segunda-feira, 29 de outubro de 2018

70 - Irineu de Lyon (130-202) Demonstração da Pregação Apostólica (Cap. 47 - 55)


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70
Estudo sobre os Pais da Igreja: Vida e Obra
Irineu de Lyon (130-202)
Demonstração da Pregação Apostólica (Cap. 47 - 55)


Trindade e criação
47. O Pai, então, é Senhor, e o Filho é Senhor, Deus o Pai e Deus o Filho, porque aquele que é nascido de Deus é Deus. Assim, segundo a essência do seu ser e de seu poder, aparece um só Deus; mas, contemporaneamente, na administração da economia da nossa redenção, Deus aparece como Pai e como Filho. E como o Pai do universo é invisível e inacessível aos seres criados, é através do Filho que os destinados a aproximarem-se de Deus devem conseguir o acesso ao Pai. Davi, com clareza e evidência, assim se exprimiu a propósito do Pai e do Filho: “Teu trono é de Deus, para sempre e eternamente! O cetro do teu reino é cetro de retidão! Amas a justiça e odeias a impiedade. Eis por que Deus, o teu Deus, te ungiu com o óleo da alegria, como a nenhum dos teus companheiros”. Isso significa que o Filho, enquanto Deus, recebe do Pai, isto é, de Deus, o trono de um reino eterno e o óleo da unção, mais que os seus companheiros. O óleo é a unção do Espírito Santo com a qual é ungido, e os seus “iguais” são os profetas, os justos, os apóstolos, e todos os que participam do Reino.

O primado e a realeza de Cristo
48. Davi disse, por sua vez: “Oráculo de Iahweh ao meu Senhor: ‘Senta-te à minha direita, até que eu ponha teus inimigos como escabelo de teus pés’. De Sião Iahweh estende teu cetro poderoso para dominares teus inimigos. A ti o principado no dia do teu nascimento, as honras sagradas desde o seio, desde a aurora da tua juventude; Iahweh jurou e jamais desmentirá: ‘Tu és sacerdote para sempre, segundo a ordem de Melquisedec’. O Senhor está à tua direita, ele esmaga os reis no dia da sua ira. Ele julga as nações, amontoa cadáveres, esmaga cabeças pela imensidão da terra. A caminho ele bebe da torrente, e por isso levanta a cabeça”. Assim, com essas palavras, declarou que primeiro veio à existência, que dominava as nações, que julga todos os homens e os reis que o odeiam agora e perseguem o seu nome, e que são os seus inimigos. Chamando-o “sacerdote para sempre” de Deus, declara a sua imortalidade. Tendo dito: “A caminho ele bebe da torrente, por isso levanta a cabeça”, se referia à exaltação gloriosa, depois da sua condição humana, da humilhação e da abjeção.
49. Por sua vez, o profeta Isaías afirma: “Assim diz Iahweh ao seu ungido, a Ciro que tomei pela destra, a fim de subjugar a ele nações”. Quanto ao fato de que o Filho de Deus é chamado “Ungido” e rei das nações, isto é, de todos os homens, Davi repete que Ele é, e é chamado Filho de Deus e rei de todos, nestes termos: “Ele me disse: ‘Tu és o meu Filho, eu hoje te gerei. Pede, e eu te darei as nações como herança, os confins da terra como propriedade’”. Essas palavras não foram pronunciadas referindo-se a Davi, porque não governou todas as nações, nem toda a terra, mas somente os judeus. É, portanto, evidente que a promessa feita ao Ungido de reinar sobre toda a terra se refere ao Filho de Deus, que o próprio Davi reconhece seu Senhor: “Disse o Senhor ao meu Senhor: ‘senta-te à minha direita...’”, como já nos referimos. Com efeito, isso significa que o Pai conversava com o Filho, como acima demonstramos a propósito de Isaías, que dizia: “Assim fala o Senhor ao Ungido, meu Senhor: ‘As nações lhe obedeçam’”. Idêntica promessa aparece em ambos os profetas: “Ele será rei”. Consequentemente, a uma só e mesma Pessoa são dirigidas as palavras de Deus, ou seja, a Cristo, o Filho de Deus. Do momento em que Davi disse: “O Senhor me disse”, é necessário afirmar que nem Davi, nem outro profeta falam por iniciativa própria, pois não é um homem que profere as profecias, mas o Espírito de Deus, o qual, tomando figura e forma semelhante às pessoas interessadas, falava através dos profetas e discorria ora em nome do Filho, ora em nome do Pai.

A preexistência de Cristo
50. A propósito, Cristo afirma, por meio de Davi, que o Pai se dirige a ele, e por meio dos profetas disse o mesmo, como, por exemplo, em Isaías, que escreveu: “Mas agora disse Iahweh, aquele que me modelou desde o ventre materno para ser seu servo, para reconduzir Jacó a ele, para que a ele se reúna Israel; assim serei glorificado aos olhos de Iahweh, meu Deus será minha força! Sim, ele disse: ‘Pouca coisa é que sejas o meu servo para restaurar as tribos de Jacó e reconduzir os sobreviventes de Israel. Também te estabeleci como luz das nações, a fim de que a minha salvação chegue até as extremidades da terra”.

