humanidade de Cristo e nossa glorificação juntamente com Ele. São 49 capítulos.

 

Capítulo 35.

1.      Deve-se entender o que se seguirá a esta submissão: O último inimigo a ser vencido será a Morte (1Cor 15,26).

2.      A vitória sobre a morte nada mais é do que a ressurreição dos mortos, quando, tendo acabado a corrupção da morte, a natureza se tornar eterna e celestial, como já foi dito: Com efeito, é necessário que este ser corruptível revista a incorruptibilidade e este ser mortal revista a imortalidade (1Cor 15,53).

3.      Quando este ser corruptível tiver revestido a incorruptibilidade e este ser mortal tiver revestido a imortalidade, então se cumprirá a palavra da Escritura: A morte foi absorvida no combate. Morte, onde está teu aguilhão? Morte, onde está teu combate? (1Cor 15,53-55).

4.      A morte é vencida pela submissão dos inimigos. Vencida a morte, sobrevém a vida da imortalidade. Qual seja a característica própria desta perfeita submissão da fé, o mesmo Apóstolo ensinou, ao dizer: Ele transfigurará nosso corpo humilhado, conformando-o ao corpo de sua glória, pela força que lhe dá o seu poder de submeter a si todas as coisas (Fl 3,21).

5.      Existe também outra submissão que consiste na passagem de uma natureza para outra, quando algo, deixando de ser o que é, se submete àquilo de que aceita a forma. Deixa de ser o que era, não para deixar de existir, mas para tornar-se melhor, submetendo-se, com a mudança, a passar para a condição da outra natureza que recebe.

 

Capítulo 36.

6.      Finalmente, para esclarecer totalmente o sentido deste mistério, depois de afirmar que a morte no fim será vencida, diz: Quando disser: “tudo lhe está submetido”, evidentemente excluir-se-á aquele que tudo lhe submeteu.

7.      Então, ele mesmo se submeterá àquele que tudo lhe submeteu, para que Deus seja tudo em todas as coisas (1Cor 15,26-28).O primeiro grau do mistério é que tudo lhe será submetido, e então Ele próprio se submeterá Àquele que lhe submeteu todas as coisas, para que, assim como nós nos submetemos à glória de seu corpo que reina, Ele, por sua vez, reinando, pelo mesmo mistério, na glória de seu corpo, se submeta àquele que lhe submeteu todas as coisas. Pois nos submetemos à glória de seu corpo para estar na mesma glória em que Ele reina com seu corpo, porque seremos conformados a seu corpo.

 

Capítulo 37.

8.      Os Evangelhos não deixam de falar da glória de seu corpo que agora reina. Assim está escrito o que disse o Senhor: Em verdade vos digo, que alguns dos que aqui estão não provarão a morte, até que vejam o Filho do Homem vir em seu Reino (Mt 16,28).

9.      Seis dias depois, Jesus tomou Pedro, Tiago e seu irmão João, e os levou para um lugar à parte, sobre uma alta montanha. E ali Jesus se transfigurou diante deles. O seu rosto resplandeceu como o sol, suas vestes se tornaram alvas como a neve (Mt 17,1-2).

10.  A glória do corpo que vem em seu reino se mostrou aos Apóstolos, pois, pela gloriosa transformação de seu aspecto, o Senhor revelou a glória de seu corpo de rei.

 

Capítulo 38.

11.  Prometendo aos Apóstolos uma participação na sua glória, diz o Senhor: Assim será na consumação do mundo. O Filho do Homem enviará seus anjos e eles ajuntarão de seu reino todos os escândalos e os que praticam a iniquidade, e os lançarão na fornalha ardente.

12.  Ali haverá choro e ranger de dentes. Então os justos brilharão como o sol no reino de seu Pai. O que tem ouvidos para ouvir, que ouça! (Mt 13,40-43).

13.  Acaso todos os ouvidos corporais não se abrem para ouvir o que é dito, de modo a ser necessária a exortação do Senhor para que o ouçam? O Senhor propõe o conhecimento do mistério e, por isso, exige que se ouça a doutrina de fé.

14.  Na consumação do mundo, os escândalos serão retirados de seu reino e teremos, então, o Senhor a reinar na glória de seu corpo. Também nós, conformados à glória de seu corpo no reino do Pai, brilharemos com um fulgor semelhante ao do sol. Foi com esta glória que o Senhor transfigurado no monte se mostrou aos Apóstolos.

