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Estudo sobre os Pais da Igreja: Vida e Obra
Irineu de Lyon (130-202)
Demonstração
da Pregação Apostólica (Cap. 23-28)
Babel:
a resistência ao plano de Deus
23. Levantadas
as tendas, na sua peregrinação chegaram à planície de Senaar; aqui decidiram
edificar uma torre. Procuravam com ela atingir o céu, presumindo deixar a sua obra
como monumento às futuras gerações. O edifício foi feito de tijolos cozidos e
de betume; a sua audácia e temeridade cresciam; graças ao acordo e à união de
intenções e ao uso de uma só língua, o seu desejo ia se realizando. Mas, a fim
de que a obra não progredisse, Deus dividiu as suas línguas, de modo que não se
entendessem mais. Assim, se dispersaram e ocuparam a terra, agrupando-se
segundo a língua. Daqui os diferentes povos e as diversas línguas sobre toda a
terra. De fato, três raças humanas se apropriaram da terra. Uma delas estava
sobre o pesadelo da maldição, as outras duas eram abençoadas. A bênção desceu
primeiro sobre Sem, cujos descendentes habitaram o Oriente e ocuparam o país
dos caldeus.
Aliança
com Abraão
24. Mais tarde,
na décima geração depois do dilúvio, se encontra Abraão, que buscava Deus, que
lhe corresponde e que lhe pertence pela bênção de seu antepassado (Sem). Quando,
seguindo o ardente desejo de seu coração, peregrinava pelo mundo perguntando-se
onde estava Deus e começou a fraquejar e estava a ponto de desistir da busca,
Deus teve piedade daquele que, sozinho, o buscava em silêncio. E Deus se manifestou
a Abraão, dando-se a conhecer por meio do Verbo, como que por um raio de sol;
falou-lhe do céu e lhe disse: “Sai de tua terra, da tua parentela e da casa de
teu pai, para a terra que te mostrarei”. Ele (Abraão) confiou na voz celeste e,
apesar de ter setenta anos e uma mulher anciã, com ela abandonou a Mesopotâmia
e levou consigo Ló, filho de seu irmão defunto. Quando chegou à terra que hoje
se denomina Judeia, então habitada por sete povos descendentes de Cam, Deus lhe
apareceu em visão, e lhe disse: “É à tua posteridade que eu darei esta terra”.
[Acrescentou] que a sua descendência seria peregrina em um país estrangeiro,
onde seria maltratada, aflita e reduzida à escravidão por quatrocentos anos;
mas a quarta geração retornaria à terra prometida a Abraão, e Deus condenaria o
povo que escravizou a sua posteridade. E para que Abraão conhecesse a grandeza
e o esplendor de sua descendência, Deus o fez sair de noite e lhe dirigiu estas
palavras: “Ergue os olhos para o céu e conta as estrelas, se as podes contar.
Assim será a tua posteridade”. E Deus, vendo a fé e a firme decisão de seu
espírito, lhe deu testemunho dizendo na Escritura através do Espírito Santo: “Abraão
creu em Iahweh, e lhe foi tido em conta de justiça”. [Abraão] era incircunciso
quando recebeu esse testemunho e, a fim de que a sua fé fosse reconhecida por
um sinal, [Deus] lhe deu a circuncisão “e recebeu o sinal da circuncisão como
selo da justiça da fé, que ele tinha quando incircunciso”. Depois disso,
segundo a promessa de Deus, da estéril Sara, teve um filho, Isaac, que
circuncidou segundo o pacto que Deus havia estipulado com ele. De Isaac nasceu
Jacó. Assim, a inicial bênção de Sem atingiu Abraão, e de Abraão passou a
Isaac, e de Isaac a Jacó, graças à atribuição da herança feita pelo Espírito.
Por isso, ele é chamado o “Deus de Abraão, o Deus de Isaac e o Deus de Jacó”.
A
migração no Egito e a Páscoa
25. Quando uma
carestia golpeou toda a terra, apenas o Egito contava com gêneros alimentícios;
Jacó imigrou com toda a família àquele país. O número total dos imigrantes chegava
a 75 pessoas e em 400 anos chegaram a ser, segundo as predições, 660.000. Dado
que sofreram muitas tribulações e opressões em uma cruel escravidão, e gemiam e
se lamentavam a Deus, o Deus de seus Pais, Abraão, Isaac e Jacó, os tirou do
Egito, valendo-se de Moisés e de Aarão, depois de ter castigado os egípcios com
dez pragas, na última das quais mandou um anjo exterminador para matar os
primogênitos, tanto dos homens como dos animais. Assim salvou os filhos de
Israel, prefigurando de um modo misterioso a paixão de Cristo, na imolação de
um cordeiro imaculado e em seu sangue, derramado como garantia de imunidade,
para aspergir as casas dos hebreus. O mistério recebeu o nome de “Paixão”,
manancial de libertação. Dividido o mar Vermelho, [Deus] conduziu com todas as
precauções os filhos de Israel ao deserto, enquanto os egípcios, que se
lançaram em sua perseguição no mar, pereceram todos. Esse foi o juízo de Deus
contra os que injustamente oprimiram a estirpe de Abraão.