51. Antes de tudo, do colóquio do Pai com o Filho resulta a preexistência do Filho de Deus, e o fato de que, ainda antes do nascimento, o Pai o fez visível aos homens; depois, antes de nascer, que seria tornado homem nascido de homens, que Deus mesmo o teria plasmado no seio, isto é, que seria nascido pelo Espírito de Deus, que é Senhor de todos os homens e Salvador daqueles que nele creem, dos judeus e dos outros. “Israel”, de fato, é o nome do povo judeu em língua hebraica, nome que vem do patriarca Jacó, que antes fora chamado “Israel”. Chama “gentios” a todos os outros homens. O Filho chama a si próprio servo do Pai por causa da sua obediência ao Pai, pois todo filho, também entre os homens, é servo de seu pai.
52. Que o Cristo, Filho de Deus existente antes do mundo, seja com o Pai e junto do Pai e, contemporaneamente, seja vizinho aos homens e em íntima comunhão com eles, rei do universo, pois o Pai lhe submeteu tudo, e o fez Salvador daqueles que nele creem, é a mensagem de semelhantes textos da Escritura. Porque não é nossa intenção, e não está nas nossas possibilidades, pôr em concordância todos os textos bíblicos, mas, com o auxílio daqueles citados, poderá compreender também os demais que falam da mesma maneira, a fim de que creia em Cristo e peça a Deus a sabedoria e a inteligência para compreender o que foi dito pelos profetas.

O sinal profético de Acaz
53. Que esse Cristo, que estava junto do Pai, sendo o Verbo do Pai, deveria encarnar-se, tornar-se homem, submeter-se à geração e ao nascimento de uma Virgem e viver entre os homens, intervindo também o Pai do universo para realizar a sua encarnação, é o que expressa Isaías: “Pois sabei que o Senhor mesmo vos dará um sinal: Eis que a jovem está grávida e dará à luz um filho e dar-lhe-á o nome de Emanuel. Ele se alimentará de coalhada e de mel, até que saiba rejeitar o mal e escolher o bem. Com efeito, antes que o menino saiba rejeitar o mal e escolher o bem, a terra, por cujos dois reis tu te apavoras, ficará reduzida a ermo”. Indicou que nasceria de uma virgem. Significou que seria verdadeiro homem pelo fato de comer, por ser chamado “criança” e por receber um nome. Tudo isso se refere ao recém-nascido. Em língua hebraica, possui um duplo nome: Messias-Cristo e Jesus Cristo. Esses dois nomes indicam as obras que haveria de realizar. Com efeito, recebeu o nome de Cristo (Ungido) porque o Pai, por seu intermédio e em vista de sua vinda como homem, ungiu e ordenou cada coisa, porque foi ungido pelo Espírito de Deus, seu Pai, como disse, falando de si próprio, em Isaías: “O Espírito do Senhor Iahweh está sobre mim, porque Iahweh me ungiu. Enviou-me a anunciar a Boa-Nova aos pobres”.[143] E o nome de “Salvador”, porque é a causa de salvação para todos os que, desde então, foram libertados por ele de toda enfermidade e da morte; e para os que haveriam de crer depois deles, é também o doador da salvação eterna.

O Emanuel
54. Eis por que é chamado “Salvador”. “Emanuel” se traduz por “Deus-conosco”, ou como expressão de bom desejo formulado pelo profeta “Deus esteja conosco”. Desse modo, Ele é a interpretação e a revelação da “Boa-Nova”. Por isso disse: “Eis que a virgem conceberá e dará à luz um filho”. É ele que, sendo Deus, tem o destino de estar conosco. É, ao mesmo tempo, maravilhado por tal acontecimento; [Isaías] anunciou o que acontecerá, ou seja, que “Deus estará conosco”. E também, com relação a seu nascimento, o mesmo profeta diz em outra passagem: “Antes de sentir as dores do parto, ela deu à luz; antes de lhe sobrevirem as contrações, ela pôs no mundo um menino”, proclamando assim o caráter inesperado e paradoxal do nascimento da Virgem. O mesmo profeta repetiu: “Porque um menino nos nasceu, um filho nos foi dado, ele recebeu o poder sobre seus ombros, e lhe foi dado este nome: Conselheiro maravilhoso, Deus-forte, Pai-eterno, Príncipe da paz”.

O conselheiro admirável
55. [Isaías] o chama “conselheiro admirável”, também ao Pai, indicando assim que o Pai criou com ele todas as coisas, como se diz no primeiro livro de Moisés, intitulado “Gênesis”: “Deus disse: ‘Façamos o homem à nossa imagem, como nossa semelhança”. Aqui visivelmente fala o Pai ao Filho, como seu conselheiro admirável. Ele é também nosso conselheiro; fala e não nos obriga, como Deus, embora seja também “Deus forte”. Ele nos ajuda a abandonar a ignorância e adquirir o conhecimento, a nos afastar do erro para caminhar até a verdade, a rechaçar a corrupção para obter a incorruptibilidade.