 

Capítulo 39.

15.  O Senhor entregará o reino a Deus Pai, mas não de tal forma que, entregando-o, vá perder o seu poder, e nós, tornados semelhantes à glória de seu corpo, seremos o reino de Deus. Pois não disse: Entregará seu reino, mas: Entregará o reino (1Cor 15,24), o que significa que nós, pela glorificação de seu corpo, nos converteremos em reino a ser entregue a Deus. Entregará como reino também a nós, de acordo com o que foi dito nos Evangelhos: Vinde, benditos de meu Pai. Tomai posse do reino para vós preparado desde a criação do mundo (Mt 25,34). Portanto, os justos fulgirão como o sol no reino de seu Pai (cf. Mt 13,43).

16.  O Filho entregará a Deus, como seu reino, aqueles que chamou para seu reino, aos quais prometeu também a felicidade deste mistério, ao dizer: Bem-aventurados os puros de coração, porque eles verão a Deus (Mt 5,8).

17.  Reinando, afastará os escândalos, e, então, os justos fulgirão como o sol no reino do Pai, pois entregará o reino a Deus Pai, e aqueles que entregar como reino a Deus verão a Deus. De que reino se trata, Ele mesmo explicou, ao dizer aos Apóstolos: Pois em vós está o reino de Deus (Lc 17,21).

18.  Reinando, entrega o reino. E se alguém quiser saber quem entrega o reino, ouça: Cristo ressuscitou dos mortos, primícias dos que adormeceram; porque por um homem veio a morte, e por um homem, a ressurreição dos mortos (1Cor 15,21).

19.  Aqui todo nosso discurso tem como tema o mistério do corpo, porque Cristo ressuscitou como dentre os mortos. Para conhecermos o mistério pelo qual Cristo ressuscitou dentre os mortos, ouçamos o que diz o Apóstolo: Lembra-te de Jesus Cristo, ressuscitado dentre os mortos, da descendência de Davi (2Tm 2,8), ensinando que a morte e a ressurreição dizem respeito somente à Economia salvífica, pela qual Ele é carne.

 

Capítulo 40.

20.  Reina, pois, neste mesmo corpo glorioso, que já é seu, até que sejam eliminados os principados e, vencida a morte, submeta a si os inimigos. O Apóstolo conservou esta disposição: afirma que eliminados os principados e potestades, serão submetidos a Ele os inimigos. Submetidos estes, tudo se submeterá àquele que submete tudo a si, isto é, o Senhor, para que Deus seja tudo em todas as coisas (1Cor 15,28), quando a natureza da divindade paterna for comunicada à natureza de nosso corpo assumido.

21.  Deus será tudo em todas as coisas, porque o Mediador entre Deus e os homens, por sua submissão, receberá em todos os aspectos o que é de Deus, para que não seja Deus em parte, mas inteiramente Deus Ele que, pelo mistério da Encarnação, procede de Deus e do homem, pois tem, graças à Encarnação, o que é próprio da carne.

22.  Não há outro motivo para a submissão a não ser este: que Deus seja tudo em todas as coisas, sem que permaneça coisa alguma da natureza do corpo terreno, de modo que, se anteriormente tinha duas naturezas, agora é somente Deus; não porque o corpo tenha sido expulso, mas sim porque foi transformado pela submissão.

23.  Não foi abolido por dissolução, mas mudado pela glorificação, adquirindo para si, enquanto Deus, o que é do homem, em vez de perder o que é de Deus, enquanto é Homem. Submete-se, não para deixar de existir, mas para que Deus seja tudo em todas as coisas. Continua a ser o que não é no mistério da submissão. Seu ser não será abolido, de modo que deixe de existir.

 

Capítulo 41.

24.  Para confirmar a nossa fé nesta doutrina, é suficiente a autoridade apostólica, que ensina que, no tempo e pelo mistério da Encarnação, o Senhor Jesus Cristo, primícias dos que dormiram (cf. 1Cor 15,20), deveria submeter-se ao Pai, para Deus ser tudo em todas as coisas. Isto não se dá por fraqueza da divindade, mas representa elevação da natureza assumida porque o que é Homem Deus, agora já é inteiramente Deus.