O
Decálogo entregue a Moisés
26. Moisés, no
deserto, recebeu de Deus a Lei: o Decálogo, gravado em tábuas de pedra pelo
dedo de Deus – o dedo de Deus é o que sai do Pai no Espírito Santo – os
preceitos e os decretos que transmitiu aos filhos de Israel para que os
guardassem. Por ordem de Deus, [Moisés] construiu o tabernáculo do testemunho,
construção visível na terra das realidades espirituais e invisíveis do céu,
figura da Igreja e representação profética das realidades futuras. Ali colocou
os vasos, os altares e a arca, na qual introduziu as Tábuas. [Deus] constituiu
sacerdotes Aarão e seus filhos, que descendiam de Levi, conferindo o sacerdócio
a toda a sua estirpe. Além disso, chamou, por ordem de Deus, toda essa estirpe
para exercer o ministério cultual no Templo de Deus. E lhes deu a Lei levítica,
que fixa quais qualidades e qual conduta devem ter aqueles que continuamente se
dedicam ao serviço do culto no Templo de Deus.
A
exploração da Terra Prometida e a peregrinação no deserto
27. Quando se
aproximavam da Terra Prometida por Deus a Abraão e à sua posteridade, Moisés
escolheu um homem de cada tribo e os enviou a explorar aquela terra, as cidades
e os seus habitantes. Foi então que Deus lhes revelou o único Nome capaz de
salvar os que nele crerem. Moisés mudou o nome de Oseias, filho de Num, um dos
exploradores, e lhe pôs o nome de Jesus [Josué]. E Moisés os enviou com o poder
daquele nome, persuadido de que os acolheriam e voltariam incólumes, por terem
sido conduzidos por aquele nome, o que, de fato, aconteceu. Concluída a missão
de espionagem e de exploração, regressaram, trazendo um ramo de uvas; porém, um
dos doze exploradores amedrontou-se e alarmou o povo ao relatar que as cidades
eram imensas e fortificadas, e que os homens, filhos dos Titãs, tinham uma
estatura gigantesca e eram capacitados para defender a sua terra. Ao receber
tais notícias, o povo chorou, perdendo a fé em Deus, que os fortalecia e
submetia todo o mundo. Murmuraram da Terra (prometida), como se não fosse boa,
e que por uma terra de tal natureza não valia a pena correr risco algum. Porém,
dois dentre os doze, Jesus, filho de Num, e Caleb, filho de Jefoné, rasgaram as
vestes pelo mal assim cometido e suplicaram ao povo não abater-se nem perder a
coragem, pois Deus lhes deu tudo nas suas mãos e a terra era excelente. Como o
povo não se convencia e persistia na incredulidade, Deus desviou e mudou o seu itinerário
para que dispersasse, e o afligiu no deserto. E contando um ano por dia por todos
os dias empregados na viagem de ida e retorno daqueles que foram explorar e inspecionar
a terra, isto é, quarenta dias, Deus os manteve quarenta anos no deserto. Nenhum
adulto e na plena posse da razão foi julgado digno de entrar na terra por causa
da incredulidade, exceção feita a Jesus (Josué), filho de Num, e Caleb, filho
de Jefoné, que falaram bem da herança prometida, e as crianças incapazes de
distinguir a direita da esquerda. Pouco a pouco, o povo incrédulo chegou ao
final e, lentamente, pereceu no deserto, castigado justamente por sua
incredulidade. As crianças nesses quarenta anos cobriram os lugares que haviam
sido deixados vazios pelos mortos.
O
Deuteronômio
28.
Transcorridos os quarenta anos, o povo chegou às cercanias do rio Jordão e, reagrupando-se,
se alinhou para a batalha diante de Jericó. Aqui, diante do povo reunido, Moisés
evocou a história passada, recordando os grandes feitos de Deus até o presente,
preparando e dispondo aqueles que eram crescidos no deserto a temer a Deus e a observar
os mandamentos. Impôs a esses uma nova legislação, acrescentando-a àquela que
foi estabelecida anteriormente. Esse novo corpo legislativo foi chamado
Deuteronômio, ou seja, a Lei Segunda, nas quais estão escritas muitas profecias
referentes a Nosso Senhor Jesus Cristo, ao povo, à vocação dos gentios e ao
Reino.
O que você
destaca neste texto?
Como ele serviu
para sua espiritualidade?
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