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terça-feira, 23 de outubro de 2018

69 - Irineu de Lyon (130-202) Demonstração da Pregação Apostólica (Cap. 39-46)


69
Estudo sobre os Pais da Igreja: Vida e Obra
Irineu de Lyon (130-202)
Demonstração da Pregação Apostólica (Cap. 39-46)

Cristo, Primogênito de toda a criação
39. Assim, se não é nascido, também não é morto; e se não é morto, não é ressuscitado dos mortos;[99] e se não é ressuscitado dos mortos, não triunfou sobre a morte, nem destruiu o seu reino; e se a morte não foi vencida, como subiremos até a vida, nós que desde o início fomos caídos sob o império da morte? Quem nega a redenção do homem e não crê que Deus o ressuscitará dos mortos despreza também o nascimento de Nosso Senhor, pelo qual o Verbo de Deus se sujeitou por nós, para se tornar homem a fim de manifestar a ressurreição da carne e obter o primado sobre tudo nos céus: como primogênito do pensamento do Pai, o Verbo perfeito dirige pessoalmente cada coisa e legisla na terra; como primogênito da Virgem, homem justo e santo, servo de Deus, bom, aceito por Deus, perfeito em tudo, livra dos infernos todos os que o seguem; como “primogênito dos mortos”, é origem e sinal da vida de Deus.

De Moisés aos apóstolos
40. Assim, pois, o Verbo de Deus ostenta o primado sobre todas as coisas, porque é o verdadeiro homem e “Conselheiro-Maravilhoso, Deus-forte”, que chama novamente, com a ressurreição, o homem à comunhão com Deus, para que, por meio da comunhão, com ele participemos da incorruptibilidade. Ele, que foi anunciado por Moisés e pelos profetas do Deus altíssimo e onipotente, Pai do universo, origem de tudo, que conversou com Moisés, veio à Judeia, gerado por Maria, que era da estirpe de Davi e de Abraão, Jesus, o Ungido de Deus, que revelou a si mesmo como o que foi predito pelos profetas.
41. João Batista, o precursor, quando preparava e dispunha o povo para receber o Verbo da vida, fez saber que esse era o Cristo sobre quem o Espírito de Deus havia deitado e unido à sua carne. Os discípulos e testemunhas de suas boas obras, de seu ensinamento, de sua paixão, de sua morte, de sua ressurreição, da ascensão ao céu depois da ressurreição corporal, ou seja, os apóstolos, com o poder do Espírito Santo enviados por ele por toda a terra, convocaram os gentios, ensinando aos homens o caminho da vida, para afastá-los dos ídolos, da fornicação e da avareza, purificando as suas almas e seus corpos com o batismo na água e no Espírito Santo, distribuindo e subministrando aos crentes esse Espírito Santo que haviam recebido do Senhor. Assim, instituíram e fundaram a Igreja. Com a fé, a caridade e a esperança, [os apóstolos] confirmaram o chamado aos gentios que, preanunciado pelos profetas, lhes foi dirigido segundo a misericórdia de Deus manifestada com o seu ministério, acolhendo-os na promessa feita aos patriarcas, ou seja, àqueles que creram e amaram a Deus; e aos que vivem na santidade, na justiça e na paciência, o Deus de todos outorgará, por meio da ressurreição dos mortos, a vida eterna. Graças àquele que morreu e ressuscitou, Jesus Cristo, a quem confiou a realeza sobre todos os seres da terra, a autoridade sobre os vivos e os mortos, e o juízo. Os apóstolos, com a palavra da verdade, exortaram os gentios a guardar o seu corpo sem mancha para a ressurreição, e a alma ao abrigo da corrupção.

II – A Demonstração Profética (cc. 42-97)

A obra do Espírito Santo
42. Com efeito, assim devem comportar-se os crentes, pelo fato de que neles habita permanentemente o Espírito Santo, doado pelo Senhor no batismo e custodiado por aquele que [o] recebe, se é que vive na verdade e na santidade, na justiça e na paciência. De fato, a ressurreição dos crentes é também obra do Espírito quando o corpo acolhe novamente a alma, e com ela ressuscita pela força do Espírito Santo e é introduzido no Reino de Deus. O fruto da bênção de Jafé se manifestou na Igreja no chamado aos gentios que vivem em contínua obediência para poder habitar na casa de Sem, segundo a promessa de Deus. Que essas coisas deveriam ocorrer, o Espírito Santo predisse pelos profetas, a fim de que aqueles que servem a Deus na verdade tenham fé firme sobre elas. Na verdade, todos esses fatos impossíveis à natureza humana e, portanto, pouco credíveis aos homens, Deus, por meio dos profetas, os predisse muito tempo antes – e se realizaram a seu tempo, como se anunciou – para que, pelo fato de terem sido profetizados muito tempo antes, conhecêssemos que era Deus que, desde o princípio, havia preanunciado a nossa salvação.