25.  Mas para que não se creia que nos fundamentamos nos Evangelhos porque acreditamos que Cristo é glorificado no corpo enquanto reina no corpo e que depois deverá se submeter, a fim de que Deus seja tudo em todas as coisas, devemos basear o testemunho de nossa fé não somente nas palavras do Apóstolo, mas nas do Senhor, pois o que Paulo diz, o próprio Cristo já dissera antes de Paulo.

 

Capítulo 42.

26.  O Senhor revelou o desígnio divino referente à glória usando palavras claras, quando disse: Agora o Filho do Homem foi glorificado e Deus foi glorificado nele. Se Deus foi nele glorificado, Deus também O glorificará em si mesmo e o glorificará logo (Jo 13,31-32).

27.  Temos, primeiro, a glória do filho do homem e, em seguida, no Filho do Homem, a glória de Deus, nas palavras; Agora o Filho do Homem foi glorificado e Deus foi glorificado nele. Em primeiro lugar, refere-se à glória do corpo, que, pelo consórcio com a natureza divina, recebe a glória. Segue-se a elevação a uma glória mais plena que deve ser alcançada com o aumento da glória já concedida ao corpo. Se Deus foi nele glorificado, também Deus o glorificou em si mesmo e agora o glorificou (Jo 13,32).

28.  Deus o glorificou em si, porque nele Deus é glorificado. Porém, a glorificação de Deus nele se refere à glória do corpo, pela qual a glória de Deus é conhecida através do corpo, pois a glória de Deus é conhecida mediante a glória do Filho do Homem. Porque nele Deus foi glorificado, isto significa que Deus o glorificou em si mesmo mediante o aumento da glória de Deus nele, porque já reina na glória que procede da glória de Deus.

29.  Ele próprio, a partir de agora, há de passar para a glória de Deus. Pois Deus o glorificou em si mesmo, isto é, naquela mesma natureza pela qual Deus é o que é: para que Deus seja tudo em todas as coisas, ou seja, Ele há de existir inteiramente como Deus, em consequência da economia da salvação, pela qual é homem. Não deixou de falar também do tempo, em que isto ia acontecer, ao dizer: E Deus o glorificou em si mesmo e Deus agora o glorificou.

30.  Indicou como presente a glória futura, ou seja, a que iria obter depois da paixão, depois da ressurreição, porque Judas já se apressava para a traição. Aquela glória com que, em si mesmo, Deus o glorificaria, é reservada para o futuro, isto é, a glória de Deus revelada nele pelo poder da ressurreição. Porém, Ele mesmo permanecerá para sempre na glória de Deus, sendo inteiramente Deus, em virtude do desígnio salvífico, pelo qual se submeteu.

 

Capítulo 43.

31.  Como é grande a insensatez da louca heresia, que não pode esperar para Deus o que satisfaz suas humanas esperanças, como se Deus tivesse o poder de fazer para o homem o que não tem o poder de fazer para si mesmo.

32.  Nenhum raciocínio sensato pode provar que, por alguma necessidade de sua natureza, esteja obrigado a cuidar de nós, mas não possa proporcionar alguma felicidade a si mesmo.

33.  Aquele que possui uma natureza e um poder imutáveis não tem necessidade de crescimento, mas, porque, pela economia da salvação e o mistério da grande piedade, o que é Deus é homem, talvez não fosse capaz de dar a si mesmo o ser inteiramente Deus, podendo, no entanto, dar-nos, sem dúvida alguma, a graça de ser aquilo que não somos. Pois o fim da vida e da morte humana é a ressurreição e a certíssima recompensa de nossa luta é a incorrupta eternidade, não para que perdure nosso castigo, mas para que o fruto feliz da perpétua glória não tenha fim.

34.  Que nossos corpos, de origem terrena, passarão para uma condição superior e se tornarão semelhantes ao corpo glorioso do Senhor, e Deus, na forma de servo, embora já glorificado no corpo, no que diz respeito a forma de servo, acaso não será semelhante a Deus? Aquele que nos concederá a condição de seu corpo glorificado acaso não poderá dar a seu corpo senão o que é comum a Ele e a nós?

