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SÃO BASÍLIO MAGNO, ou
de CESAREIA
(330-379)
Regra Monástica - Asketikon
As Regras Extensas (55
regras)
Questões 16 a 18
Introdução geral para todos os estudos
da Regra Monástica:
Basílio
Magno (†379), bispo da Cesareia da Capadócia, viveu num tempo em que muitos
cristãos buscavam a santidade retirando-se para o deserto, influenciados pelos
exemplos de Santo Antão e São Pacômio, no Egito. Mas Basílio percebeu que o
isolamento excessivo poderia gerar vaidade espiritual e afastar o monge da
caridade. Por isso, reformulou o ideal monástico com um caráter comunitário e
eclesial, centrado no amor fraterno, na oração e no serviço. Por isso escreveu
a Regra Monástica (Asketikon).
Estrutura
dos mosteiros basilianos: Os mosteiros fundados por Basílio (ou organizados
segundo suas Regras) não eram fortificações isoladas, mas comunidades vivas
próximas das cidades, integradas à vida da Igreja.
Características
principais dos Mosteiros:
a)
Vida em comunidade: os monges viviam juntos, sob a direção de um superior partilhando
tudo em comum — à semelhança da comunidade cristã de Atos 2.42–47. b) Edificações
simples: os mosteiros tinham dormitórios coletivos, refeitório, capela
para as orações, oficinas de trabalho manual e um espaço para acolher viajantes
e pobres. c) Localização: geralmente em lugares
tranquilos, mas não totalmente isolados, para permitir o contato com o povo e o
serviço aos necessitados. d) Hospitalidade: cada mosteiro
tinha uma casa para hóspedes e um pequeno hospital ou enfermaria, pois Basílio
considerava o cuidado aos doentes parte da vida evangélica.
QUESTÃO 16
SE É NECESSÁRIA A TEMPERANÇA PARA OS QUE DESEJAM VIVER
PIAMENTE
Resposta
1.
É
evidente ser necessária a temperança. Em primeiro lugar, porque o Apóstolo
enumera a temperança entre os frutos do Espírito (G1 5,23). Segundo porque
declara tornar-se por meio dela imaculado nosso ministério, quando diz: Nos
trabalhos, nas vigílias, nos jejuns, pela castidade (2Cor 6,5). E em
outra passagem: ...trabalhos e fadigas, repetidas vigílias, com fome e
sede, frequentes jejuns (2Cor 11,27) . E de novo: Todos os
competidores se impõem a si toda a espécie de abstinência (ICor 9,25).
2.
Nada
reprime tanto o corpo e o reduz à servidão como a temperança. Contém o ardor da
juventude e vence as dificuldades em reprimir-lhe os impulsos, como um freio.
3.
Não convém ao insensato viver entre delícias, diz Salomão (Pv 19,10)
. Que há de mais insensato do que a carne bem tratada e a juventude
desencaminhada?
4.
Pelo
que diz o Apóstolo: Não vos preocupeis com a carne para satisfazer os
seus desejos (Rm 13,14). E: Aquela que vive nos prazeres, está
morta, embora pareça viva (lTm 5,6).
5.
O
exemplo dos deleites do rico demonstra-nos que a temperança nos é necessidade para não ouvirmos a mesma
sentença que ele: Recebeste teus bens em vida (Lc 16,25).
6.
Quão
temível é a intemperança, mostra o Apóstolo ao enumerá-la entre as propriedades
da defecção: Nos últimos dias haverá um período difícil. Os homens
tornar-se-ão egoístas (2Tm 3,1 e 2); e enunciando várias espécies de
maldades, acrescenta: caluniadores, intemperantes (ibid. 3).
7.
A
intemperança de Esaú foi condenada como sendo o maior de seus males, porque
vendeu a primogenitura por uma iguaria (Gn
25,33).
8.
E
a primeira desobediência do homem proveio da intemperança.
9.
Foi
testemunhado que todos os santos possuíam a temperança. Todas as vidas dos
santos e bem-aventurados e o próprio exemplo do Senhor, em seu advento na
carne, são de proveito para nós, neste sentido.
10.
Moisés,
por longa perseverança no jejum e na oração, recebeu a lei e ouviu as palavras
de Deus: Como um homem fala com o seu amigo (Ex
33,11).
11.