A identidade entre o Verbo e o Filho de Deus
43. Deve-se crer em tudo de Deus, porque é veraz em tudo. Ora, que existe um Filho em Deus e que esse Filho existia não apenas antes de sua aparição no mundo, mas também antes da criação do mundo, Moisés foi o primeiro a profetizar, quando escreveu em hebraico: “Beresith bara elovim basan benowam samenthares”, que se traduz: “Um filho, no princípio, Deus estabeleceu; em seguida, Deus criou o céu e a terra”. O profeta Jeremias o testemunhou quando disse: “Antes da estrela da manhã eu te gerei e antes do sol é o teu nome”, isto é, antes da criação do mundo e antes das estrelas criadas com o mundo. Diz ainda: “Bem-aventurado aquele que era antes de se tornar homem”. Por Deus, de fato, o Filho existe desde o início, antes da criação do mundo; porém, para nós não existe mais que desde agora, ou seja, desde quando se manifestou. Antes, então, não existia para nós porque não o conhecíamos. Por isso, o seu discípulo João, explicando quem é o Filho de Deus que era junto do Pai antes que o mundo fosse formado, e que por obra dele foram criadas todas as coisas, disse: “No princípio era o Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o Verbo era Deus. No princípio, ele estava com Deus. Tudo foi feito por meio dele e sem ele nada foi feito”. Demonstra, assim, de modo claro, que todas as coisas foram criadas por meio do Verbo, o qual, desde o início, era com o Pai, isto é, seu Filho.

Colóquio do Filho com Abraão
44. Disse ainda Moisés que o Filho de Deus se aproximou de Abraão para entreter-se com ele: “Iahweh lhe apareceu no carvalho de Mambré [...] no maior calor do dia. Tendo levantado os olhos, eis que viu três homens de pé, perto dele; logo que os viu, correu da entrada da tenda ao seu encontro, e se prostrou por terra. E disse: Meu Senhor, eu te peço, se encontrei graça aos teus olhos...”. Em seguida, ele falava com o Senhor, e o Senhor com ele. Ora, dois dos três eram anjos; o terceiro, ao invés, o Filho de Deus. Com Ele, Abraão falou ainda suplicando pelos habitantes de Sodoma, para que não fossem exterminados se fossem encontrados ao menos dez justos. Enquanto conversavam, os dois anjos que desceram a Sodoma foram recebidos por Ló. A Escritura diz então: “Iahweh fez chover, sobre Sodoma e Gomorra, enxofre e fogo vindos de Iahweh”. Isso quer dizer que o Filho, o mesmo que conversava com Abraão, sendo “Senhor”, recebeu o poder de punir os habitantes de Sodoma “pelo Senhor, do alto do céu”, pelo Pai, que é o Senhor do universo. Abraão, então, era profeta e viu o que aconteceria no futuro; isto é, viu o Filho de Deus sob a aparência humana conversar com os homens, comer com eles, e depois exercer o ofício de julgar pelo fato de ter recebido do Pai, Senhor do Universo, a autoridade de punir os habitantes de Sodoma.



Aparição a Jacó
45. Jacó, durante a viagem à Mesopotâmia, viu o Verbo em sonho, de pé, em cima da escada, ou seja, no lenho fixado do céu à terra. Por isso, o lenho dos que creem nele sobe ao céu, porque a sua paixão é a nossa ascensão. Todas as visões desse tipo apontam o Filho de Deus que conversa com os homens e entre eles. Não é o Pai do universo, invisível ao mundo e criador de tudo que diz: “O céu é o meu trono, a terra o escabelo dos meus pés. Que casa me haveis de fazer, que lugar para meu repouso?” e “Quem pode medir as águas do mar na concha da mão? Quem conseguiu avaliar a extensão dos céus a palmos, medir o pó da terra com o alqueire e pesar os montes na balança e os outeiros nos seus pratos?” Não é certo que Ele (o Pai) estava de pé sobre um pequeno espaço e conversava com Abraão, mas o Verbo de Deus que sempre esteve presente no gênero humano, antecipava o conhecimento das coisas futuras e instruía os homens sobre as coisas de Deus.

O Filho de Deus conversa com Moisés
46. Foi Ele (o Verbo) que, na sarça ardente, conversou com Moisés e disse: “Eu vi, eu vi a miséria de meu povo que está no Egito. Ouvi seu grito por causa dos seus opressores; pois eu conheço as suas angústias. Por isso desci, a fim de libertá-lo da mão dos egípcios”. Ele subia e descia para libertar os oprimidos, arrancando-os do poder dos egípcios, ou seja, de toda sorte de idolatria e impiedade; salvando-os do mar Vermelho, isto é, liberando-os das turbulências homicidas dos gentios, e das águas amargas de suas blasfêmias. Esses acontecimentos eram contínua repetição do que a nós se refere, no sentido de que o Verbo de Deus mostrava antecipadamente as coisas futuras, mas liberando realmente da servidão cruel dos gentios. No deserto fez brotar com abundância um rio de água, uma rocha. Essa rocha é ele mesmo. Produziu doze fontes, ou seja, a doutrina dos doze apóstolos. E aos recalcitrantes e incrédulos, os fez morrer e desaparecer no deserto, e aos que creram nele, feitos crianças pela maldição, os introduziu na herança dos pais que recebeu e distribuiu, não a Moisés, mas a Jesus; os liberou de Amalec estendendo as suas mãos, e nos conduz e nos faz subir ao Reino do Pai.