35.  O que foi dito: Então ele mesmo se submeterá àquele que lhe submeteu todas as coisas para que Deus seja tudo em todas as coisas (1 Cor 15,28) é interpretado por muitos hereges como se fosse a afirmação de que o Filho deve submeter-se a Deus Pai, a fim de que o Pai, pela submissão do Filho, seja tudo em todas as coisas, como se ainda faltasse a Deus alguma perfeição que alcançaria pela submissão do Filho.

36.  Assim, se Deus ainda deve passar a ser tudo em todas as coisas com o progredir do tempo, devemos pensar que lhe falta a absoluta e bem-aventurada divindade.

 

Capítulo 44.

37.  Quanto a mim, que acredito conhecer a Deus somente pela adoração, não me parece menos ímpio responder a estas doutrinas do que defendê-las. Parece-me ímpio pensar que podemos fazer afirmações sobre aquela natureza, que ultrapassa o que o senso humano pode conceber, com palavras cujo significado fica aquém da nossa compreensão.

38.  Em primeiro lugar, parece ímpio duvidar da perfeição de Deus, perguntando se lhe falta algo ou não, se é perfeito ou, se, sendo perfeito, falta-lhe ainda uma perfeição maior.

39.  Se Deus, a quem não vem de nenhuma outra parte o ser Deus, deve progredir de alguma forma, para que, em algum momento, possa chegar a uma perfeição maior, então nunca poderá atingir uma perfeição tal que nada lhe falte, pois não se pode conceber que a natureza que tem a possibilidade de progredir tenha progredido sem que lhe reste alguma possibilidade de progresso, pois a natureza submetida ao progresso, embora progredindo sempre, continua sendo capaz de progredir mais.

40.  Porém, aquele que tem a plenitude perfeita e nela permanece, não tem possibilidade de ser mais perfeito, porque a perfeita plenitude não comporta acréscimo. Assim deve pensar sobre Deus uma inteligência piedosa. A Deus nada falta. Ele é perfeito.

 

Capítulo 45.

41.  O Apóstolo não ignora com que palavras se deve dar testemunho de Deus, quando diz: Ó abismo da riqueza, da sabedoria e da ciência de Deus! Como são insondáveis seus juízos e impenetráveis seus caminhos! Quem, com efeito, conheceu o pensamento do Senhor? Ou quem se tornou seu conselheiro? Ou quem primeiro lhe fez o dom para receber em troca? Porque tudo é dele, por ele e para ele. A ele a glória pelos séculos! (Rm 11,33-36).

42.  Deus não pode ser circunscrito pela mente humana. A inteligência mais penetrante não pode atingir a profundeza de sua sabedoria. Seus juízos não podem ser compreendidos por aqueles que os perscrutam. Os caminhos inacessíveis de seu conhecimento não estão abertos às investigações dos que o procuram. Tudo o que é seu está mergulhado nas profundezas inacessíveis, nada do que é seu pode ser encontrado.

43.  Ninguém conhece seu pensamento. Ele dispensa todo conselho alheio. Tudo o que dizemos é válido para nós, mas não para aquele, por quem tudo existe (cf. 1Cor 8,6). Ele é o Anjo do Grande Conselho (cf. Is 9,6; LXX), e Ele disse: Ninguém conhece o Filho, senão o Pai, e ninguém conhece o Pai, senão o Filho e a quem o Filho o quiser revelar (Mt 11,25).

44.  Deve-se recorrer à profissão de fé do Apóstolo contra nossas fraquíssimas mentes, que, para definir e circunscrever a natureza divina, submergem nas profundezas, para que nenhuma opinião temerária pretenda saber algo sobre Deus além daquilo que devemos aprender.

 

Capítulo 46.

45.  É considerado normal, quando se trata de coisas que pertencem à natureza, que os sentidos só possam captar o que se acha no seu âmbito, como algo que se apresente diante de nossos olhos, ou qualquer fato posterior a nossos sentidos ou a nossa mente.

46.  No primeiro caso, porque o que se pega ou olha permite ter uma ideia e formular uma opinião a respeito do que pode ser examinado pelo tato ou pela vista. No outro caso, porque o que acontece no tempo é gerado ou criado, com um início posterior ao nosso, não é anterior ao nosso entendimento e está submetido a nossa capacidade de julgamento.

