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História Eclesiástica de Eusébio de
Cesaréia
Livro III
- Capítulos 09 a 19
Texto Bíblico: Lc 24.18; Jo 19.25
IX - De
Josefo e os escritos que deixou
X - De que maneira cita os livros
divinos
XI - De como Simeão dirige a Igreja de Jerusalém depois
de Tiago
XII - De como Vespasiano ordena que se busquem os
descendentes de Davi
XIII - De como o segundo bispo de Roma é Anacleto
XIV - De como o segundo a dirigir os alexandrinos é Abílio
XV - De
como o terceiro bispo de Roma, depois de Anacleto, é Clemente
XVI - Da carta de Clemente
XVII - Da
perseguição sob Domiciano
XVIII - Sobre o apóstolo João e o "Apocalipse"
XIX - De como Domiciano ordena a morte aos descendentes de
Davi
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1. Depois de todas
estas coisas, seria bom não ignorar o próprio Josefo – que tanto material
forneceu para a obra que tens entre as mãos - de que país e de que família
procedia. Também será ele mesmo quem nos declarará isto.
Diz assim:
"Josefo,
filho de Matias, sacerdote originário de Jerusalém, que primeiro fez guerra
pessoalmente contra os romanos e logo, por necessidade, ficou à mercê dos
acontecimentos posteriores[1]."
2.
Foi o mais famoso de todos os judeus de sua época, e não
somente entre seus compatriotas, mas também entre os romanos, ao ponto de ser
honrado com uma estátua[2]
em Roma, e seus livros serem considerados dignos de uma biblioteca.
3. Josefo expôs toda
a Antigüidade judaica em vinte livros completos, e a História da
guerra romana de seu tempo em sete. Ele mesmo atesta que não a entregou
apenas em língua grega, mas também em sua língua materna[3].
Por tudo o mais é digno de crédito.
4. Há também dele outros livros dignos de estudo, intitulados Sobre a
antigüidade dos judeus. Neles refuta o gramático Apion, que tinha então
composto um tratado contra os judeus. Também refuta a outros
que haviam tentado igualmente caluniar as instituições pátrias do povo judeu.
5.
No primeiro destes livros
estabelece o número de escritos do chamado Antigo Testamento, mostrando quais são os não discutidos
entre os hebreus, como provenientes de uma antiga
tradição. Diz textualmente:
X - De que maneira cita os livros divinos
1.
"Não há pois entre nós milhares de livros em desacordo e
em mútua contradição, mas há sim, apenas
vinte e dois livros que contêm a relação de todo o tempo e que com
justiça são considerados divinos.
2.
Destes, cinco são de Moisés, e
compreendem as leis e a tradição da criação do homem até a morte de Moisés.
Este período abarca quase três mil anos.
3.
Desde a morte de Moisés até a de Artaxerxes, rei dos persas
depois de Xerxes, os profetas posteriores a
Moisés escreveram os fatos de suas épocas em treze livros. Os outros quatro
contêm hinos em honra a Deus e regras de vida para os homens.
4. Desde Artaxerxes até nossos dias tudo foi escrito, mas nem tudo merece a mesma confiança
que o anterior, por não apresentar sucessão exata dos profetas.
5.
Mas os fatos manifestam como nós
nos sentimos próximos a nossas escrituras. Assim é que,
transcorrido já tanto tempo, ninguém se atreveu a acrescentar, nem tirar, nem mudar nada nelas, antes, é natural a todos os
judeus, já desde seu nascimento, crer que estes escritos são decretos de Deus, e aferrar-se a eles e prazerosamente morrer por eles caso seja
necessário."
6.
Estas palavras do autor aqui apresentadas não deixarão de ser
úteis. Há também outra obra escrita por ele, não sem nobreza, Sobre a
supremacia da razão, que alguns intitularam Macabeus, porque contém
as lutas dos hebreus valentemente sustentadas em defesa da piedade para com
Deus e referidas nos escritos assim
chamados Dos Macabeus[4].
7.
E quase no final do livro XX de suas,
Antigüidades, o mesmo autor acrescenta a declaração de que tem o propósito
de escrever em quatro livros, seguindo as crenças pátrias
dos judeus, acerca de Deus e de sua essência, e sobre as leis; porque,
segundo elas, algumas coisas podem ser feitas e outras são proibidas. O mesmo autor, em seus próprios
tratados, menciona outras obras por ele produzidas.
8.