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domingo, 7 de outubro de 2018

68 - Irineu de Lyon (130-202) Demonstração da Pregação Apostólica (Cap. 29-38)



68
Estudo sobre os Pais da Igreja: Vida e Obra
Irineu de Lyon (130-202)
Demonstração da Pregação Apostólica (Cap. 29-38)


A distribuição da terra
29. Quando Moisés estava a ponto de terminar o curso de seus dias, Deus lhe disse: “Sobe a esta montanha dos Abarim, sobre o monte Nebo, na terra de Moab, diante de Jericó, e contempla a terra de Canaã, que eu dou como propriedade aos israelitas. Morrerás no monte em que tiveres subido e irás reunir-te aos teus, assim como o teu irmão Aarão, que foi reunido ao seu povo no monte Hor, pois fostes infiéis a mim no meio dos israelitas, junto às águas de Meribacades, no deserto de Sin, não reconhecendo a minha santidade no meio dos israelitas. Por isso contemplarás a terra à tua frente, mas não poderás entrar nela, na terra que estou dando aos israelitas”. Conforme a palavra do Senhor, Moisés morreu e lhe sucedeu Jesus (Josué), filho de Num. Esse atravessou o Jordão, conduziu o Povo à Terra Prometida e, vencidos e aniquilados os sete povos que a habitavam, a distribuiu entre o Povo. Lá existia Jerusalém, onde reinou Davi e o seu filho Salomão, que construiu o Templo em nome de Deus à imagem do tabernáculo feito por Moisés como tipo (modelo) das realidades celestes e espirituais.

O envio dos profetas
30. Lá em Jerusalém foram enviados por Deus, por meio do Espírito Santo, os profetas, que aconselhavam o povo e o convertia ao Deus Onipotente de seus pais; como arautos da revelação de Nosso Senhor Jesus Cristo, Filho de Deus, anunciavam que à estirpe de Davi havia de florescer o seu corpo, a fim de que fosse, segundo a carne, filho de Davi – que era filho de Abraão – em virtude de uma longa cadeia de gerações, e, segundo o Espírito, Filho de Deus, preexistente com o Pai, gerado antes da fundação do mundo e aparecido como homem ao mundo inteiro nos últimos tempos. Ele é o Verbo de Deus [enviado] “para levar o tempo à sua plenitude: a de em Cristo encabeçar todas as coisas, as que estão nos céus e as que estão na terra”.

A desobediência e a Encarnação
31. [O Verbo] Uniu, assim, o homem a Deus, e realizou a comunhão entre Deus e o homem, porque não teríamos podido absolutamente obter participação alguma na incorruptibilidade se ele, o Verbo, não tivesse vindo habitar entre nós. Pois, se a incorruptibilidade tivesse permanecido invisível e oculta, não nos teria sido de utilidade alguma, mas se fez visível a fim de que entrássemos em comunhão com ele. E porque, envolvidos todos na criação originária de Adão, fomos vinculados à morte por causa de sua desobediência, era conveniente e justo que, pela obediência de quem se fez homem por nós, fossem rompidas as cadeias da morte. E porque a morte reinava sobre a carne, era preciso que ela fosse abolida por meio da carne, para que o homem fosse libertado de sua opressão. O Verbo, então, se fez carne para destruir, por meio da carne, o pecado que, por obra da carne, adquiriu poder, o direito de propriedade e domínio; e para que [o pecado] não existisse mais entre nós. Por essa razão, Nosso Senhor tomou uma corporeidade idêntica à da primeira criatura para lutar em favor dos progenitores e vencer em Adão aquele que em Adão nos feriu.

Adão e Cristo
32. Ora, de onde provém a substância do primeiro homem? Da vontade e da sabedoria de Deus e da terra virgem. “Porque Iahweh Deus não tinha feito chover sobre a terra – diz a Escritura – e não havia homem para cultivar o solo”. Dessa terra, então, todavia virgem, Deus tomou o barro e plasmou o homem, princípio do gênero humano. [O Senhor,] recapitulando em si esse homem, princípio do gênero humano, nascendo de uma virgem por vontade e sabedoria de Deus, reproduziu o mesmo esquema de corporeidade para demonstrar a identidade da sua corporeidade com a de Adão, e para refazer, como foi feito no início, o homem à imagem e semelhança de Deus.