47.  Nossa vista não julga o invisível, já que somente pode discernir o que vê. Nossa mente não pode voltar atrás, até o tempo em que não existia, e investigar o que é anterior a seu nascimento, já que somente pode ter uma opinião a respeito do que lhe é posterior. Por causa de suas limitações naturais, nossa mente, na maior parte das vezes, está incerta e não consegue obter um conhecimento exato das causas.

48.  De modo algum poderá perceber aquelas coisas que lhe são anteriores, por um desígnio eterno, pois nesse caso deveria poder retroceder até um tempo anterior ao seu nascimento.

 

 

O que você destaca na fala do seu irmão?

O que você destaca no texto?

Como ele serve para a sua espiritualidade?

 

 

 

 

domingo, 17 de dezembro de 2023

246 - Estudo Especial para o Natal 2023 - 800 anos do Presépio de Greccio e o Natal Franciscano.

 



246
800 anos do Presépio de Greccio

e o Natal Franciscano

“Uma alegria nunca vivida” em Greccio, no Natal de 1223.

 

Francisco prepara um presépio no dia de Natal.


1.      Sua maior aspiração, seu mais vivo desejo e mais elevado propósito era observar o Evangelho em tudo e por tudo, imitando com perfeição, atenção, esforço, dedicação e fervor os "passos de Nosso Senhor Jesus Cristo no seguimento de sua doutrina".

2.      Estava sempre meditando em suas palavras e recordava seus atos com muita inteligência. Gostava tanto de lembrar a humildade de sua encarnação e o amor de sua paixão, que nem queria pensar em outras coisas.

3.      Precisamos recordar com todo respeito e admiração o que fez no dia de Natal, no povoado de Greccio, três anos antes de sua gloriosa morte.

4.      Havia nesse lugar um homem chamado João, de boa fama e vida ainda melhor, a quem São Francisco tinha especial amizade porque, sendo muito nobre e honrado em sua terra, desprezava a nobreza humana para seguir a nobreza de espírito.

5.      Uns quinze dias antes do Natal, São Francisco mandou chamá-lo, como costumava fazer, e disse: "Se você quiser que celebremos o Natal em Greccio, é bom começar a preparar diligentemente e desde já o que eu vou dizer.

6.      Quero lembrar o menino que nasceu em Belém, os apertos que passou, como foi posto num presépio, e contemplar com os próprios olhos como ficou em cima da palha, entre o boi e o burro".

7.      Ouvindo isso, o homem bom e fiel correu imediatamente e preparou no lugar indicado o que o santo tinha pedido.

8.      E veio o dia da alegria, chegou o tempo da exultação. De muitos lugares foram chamados os irmãos. Homens e mulheres do lugar, coração em festa, prepararam como puderam tochas e archotes para iluminar a noite que tinha iluminado todos os dias e anos com sua brilhante estrela.

9.      Por fim, chegou o santo e, vendo tudo preparado, ficou satisfeito.

10.  Fizeram um presépio, trouxeram palha, um boi e um burro. Greccio tornou-se uma nova Belém, honrando a simplicidade, louvando a pobreza e recomendando a humildade.

11.  A noite ficou iluminada como o dia: era um encanto para os homens e para os animais.

12.  O povo foi chegando e se alegrou com o mistério renovado em uma alegria toda nova. O bosque ressoava com as vozes que ecoavam nos morros. Os frades cantavam, dando os devidos louvores ao Senhor e a noite inteira se rejubilava.

13.  O santo estava diante do presépio a suspirar, cheio de piedade e de alegria. A missa foi celebrada ali mesmo no presépio, e o sacerdote sentiu uma consolação jamais experimentada.

14.  O santo vestiu dalmática, porque era diácono, e cantou com voz sonora o santo Evangelho.

15.  De fato, era "uma voz forte, doce, clara e sonora", convidando a todos às alegrias eternas. Depois pregou ao povo presente, dizendo coisas doces como o mel sobre o nascimento do Rei pobre e sobre a pequena cidade de Belém.

16.  Muitas vezes, quando queria nomear Cristo Jesus, chamava-o também com muito amor de "menino de Belém", e pronunciava a palavra "Belém" como o balido de uma ovelha, enchendo a boca com a voz e mais ainda com a doce afeição.

17.  Também estalava a língua quando falava "menino de Belém" ou "Jesus", saboreando a doçura dessas palavras.

18.  Multiplicaram-se nesse lugar os favores do Todo-Poderoso, e um homem de virtude teve uma visão admirável. Pareceu-lhe ver deitado no presépio um bebê sem vida, que despertou quando o santo chegou perto.

