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SÃO BASÍLIO MAGNO, ou de
CESAREIA
(330-379)
Tratado sobre o Espírito Santo (Capítulos 01 ao 05)
I. Prefácio. Apurem-se até as mínimas parcelas da
linguagem teológica
Capitulo 1.
1.
Considero muito louvável teu empenho em
aprender e tua aplicação ao trabalho. Causa-me extraordinário prazer não deixar
tua mente firme e sóbria de ponderar palavra alguma das utilizadas nas
exposições sobre Deus, caro amigo (kefalé
= cabeça), querido entre todos, meu
irmão Anfilóquio. Entendeste bem a exortação do Senhor: “Todo o que pede,
recebe; o que busca, acha” (Lc 11,10).
2.
Tendo em vista a justeza de teu pedido,
mesmo com o mais hesitante, a meu ver, poderias iniciar uma discussão. Mais
admirável, porém, é o fato de não formulares perguntas, como acontece
atualmente na maioria dos casos, para armar ciladas, e sim com o propósito de
investigar a verdade.
3.
Facilmente aparecem os que nos
espreitam e nos interrogam continuamente, mas é dificílimo encontrar uma alma
desejosa do saber e que procura a verdade, a fim de curar a própria ignorância.
4.
Ora, como um laço de caçadores e uma
emboscada de guerra, são ciladas ocultas, bem planejadas, essas perguntas de
muitos, cuja intenção não é tirar proveito para si, mas, ao contrário, quando
as respostas não correspondem a seus desejos, conseguir pretexto de ataque
aparentemente justo.
Capítulo 2.
5. Se até o estulto, quando interroga, passa por sábio (Pr
17,28), o que não há de merecer o ouvinte inteligente, pelo profeta assimilado
ao “conselheiro maravilhoso” (Is 9,5)?
6.
É justo dar-lhe todo apoio,
estimulá-lo, partilhar seu zelo, e vir em ajuda daquele que insta a irmos até o
fim.
7.
Não ouvir superficialmente os termos
teológicos, mas tentar descobrir o sentido oculto de cada palavra, de cada
sílaba, não é próprio dos tíbios, e sim daqueles que conhecem a finalidade de
nossa vocação, pois nos é proposto assemelharmo-nos a Deus, quanto possível à
natureza humana.
8.
Todavia, não há semelhança sem
conhecimento (gnosis), e este conhecimento se obtém por meio de ensino.
9.
Ora, o discurso, base de todo ensino,
compõe-se de partes: sílabas e termos. Por isso, não é fora de propósito
examinar as sílabas. Questões aparentemente insignificantes, mas nem por isso
menos merecedoras de atenção.
10. Ao contrário, visto ser difícil ir à caça da verdade, temos
de investigá-la em todas as direções. Quer se trate das artes, quer da aquisição
da piedade, em que lentamente se progride, nada negligenciem os que são introduzidos
no conhecimento (gnosis), pois quem menosprezar os primeiros elementos, como sendo
ínfimos, de modo algum atingirá a perfeição da sabedoria.
11. O “sim” e o “não” não passam de duas sílabas. Mas estas
pequeninas palavras muitas vezes abrangem tanto o maior dos bens, a verdade,
quanto o último limite da maldade, a mentira.
12. Mas, que digo? Basta um aceno com a cabeça, para testemunhar
a Cristo, e já se considera cumprido o dever da piedade. Sendo assim, que termo
teológico será pequeno demais para se tornar expressivo, ou inexato, inclinando
o fiel da balança de um lado ou de outro?
13. E se da Lei não haverá de passar nem um iota, nem um só
traço sem se cumprir (Mt 5,18), poderia ser seguro transgredir até mesmo os
menores mandamentos?
14. Com efeito, estas partículas, das quais procuras obter de
nós um exame atento, apesar de breves, são realmente grandes.
15. Breves pela concisão com que se apresentam, e em
consequência disso talvez menosprezáveis; grandes pela força de seu significado,
conforme a figura do grão de mostarda, a menor de todas as sementes de hortaliças,
mas que devidamente cresce, com o desabrochar de suas forças, quando cercada de
convenientes cuidados.
16. Se alguém se rir de nossa loquacidade — para falar como o
salmo (Sl 118,85) — em torno de sílabas apenas, fique ciente de que deste riso colherá
um fruto imprestável; nós, porém, não haveremos de abandonar a pesquisa, nem nos
haveremos de dobrar diante da crítica dos homens, nem de desanimar em vista
deste desprezo.