Eva e Maria
33. Como, por causa de uma virgem desobediente, o homem foi ferido, caiu e morreu, assim também, por causa de uma virgem obediente à Palavra de Deus, [o homem] foi ressuscitado e recobrou a vida. Pois o Senhor veio buscar a ovelha perdida, ou seja, o homem que se perdeu. Por isso, não formou um corpo diverso, mas, por meio daquele que descendia de Adão, conservou a semelhança daquele corpo. Adão, de fato, foi recapitulado por Cristo, a fim de que o que é mortal fosse submerso na imortalidade, e Eva em Maria, a fim de que uma virgem, tornada advogada de uma virgem, dissolvesse e destruísse com a sua obediência de virgem a desobediência de uma virgem. O pecado cometido por causa da árvore foi anulado pela obediência cumprida sobre a árvore, obediência a Deus, pela qual o Filho do homem foi pregado na árvore, abolindo a ciência do mal, e proporcionando e doando a ciência do bem. O mal é desobedecer a Deus. O bem é, ao invés, obedecer.

Obediência reparadora do Verbo
34. O Verbo, preanunciando por meio do profeta Isaías os acontecimentos futuros – os profetas são tais porque anunciam os acontecimentos futuros – assim se exprime: “O Senhor Iahweh abriu-me os ouvidos e eu não fui rebelde, não recuei. Ofereci o dorso aos que me feriam e as faces aos que me arrancavam os fios da barba; não ocultei o rosto às injúrias e aos escarros”. Então, por força “da obediência”, [o Verbo] anulou a antiga desobediência consumada sobre a árvore. Ele mesmo é o Verbo de Deus onipotente, que, no estado de invisibilidade, se difundiu no universo inteiro, que [o] abraça em comprimento, largura, altura e profundidade. Todas as coisas, de fato, são governadas e administradas pelo Verbo de Deus. Nessas dimensões, foi crucificado o Filho de Deus já impresso sobre o universo em forma de cruz; fazendo-se visível, manifestou a universalidade de sua cruz, demostrando claramente, na forma visível, a sua atividade consistente na iluminação da altura, ou seja, os meandros da terra, na extensão do Oriente ao Ocidente, no governo como um comandante da região do Oeste e da amplitude do Sul, e no chamado ao conhecimento do Pai de todos os homens dispersos.

O cumprimento da promessa de Abraão
35. Realizou-se, assim, a profecia feita por Deus a Abraão, segundo a qual a sua descendência seria como as estrelas do céu. Cristo cumpriu a promessa, nascendo da Virgem, da estirpe de Abraão, e convertendo em luminárias do mundo os que nele acreditam, e justificando os gentios com Abraão por meio da mesma fé. “Abraão creu
em Iahweh, e lhe foi tido em conta de justiça”. Do mesmo modo, nós somos justificados em virtude da fé em Deus, porque “o justo viverá por sua fidelidade”. A promessa de Abraão não foi feita pelo cumprimento da Lei, mas por meio da fé. De fato, Abraão foi justificado pela fé: “sabendo que ela não é destinada ao justo”. Da mesma forma, nós não somos justificados pela Lei, mas pela fé, que recebeu o testemunho da Lei e dos profetas, e que nos apresenta o Verbo de Deus.

Cristo, nascido da Virgem da descendência de Davi
36. Deus manteve as promessas feitas a Davi; havia-lhe prometido fazer surgir do fruto do seu seio um Rei eterno, cujo reino não teria ocaso. Esse Rei é o Cristo, o Filho de Deus tornado filho do homem, isto é, nascido, como fruto, da Virgem da descendência davídica. A promessa, então, ganhou forma de fruto do ventre, isto é, de um descendente da concepção própria de uma mulher – não “do fruto dos homens ou dos rins” – isto é, do nascimento próprio do homem, para manifestar o que de único e de especial havia na produção desse fruto do seio de uma virgem davídica, [fruto] que devia ser o Rei eterno na casa de Davi, e cujo reino não terá ocaso.

A destruição da morte e o dom da vida
37. Em tais condições se realizava magnificamente a nossa salvação, [esse Rei] mantinha as promessas feitas aos patriarcas e abolia a antiga desobediência. O Filho de Deus se fez filho de Davi e filho de Abraão. Para cumprir as promessas e recapitulá-las em si mesmo com a finalidade de nos restituir a vida, o Verbo de Deus se fez carne através da Virgem, a fim de desatar a morte e vivificar o homem, porque nós estávamos presos ao pecado e destinados a viver sob o império da morte.

Nascimento, morte e ressurreição de Cristo
38. Deus Pai, pela sua imensa misericórdia, enviou o seu Verbo criador, que, vindo para nos salvar, esteve nos mesmos lugares, na mesma situação e nos mesmos ambientes onde perdemos a vida, e rompeu as cadeias que nos mantinham prisioneiros. Com a aparição de sua luz desapareceram as trevas da prisão, santificou o nosso nascimento e, destruída a morte, desligou aqueles mesmos laços que nos tinham prendido. Manifestou a ressurreição, tornando-se ele mesmo o primogênito dos mortos, e levantou na sua pessoa o homem caído por terra, ao ser elevado às alturas do céu até a direita da glória do Pai, como Deus havia prometido por meio do profeta, ao dizer: “Naquele dia levantarei a tenda desmoronada de Davi”, isto é, o corpo que provém de Davi. Nosso Senhor Jesus Cristo realmente cumpriu essa empresa, realizando de modo glorioso a nossa salvação, para nos erguer realmente e nos apresentar livres ao Pai. Ora, se alguém não aceita o seu nascimento de uma Virgem, como aceitará a sua ressurreição da morte? Porque não há nada de miraculoso, de estranho, de inesperado, se alguém que não é nascido ressuscite da morte; nem podemos falar de “ressurreição” para aquele que veio à existência sem passar pelo nascimento: na verdade, quem não pode nascer é imortal e quem não foi sujeito ao nascimento não será também sujeito à morte. Então, como pode ter fim o homem que não teve início?