Elias
foi considerado digno da visão de Deus, quando também ela empregou de igual
modo a temperança (lRs 19,8).
12.
E
Daniel, como foi que viu maravilhas? Não foi depois dos vinte dias de jejum?
(Dn 10,3).
13.
Como
extinguiram os três jovens a violência do fogo? Não foi pela abstinência? (Dn
1,8).
14.
Igualmente
João iniciou seu estado de vida pela abstinência (Mt 3,4; Lc 1,15).
15.
Com
ela o próprio Senhor começou sua manifestação (Mt 4,2).
16.
Chamamos
temperança não uma total abstenção de alimentos (seria violenta destruição da
vida), mas a privação dos deleites para a destruição do senso carnal e obtenção
do escopo da piedade.
17.
Em
resumo, nós que seguimos o ritmo da piedade, precisamos da abstinência daqueles
prazeres, apetecíveis aos que vivem segundo as paixões.
18.
Não
somente na moderação do prazer do paladar se pratica a temperança, mas se
estende à privação de tudo o que possa servir de obstáculo.
19.
O
verdadeiro temperante não domina apenas o ventre, e deixa-se superar pela
glória humana; não supera os desejos vergonhosos sem vencer igualmente as
riquezas, ou qualquer outro sentimento ignóbil, como a ira, a tristeza ou os
demais vícios que costumam escravizar as almas grosseiras.
20.
Dá-se
em relação à temperança quase o mesmo que verificamos nos mandamentos; de tal
modo são conexos que é impossível cumprir um sem os outros.
21.
O
temperante, quanto à glória, é também humilde. Cumpre a medida evangélica da pobreza
quem é temperante diante das riquezas.
22.
Não
se ira quem contém a indignação e a cólera.
23.
A
temperança perfeita torna a língua comedida, os olhos recatados, os ouvidos não
curiosos.
24.
Quem
assim não se mantém, é intemperante e licencioso. Vês como ao redor deste único
mandamento se reúnem os outros em coro?
QUESTÃO 17
IMPORTA TAMBÉM CONTER O RISO
Resposta
25.
Digno
da atenção cuidadosa dos ascetas é aquilo que muitos negligenciam. Ser dominado
por um riso imoderado e imódico é sinal de intemperança, de movimentos de intranquilidade
e de que a razão severa não reprime o relaxamento do espírito.
26.
Não
é inconveniente mostrar expansão da alma com um sorriso sereno, apenas para
indicar o que foi escrito: O coração contente alegra o semblante (Pr
15,13).
27.
Mas,
rir-se alto e sacudir-se involuntariamente não é próprio de quem possui
espírito tranquilo, probo e senhor de si.
28.
O
Eclesiastes, reprovando essa espécie de riso, porque prejudica a firmeza do espírito,
declara: Do riso eu disse: Loucura! (Ecl 2,2). E: Como o
crepitar dos espinhos, tal é o riso do insensato (ibid. 7,7).
29.
O
próprio Senhor sujeitou-se a quanto afeta forçosamente a carne e serve de
testemunho de virtude, tal o cansaço e a comiseração pelos aflitos; nunca,
porém, se riu, ao menos quanto consta da história dos evangelhos. Antes chama
infelizes os que se riem (Lc 6,25).
30.
Não
nos engane a ambiguidade da palavra riso. É comum que a Escritura denomine riso
a alegria da alma e um sentimento alegre, proveniente de um bem, como disse
Sara: Deus deu um motivo de riso (Gn 21,6). E: Bem-aventurados
vós, que agora chorais, porque rireis (Lc 6,21).
31.
Encontra-se
em Jó: A boca verdadeira se encherá de riso (Jó 8,21). Tais
termos são usados em lugar de hilaridade, que provém da alegria da alma.
32.
Eis
por que é perfeito temperante aquele que está acima de qualquer paixão e não
sofre o estímulo da volúpia, nem o manifesta, mas permanece continente e forte
contra todo deleite nocivo.
33.
Este,
evidentemente, está livre de qualquer pecado.
34.
Algumas
vezes temos a obrigação de nos abster mesmo de coisas permitidas e necessárias
à vida.
35.
Isto
sucede quando, para o bem de nossos irmãos, a abstinência está prescrita.