19.  E essa visão veio muito a propósito, porque o menino Jesus estava de fato esquecido em muitos corações, nos quais, por sua graça e por intermédio de São Francisco, ele ressuscitou e deixou a marca de sua lembrança.

20.  Quando terminou a vigília solene, todos voltaram contentes para casa.

21.  O presépio foi consagrado a um templo do Senhor e no próprio lugar da manjedoura construíram um altar... e dedicaram uma igreja, para que, onde os animais já tinham comido o feno, passassem os homens a se alimentar, para salvação do corpo e da alma, com a carne do cordeiro imaculado e incontaminado, Jesus Cristo nosso Senhor, que se ofereceu por nós com todo o seu inefável amor e vive com o Pai e o Espírito Santo eternamente glorioso por todos os séculos dos séculos. Amém. Aleluia, Aleluia.

Tomás de Celano PRIMEIRA VIDA DE SÃO FRANCISCO: L.1, C.30.

 

O Natal do Menino de Belém, fazendo-se menino com o Menino.

22.  O santo gostava de morar no eremitério dos frades em Greccio, tanto porque achava rica a sua pobreza como porque podia entregar-se com maior liberdade aos exercícios espirituais numa pequena cela construída na ponta de um rochedo.

23.  Foi nesse lugar que recordou pela primeira vez o Natal do Menino de Belém, fazendo-se menino com o Menino.

Tomás de Celano SEGUNDA VIDA DE SÃO FRANCISCO: L.5, C.7.

 

Devoção ao Natal do Senhor. Como quer que atendam a todos nesse dia

24.  Celebrava com incrível alegria, mais que todas as outras solenidades, o Natal do Menino Jesus, pois afirmava que era a festa das festas, em que Deus, feito um menino pobrezinho, dependeu de peitos humanos.

25.  Beijava como um esfomeado as imagens dessa criança, e a derretida compaixão que tinha no coração pelo Menino fazia até com que balbuciasse doces palavras como uma criancinha. Para ele, esse nome era como um favo de mel na boca.

26.  Certa vez em que os frades discutiam se podiam comer carne porque era uma sexta-feira, disse a Frei Morico: "Irmão, cometes um pecado chamando de sexta-feira o dia em que o Menino nasceu para nós.

27.  Quero que nesse dia até as paredes comam carne. Se não podem, pelo menos sejam esfregadas com carne!" Queria que, nesse dia, os pobres e os esfomeados fossem saciados pelos ricos, e que se concedesse uma ração maior e mais feno para os bois e os burros.

28.  Até disse: "Se eu pudesse falar com o imperador, pediria que promulgasse esta lei geral: que todos que puderem joguem pelas ruas trigo e outros cereais, para que nesse dia tão solene tenham abundância até os passarinhos, e principalmente as irmãs cotovias".

29.  Não podia recordar sem chorar toda a penúria de que esteve cercada nesse dia a pobrezinha da virgem.

30.  Num dia em que estava sentado a almoçar, um dos frades lembrou a pobreza da virgem bem-aventurada e as privações de Cristo seu Filho. Ele se levantou imediatamente da mesa, soltou dolorosos soluços e comeu o resto de pão no chão nu, banhado em lágrimas.

 

Tomás de Celano SEGUNDA VIDA DE SÃO FRANCISCO: L.33, C.4.

 

Como pretendeu persuadir o imperador a editar um decreto que no dia de Natal os homens alimentassem generosamente as aves, o boi, o asno e os pobres

31.  Nós que vivemos com São Francisco e escrevemos estas palavras, somos testemunhas de que o ouvimos dizer várias vezes: "Se eu pudesse falar com o imperador, suplicar-lhe-ia que editasse, por amor de Deus, uma lei proibindo se capturarem ou matarem nossas irmãs cotovias, ou lhes causarem qualquer mal.

32.  E ordenando ainda que todos os prefeitos das cidades e todos os senhores de burgos e aldeias fossem compelidos todos os anos, no dia de Natal, a obrigarem o povo a lançar trigo e outros grãos pelos caminhos, fora das vilas e dos burgos para que nossas irmãs cotovias tivessem o que comer, como também as outras aves, em tão grande dia de festa".