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segunda-feira, 1 de outubro de 2018

67 - Irineu de Lyon (130-202) Demonstração da Pregação Apostólica (Cap. 23-28)



67
Estudo sobre os Pais da Igreja: Vida e Obra
Irineu de Lyon (130-202)
Demonstração da Pregação Apostólica (Cap. 23-28)


Babel: a resistência ao plano de Deus
23. Levantadas as tendas, na sua peregrinação chegaram à planície de Senaar; aqui decidiram edificar uma torre. Procuravam com ela atingir o céu, presumindo deixar a sua obra como monumento às futuras gerações. O edifício foi feito de tijolos cozidos e de betume; a sua audácia e temeridade cresciam; graças ao acordo e à união de intenções e ao uso de uma só língua, o seu desejo ia se realizando. Mas, a fim de que a obra não progredisse, Deus dividiu as suas línguas, de modo que não se entendessem mais. Assim, se dispersaram e ocuparam a terra, agrupando-se segundo a língua. Daqui os diferentes povos e as diversas línguas sobre toda a terra. De fato, três raças humanas se apropriaram da terra. Uma delas estava sobre o pesadelo da maldição, as outras duas eram abençoadas. A bênção desceu primeiro sobre Sem, cujos descendentes habitaram o Oriente e ocuparam o país dos caldeus.

Aliança com Abraão
24. Mais tarde, na décima geração depois do dilúvio, se encontra Abraão, que buscava Deus, que lhe corresponde e que lhe pertence pela bênção de seu antepassado (Sem). Quando, seguindo o ardente desejo de seu coração, peregrinava pelo mundo perguntando-se onde estava Deus e começou a fraquejar e estava a ponto de desistir da busca, Deus teve piedade daquele que, sozinho, o buscava em silêncio. E Deus se manifestou a Abraão, dando-se a conhecer por meio do Verbo, como que por um raio de sol; falou-lhe do céu e lhe disse: “Sai de tua terra, da tua parentela e da casa de teu pai, para a terra que te mostrarei”. Ele (Abraão) confiou na voz celeste e, apesar de ter setenta anos e uma mulher anciã, com ela abandonou a Mesopotâmia e levou consigo Ló, filho de seu irmão defunto. Quando chegou à terra que hoje se denomina Judeia, então habitada por sete povos descendentes de Cam, Deus lhe apareceu em visão, e lhe disse: “É à tua posteridade que eu darei esta terra”. [Acrescentou] que a sua descendência seria peregrina em um país estrangeiro, onde seria maltratada, aflita e reduzida à escravidão por quatrocentos anos; mas a quarta geração retornaria à terra prometida a Abraão, e Deus condenaria o povo que escravizou a sua posteridade. E para que Abraão conhecesse a grandeza e o esplendor de sua descendência, Deus o fez sair de noite e lhe dirigiu estas palavras: “Ergue os olhos para o céu e conta as estrelas, se as podes contar. Assim será a tua posteridade”. E Deus, vendo a fé e a firme decisão de seu espírito, lhe deu testemunho dizendo na Escritura através do Espírito Santo: “Abraão creu em Iahweh, e lhe foi tido em conta de justiça”. [Abraão] era incircunciso quando recebeu esse testemunho e, a fim de que a sua fé fosse reconhecida por um sinal, [Deus] lhe deu a circuncisão “e recebeu o sinal da circuncisão como selo da justiça da fé, que ele tinha quando incircunciso”. Depois disso, segundo a promessa de Deus, da estéril Sara, teve um filho, Isaac, que circuncidou segundo o pacto que Deus havia estipulado com ele. De Isaac nasceu Jacó. Assim, a inicial bênção de Sem atingiu Abraão, e de Abraão passou a Isaac, e de Isaac a Jacó, graças à atribuição da herança feita pelo Espírito. Por isso, ele é chamado o “Deus de Abraão, o Deus de Isaac e o Deus de Jacó”.