Assim, o Apóstolo: Se a comida serve de ocasião de queda a meu irmão, jamais
comerei carne (ICor 8,13). E tendo o direito de viver do evangelho, não
usou deste direito: para não pôr algum obstáculo ao evangelho de Cristo (ibid.
9,12).
36.
A
temperança, pois, apaga os pecados, expulsa as paixões, mortifica o corpo e até
as paixões e os desejos naturais; é início da vida espiritual, penhor dos bens
eternos, extinguindo a volúpia em si mesma.
37.
Esta
é sempre a grande sedução do mal que a nós homens inclina fortemente ao pecado.
É uma espécie de anzol, que arrasta a alma à morte.
38.
Portanto,
quem não se torna efeminado, nem se deixa dobrar por ela, evita todos os pecados
por meio da temperança.
39.
Se
alguém evita a maior parte deles, mas se deixa vencer por um só, já não é mais
continente, como quem sofre de uma só doença corporal já não está são.
40.
Quem
se sujeita ao domínio de um só, seja de quem for, já não é mais livre.
41.
As
demais virtudes praticadas às ocultas raramente chamam a atenção dos homens; a
temperança, porém, já no primeiro encontro revela quem a possui.
42.
Como
a corpulência e a boa cor caracterizam o atleta, assim a magreza e a palidez
proveniente da continência denotam que o cristão é, de fato, atleta dos mandamentos
de Cristo.
43.
Na
fraqueza do corpo vence o inimigo e evidencia sua força nos combates da
piedade, segundo a palavra: Quando me vejo em fraqueza, então é que sou
forte (2Cor 12,10).
44.
Só
em ver o continente tira-se grande proveito. Mal toca, e com parcimônia, nas
coisas necessárias, como que cumprindo um ministério oneroso, devido à
natureza, e lastima o tempo nisto gasto, levantando-se da mesa com prontidão
para praticar as boas obras.
45.
Julgo que não há palavra que abale tanto o intemperante
na comida e o leve à mudança como ver um homem temperante.
46.
E
isto é, ao que parece, comer e beber para a glória de Deus, de modo que até à
mesa brilhem nossas boas obras para a glorificação de nosso Pai que está nos
céus.
QUESTÃO 18
SE CONVEM PROVAR DE TUDO QUE PÕEM DIANTE DE NÓS
Resposta
47.
Para
reprimir o corpo é necessário que se estabeleça, aos que combatem pela piedade,
que a temperança lhes é indispensável, pois todos os competidores a si
impõem toda espécie de abstinência (ICor 9,25).
48.
Para
não cairmos, contudo, como os inimigos de Deus, que têm cauterizada a própria
consciência e por isso se abstêm dos alimentos que Deus criou para serem
tomados com ações de graças pelos fiéis, convém provar de cada um, se houver
ocasião, de sorte a mostrar aos que vêm que tudo é puro para os que são
puros (Tt 1,15), que toda criatura de Deus é boa e que nada deve ser
rejeitado do que se toma com ação de graças, pois isso se torna
santificado pela palavra de Deus e pela oração (lTm 4,4.5).
49.
Assim
seja guardada a temperança: Usem-se os alimentos mais simples e indispensáveis
à vida, à medida que for necessário, e evite-se o mal da saciedade, abstendo-se
inteiramente de todos os manjares deliciosos.
50.
Deste
modo eliminaremos o vício do amor às delícias, e curaremos, à medida que
depender de nós, aqueles que têm cauterizada a consciência; em ambos os casos,
livrar-nos-emos de suspeitas. Por que razão seria regulada a minha liberdade
pela consciência alheia? (ICor 10,29).
51.
A
temperança indica aquele que morreu com Cristo e mortificou seus membros
terrestres.
52.
Sabemos
que ela é a mãe da castidade, protetora da saúde, e que elimina perfeitamente
os obstáculos às obras fecundas em Cristo; porque, segundo a palavra do Senhor,
os cuidados do mundo, os prazeres da vida e as demais concupiscências sufocam a
palavra e a tornam infrutuosa (Mt 13,22).
53.
Dela
fogem os demônios, como nos ensinou o Senhor: Quanto a esta espécie de
demônios, só se pode expulsar à força de oração e de jejum (Mt 17,20).
O
que você destaca no texto?
Como
serve para sua espiritualidade?
O
que ensina para nossa Igreja atual?
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