17. Bem longe de me envergonhar por causa da brevidade destas
sílabas, se conseguisse apreender apenas uma pequenina parte de seu valor,
alegrar-me-ia como merecedor de grande aplauso, e diria ao irmão que conosco
investiga não ser pequeno o lucro que daí retiraríamos.
18. Como verifico ser muito grande a contestação, embora se trate
de pequenas palavras, não recuso o labor, na esperança da recompensa, considerando
que para mim será frutuosa labuta, e para os ouvintes, de grande utilidade.
19. Por isso, explicarei agora, auxiliado pelo mesmo Espírito,
ser lícito dizer: “com” o Espírito Santo. E se te apraz que me ponha a caminho,
volto um pouco atrás, ao início da questão.
Capítulo 3.
20. Há pouco, estava orando com o povo. Glorificava a Deus Pai
com ambas as formas de doxologia: ora com
o Filho, com o
Espírito Santo; ora pelo Filho, no Espírito Santo.
21. Alguns dos presentes nos acusaram de empregar palavras
estranhas e até contraditórias entre si. Tu, porém, pensando antes no bem
deles, ou ao menos, se o mal for inteiramente irremediável, para premunir seus
companheiros, pediste um ensinamento bem claro sobre o alcance destas sílabas.
22. Seremos concisos, na medida do possível, quais pessoas já de
acordo no ponto de partida.
II. Base da tese dos hereges sobre as partículas
Capítulo 4.
23. Não é tão fácil, como parece, compreender as sutilezas
destes hereges sobre sílabas e palavras. Não versam sobre erros
insignificantes, mas revelam profundos e obscuros desígnios contra a piedade.
24. Empenham-se por demonstrar não ser semelhante o enunciado
dos nomes do Pai e do Filho e do Espírito Santo, a fim de extrair daí uma fácil
demonstração da diferença das naturezas. Adotam um antigo sofisma, formulado
por Aécio, o chefe de sua seita, que escreveu em certa passagem de suas cartas:
“Os seres dessemelhantes por natureza são denominados de maneira diferente”, e
reciprocamente: “Os seres denominados de modo diferente diferem também quanto à
natureza”.
25. E Aécio quer apoiar esta opinião no testemunho do Apóstolo:
“Existe um só Deus, o Pai, de quem tudo procede, e um só Senhor, Jesus Cristo,
por quem tudo existe” (1Cor 8,6).
26. Assim, segundo sua opinião, as naturezas significadas pelas
palavras se relacionam mutuamente como as palavras entre si. Ora, a locução de quem é
diferente da locução por quem.
27. Por conseguinte, o Filho não é semelhante ao Pai. Desta
afecção, com efeito, provém a loquacidade destes hereges sobre as mencionadas
expressões.
28. Daí vem que eles destinam a Deus Pai, como porção de escol,
a expressão de quem. Determinam para Deus Filho a expressão por quem; quanto
ao Espírito Santo, reservam-lhe a expressão em
quem.
29. E afirmam que de forma alguma o emprego destas partículas
deve ser alterada, a fim de que, como já disse, a diferença das denominações
revele simultaneamente a diversidade das naturezas.
30. Mas, efetivamente, evidencia-se que esta sutil discussão de palavras
serve apenas para manifestar a impiedade da doutrina.
31. Pela locução de
quem querem assinalar o Artífice; com a
expressão por quem indicam um auxiliar ou instrumento; pelos termos em quem determinariam
tempo ou lugar.
32.
Com isso, pretendem que se conceba o
Artífice do universo apenas como um instrumento e se evidencie que o Espírito
Santo nada acrescenta aos seres, a não ser as circunstâncias de espaço e de
tempo.
III. A tecnologia das partículas se origina da sabedoria
profana
Capítulo 5.
33. Efetivamente, estes hereges foram induzidos em erro, devido
a uma tese de pensadores “de fora”. Estes atribuem a seres de diferente
natureza os termos de quem e por quem. Segundo eles, de
quem indicaria a matéria; quanto à locução por quem, representaria
um instrumento, ou de modo geral, qualquer auxílio.
34. Ou antes (Que nos impede, depois de ter apreendido o
conjunto de seus ensinamentos, rapidamente convencer a estes homens de
incoerência perante a verdade e de desacordo em relação àqueles filósofos?), os
que empregaram seu tempo em estudar a vã filosofia, expõem de várias formas a
natureza das causas, que classificam em várias espécies.
35. Umas são denominadas causas “principiadoras”, outras
chamam-se “causas de manutenção” ou “cooperadoras”, outras ainda,
“necessárias”.