A migração no Egito e a Páscoa
25. Quando uma carestia golpeou toda a terra, apenas o Egito contava com gêneros alimentícios; Jacó imigrou com toda a família àquele país. O número total dos imigrantes chegava a 75 pessoas e em 400 anos chegaram a ser, segundo as predições, 660.000. Dado que sofreram muitas tribulações e opressões em uma cruel escravidão, e gemiam e se lamentavam a Deus, o Deus de seus Pais, Abraão, Isaac e Jacó, os tirou do Egito, valendo-se de Moisés e de Aarão, depois de ter castigado os egípcios com dez pragas, na última das quais mandou um anjo exterminador para matar os primogênitos, tanto dos homens como dos animais. Assim salvou os filhos de Israel, prefigurando de um modo misterioso a paixão de Cristo, na imolação de um cordeiro imaculado e em seu sangue, derramado como garantia de imunidade, para aspergir as casas dos hebreus. O mistério recebeu o nome de “Paixão”, manancial de libertação. Dividido o mar Vermelho, [Deus] conduziu com todas as precauções os filhos de Israel ao deserto, enquanto os egípcios, que se lançaram em sua perseguição no mar, pereceram todos. Esse foi o juízo de Deus contra os que injustamente oprimiram a estirpe de Abraão.

O Decálogo entregue a Moisés
26. Moisés, no deserto, recebeu de Deus a Lei: o Decálogo, gravado em tábuas de pedra pelo dedo de Deus – o dedo de Deus é o que sai do Pai no Espírito Santo – os preceitos e os decretos que transmitiu aos filhos de Israel para que os guardassem. Por ordem de Deus, [Moisés] construiu o tabernáculo do testemunho, construção visível na terra das realidades espirituais e invisíveis do céu, figura da Igreja e representação profética das realidades futuras. Ali colocou os vasos, os altares e a arca, na qual introduziu as Tábuas. [Deus] constituiu sacerdotes Aarão e seus filhos, que descendiam de Levi, conferindo o sacerdócio a toda a sua estirpe. Além disso, chamou, por ordem de Deus, toda essa estirpe para exercer o ministério cultual no Templo de Deus. E lhes deu a Lei levítica, que fixa quais qualidades e qual conduta devem ter aqueles que continuamente se dedicam ao serviço do culto no Templo de Deus.

A exploração da Terra Prometida e a peregrinação no deserto
27. Quando se aproximavam da Terra Prometida por Deus a Abraão e à sua posteridade, Moisés escolheu um homem de cada tribo e os enviou a explorar aquela terra, as cidades e os seus habitantes. Foi então que Deus lhes revelou o único Nome capaz de salvar os que nele crerem. Moisés mudou o nome de Oseias, filho de Num, um dos exploradores, e lhe pôs o nome de Jesus [Josué]. E Moisés os enviou com o poder daquele nome, persuadido de que os acolheriam e voltariam incólumes, por terem sido conduzidos por aquele nome, o que, de fato, aconteceu. Concluída a missão de espionagem e de exploração, regressaram, trazendo um ramo de uvas; porém, um dos doze exploradores amedrontou-se e alarmou o povo ao relatar que as cidades eram imensas e fortificadas, e que os homens, filhos dos Titãs, tinham uma estatura gigantesca e eram capacitados para defender a sua terra. Ao receber tais notícias, o povo chorou, perdendo a fé em Deus, que os fortalecia e submetia todo o mundo. Murmuraram da Terra (prometida), como se não fosse boa, e que por uma terra de tal natureza não valia a pena correr risco algum. Porém, dois dentre os doze, Jesus, filho de Num, e Caleb, filho de Jefoné, rasgaram as vestes pelo mal assim cometido e suplicaram ao povo não abater-se nem perder a coragem, pois Deus lhes deu tudo nas suas mãos e a terra era excelente. Como o povo não se convencia e persistia na incredulidade, Deus desviou e mudou o seu itinerário para que dispersasse, e o afligiu no deserto. E contando um ano por dia por todos os dias empregados na viagem de ida e retorno daqueles que foram explorar e inspecionar a terra, isto é, quarenta dias, Deus os manteve quarenta anos no deserto. Nenhum adulto e na plena posse da razão foi julgado digno de entrar na terra por causa da incredulidade, exceção feita a Jesus (Josué), filho de Num, e Caleb, filho de Jefoné, que falaram bem da herança prometida, e as crianças incapazes de distinguir a direita da esquerda. Pouco a pouco, o povo incrédulo chegou ao final e, lentamente, pereceu no deserto, castigado justamente por sua incredulidade. As crianças nesses quarenta anos cobriram os lugares que haviam sido deixados vazios pelos mortos.

O Deuteronômio
28. Transcorridos os quarenta anos, o povo chegou às cercanias do rio Jordão e, reagrupando-se, se alinhou para a batalha diante de Jericó. Aqui, diante do povo reunido, Moisés evocou a história passada, recordando os grandes feitos de Deus até o presente, preparando e dispondo aqueles que eram crescidos no deserto a temer a Deus e a observar os mandamentos. Impôs a esses uma nova legislação, acrescentando-a àquela que foi estabelecida anteriormente. Esse novo corpo legislativo foi chamado Deuteronômio, ou seja, a Lei Segunda, nas quais estão escritas muitas profecias referentes a Nosso Senhor Jesus Cristo, ao povo, à vocação dos gentios e ao Reino.


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