33.  E por respeito para com o Filho de Deus a quem nesta noite a Santíssima Virgem deu à luz numa manjedoura entre o boi e o asno, que quem quer que possuísse um destes animais deveria alimentá-lo generosamente nesta mesma noite.

34.  Do mesmo modo, neste dia os pobres deveriam ser abundantemente providos pelos ricos. E porque tinha um grande respeito pela Natividade de Nosso Senhor, como pelas outras solenidades, costumava dizer: "Depois que o Senhor nasceu por nós, urgia que fôssemos salvos".

35.  Era, pois, seu desejo que neste dia todos os cristãos se alegrassem no Senhor e, por amor daquele que se deu a si mesmo por nós, todos demonstrassem grande liberalidade, não somente com os pobres, mas também com os animais e as aves.

ESPELHO DE PERFEIÇÃO: L.11, C.3.

 

Natal de Clara

36.  Como ela se lembrava de seu Cristo na doença, Cristo também a visitou em seus sofrimentos.

37.  Na hora do Natal, em que o mundo se alegra com os anjos diante do Menino recém-nascido, todas as senhoras foram à capela para as Matinas, deixando a madre sozinha, oprimida pela doença.

38.  Ela começou a meditar sobre o pequenino Jesus e, sofrendo muito por não poder assistir seus louvores, suspirou: "Senhor Deus, deixaram-me aqui sozinha para Vós".

39.  E eis que de repente começou a ressoar em seus ouvidos o maravilhoso concerto que se desenrolava na igreja de São Francisco. Escutava o júbilo dos irmãos salmodiando, ouvia a harmonia dos cantores, percebia até o som dos instrumentos.

40.  O lugar não era tão próximo que pudesse chegar a isso humanamente: ou a solenidade tinha sido amplificada até ela pelo poder divino, ou seu ouvido tinha sido reforçado de modo sobre-humano.

41.  Mas o que superou todo esse prodígio foi que mereceu ver o próprio presépio do Senhor.

42.  Quando as filhas vieram, de manhã, disse a bem-aventurada Clara: "Bendito seja o Senhor Jesus Cristo, que não me deixou quando vocês me abandonaram. Escutei, por graça de Cristo, toda a solenidade celebrada esta noite na igreja de São Francisco".

Tomás de Celano. A LEGENDA DA VIRGEM SANTA CLARA: L.1, C.18.

 

Como, estando enferma, Clara foi miraculosamente transportada, na noite de Natal, à igreja de São Francisco e aí assistiu ao ofício

43.  Estando uma vez S. Clara gravemente enferma, tanto que não podia ir dizer o oficio na igreja com as outras freiras, chegando a solenidade da Natividade de Cristo, todas as outras foram a Matinas; e ela ficou sozinha no leito, malcontente por não poder juntamente com as outras ir- e ter aquela consolação espiritual.

44.  Mas Jesus Cristo, seu esposo, não querendo deixá-la assim desconsolada, fê-la miraculosamente transportar à igreja de S. Francisco e assistir a todo o ofício e à missa da meia-noite; e além disto, receber a santa comunhão e depois ser trazida ao leito.

45.  Voltando as freiras para junto de S. Clara, acabado o oficio em S. Damião, disseram-lhe: "Ó nossa mãe, Soror Clara, que grande consolação tivemos nesta noite de santa Natividade! Prouvesse a Deus que houvésseis estado conosco!"

46.  E S. Clara responde: "Graças e louvores rendo ao meu Senhor Cristo bendito, irmãs minhas e filhas caríssimas; porque a todas as solenidades desta santíssima noite e maiores do que as que assististes, assisti eu com muita consolação de minha alma; porque, por procuração do meu Pai S. Francisco e pela graça de meu Senhor Jesus Cristo, estive presente na igreja do meu Pai S. Francisco; e com as minhas orelhas corporais e mentais ouvi o canto e o som dos órgãos que aí tocaram; e lá mesmo recebi a santa comunhão.

47.  E por tanta graça a mim concedida rejubilai-vos e agradecei a Nosso Senhor Jesus Cristo". Amém.

OS FIORETTI DE S. FRANCISCO DE ASSIS: C.35.

 


O que você destaca no texto?

Como ele serve para a espiritualidade do nosso Natal?

Destaca a fala do seu irmão.