36. De cada qual, porém, delimita-se a peculiaridade e a
expressão. Assim, de um modo se assinala o artífice e de outro, o instrumento.
37. Ao artífice, julgam eles, convém a locução por quem. Diz-se,
com razão, de um banco, que foi feito por
marceneiro. Ao instrumento convêm os
termos por meio de quem, pois, dizem eles, o objeto foi feito por meio do machado, da
verruma etc.
38. De modo semelhante, eles atribuem os termos de quem à
matéria. O objeto manufaturado é de
madeira. Os termos segundo o qual referem-no
ao projeto, o modelo proposto ao artífice. Ora, ou ele previamente esboçou na
mente o objeto, e depois fê-lo passar da imaginação à obra concreta; ou considera
o modelo que tem sob os olhos, e trabalha de acordo com a aparência deste
modelo.
39. A expressão para
quem, referem-na ao fim. O banco foi feito para a
utilidade dos homens. Os termos em
que assinala o tempo ou o espaço.
40. Quando foi feito? Naquele
tempo. E onde foi feito? Naquele lugar.
Embora essas circunstâncias nada acrescentem aos fatos, sem elas nada é
possível. Tempo e lugar são indispensáveis para qualquer ação.
41. Tendo aprendido e admirado tais opiniões, observações vãs e
ilusões fúteis, eles querem introduzi-las na doutrina simples e sem artifícios
sobre o Espírito, visando a depreciar o Verbo de Deus e rejeitar o Espírito Santo.
42.
Os vocábulos que os sábios “de fora”
aplicam aos instrumentos inanimados, ou os termos com que assinalam um serviço
subalterno e em extremo humilhante, isto é, por
quem, eles não hesitam empregá-los
relativamente ao Senhor do universo, e não se envergonham esses cristãos de
atribuir ao Artífice da criação uma expressão usada para a serra ou o martelo.
O que você destaca neste texto?
Como serve para a sua espiritualidade?
Hereges
Facilmente aparecem os que nos
espreitam e nos interrogam continuamente, mas é dificílimo encontrar uma alma
desejosa do saber e que procura a verdade, a fim de curar a própria ignorância.
SÃO BASÍLIO MAGNO - (330-379) - Tratado sobre o
Espírito Santo (Capítulos 01 ao 05).
Hereges
Daí vem que eles destinam a Deus Pai, como porção de escol,
a expressão de quem. Determinam para Deus Filho a expressão por quem; quanto
ao Espírito Santo, reservam-lhe a expressão em
quem. E afirmam que de forma alguma o emprego
destas partículas deve ser alterada, a fim de que, como já disse, a diferença
das denominações revele simultaneamente a diversidade das naturezas. SÃO BASÍLIO MAGNO
- (330-379) - Tratado
sobre o Espírito Santo (Capítulos 01 ao 05).
Ensino – Importância do
É justo dar-lhe todo apoio, estimulá-lo, partilhar seu zelo,
e vir em ajuda daquele que insta a irmos até o fim. Não ouvir superficialmente
os termos teológicos, mas tentar descobrir o sentido oculto de cada palavra, de
cada sílaba, não é próprio dos tíbios, e sim daqueles que conhecem a finalidade
de nossa vocação, pois nos é proposto assemelharmo-nos a Deus, quanto possível
à natureza humana. Todavia, não há semelhança sem conhecimento (gnosis), e este
conhecimento se obtém por meio de ensino. SÃO
BASÍLIO MAGNO - (330-379) - Tratado sobre o Espírito Santo (Capítulos
01 ao 05).
Ensino – Importância do
Mas, que digo? Basta um aceno com a cabeça, para testemunhar
a Cristo, e já se considera cumprido o dever da piedade. Sendo assim, que termo
teológico será pequeno demais para se tornar expressivo, ou inexato, inclinando
o fiel da balança de um lado ou de outro? SÃO
BASÍLIO MAGNO - (330-379) - Tratado sobre o Espírito Santo (Capítulos
01 ao 05).
Ensino – não
abandonar a pesquisa
Se alguém se rir de nossa loquacidade — para falar como o
salmo (Sl 118,85) — em torno de sílabas apenas, fique ciente de que deste riso
colherá um fruto imprestável; nós, porém, não haveremos de abandonar a
pesquisa, nem nos haveremos de dobrar diante da crítica dos homens, nem de
desanimar em vista deste desprezo. SÃO BASÍLIO MAGNO
- (330-379) - Tratado
sobre o Espírito Santo (Capítulos 01 ao 05).
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