Além disso, será bom mencionar
também as palavras que estão no final de suas Antigüidades, para confirmação
dos testemunhos que dele tomei. Quando
acusa Justo de Tiberíades - que tentara fazer, assim como ele mesmo, uma
história dos fatos daquele tempo - de não haver escrito a verdade, depois de
incluir outras muitas emendas, acrescenta textualmente o que segue:
9.
"Na verdade eu não tenho os
mesmos temores que tu tens no que se refere a meus escritos, pois
entreguei meus livros aos próprios imperadores estando os fatos ainda quase ante os olhos, porque tinha consciência de ter
conservado a tradição da verdade, e não me enganei ao
esperar obter seu testemunho.
10. Também enviei minha narrativa a muitos outros, alguns dos quais tinham estado na guerra,
como o rei Agripa e alguns parentes seus.
11.
E ocorre que o imperador Tito quis
que o público fosse informado dos fatos somente através destes livros, tanto é
assim que ele assinou a ordem de publicá-los
de próprio punho. E o rei Agripa escreveu sessenta e duas cartas atestando
que os livros transmitem a verdade." Destas
cartas Josefo inclusive cita duas. Mas baste o que já dissemos sobre ele,
e prossigamos.
XI - De como Simeão dirige a Igreja de Jerusalém depois de
Tiago
1. Depois do martírio de Tiago e da tomada de Jerusalém, que se seguiu imediatamente, é
tradição que os apóstolos e discípulos do Senhor que ainda viviam reuniram-se
de todas as partes num mesmo lugar, junto com os que eram da família do Senhor
segundo a carne (pois muitos deles ainda viviam), e todos celebraram um
conselho sobre quem seria considerado digno
de suceder a Tiago, e todos, por unanimidade, decidiram que Simeão, o
filho de Clopas - mencionado também pelo texto do Evangelho[5]
-, era digno do trono daquela igreja, por ser primo do Salvador, ao menos
segundo se diz, pois Hegesipo refere que Clopas era irmão de José.
XII - De como Vespasiano ordena que se busquem os
descendentes de Davi
1. Depois disso Vespasiano, após a tomada de Jerusalém,
deu a ordem de buscar todos os descendentes
de Davi, para que entre os judeus não sobrasse ninguém da estirpe real.
Por esta causa justificou-se mais uma grande perseguição aos judeus[6].
XIII - De como o segundo bispo de Roma é Anacleto
1. Depois de imperar Vespasiano durante dez anos, sucede-o como imperador seu filho Tito. No
segundo ano de seu reinado, Lino, bispo da igreja de Roma, depois de exercer o cargo durante doze anos, transmite-o a
Anacleto. Tito, que imperou dois anos e uns poucos meses, foi sucedido
por seu irmão Domiciano.
XIV - De como o segundo a dirigir os alexandrinos é Abílio
1. No quarto ano de Domiciano morre Aniano, primeiro
bispo da igreja de Alexandria, após haver
completado vinte e dois anos, sucede-o Abílio como segundo bispo.
XV - De
como o terceiro bispo de Roma, depois de Anacleto, é Clemente
1. No duodécimo ano do mesmo reinado[7], Clemente
sucede a Anacleto, que havia sido bispo da igreja de Roma
durante doze anos. O apóstolo, em sua carta aos Filipenses, faz saber a estes
que Clemente era colaborador seu, dizendo: Com Clemente também e os demais
colaboradores meus, cujos nomes estão no livro da vida[8].
XVI - Da carta de Clemente
1. Deste existe uma Carta universalmente admitida, longa
e admirável, que escreveu em nome da igreja
de Roma à dos Coríntios, tendo como motivo uma sedição ocorrida em Corinto. Sabemos que esta carta foi lida publicamente na assembléia na maior parte das igrejas,
não apenas antigamente, mas também
em nossos dias. E Hegesipo é testemunha suficiente de que no tempo
indicado houve a sedição de Corinto.
XVII - Da
perseguição sob Domiciano
1. Domiciano deu provas de uma grande
crueldade para com muitos, dando morte sem julgamento razoável a não pequeno
número de patrícios e de homens ilustres, e
castigando com o desterro fora das fronteiras e confisco de bens a outras inúmeras personalidades sem
causa alguma. Terminou por constituir a si mesmo sucessor de Nero na
animosidade e guerra contra Deus.
Efetivamente ele foi o segundo a promover a perseguição contra nós, apesar de que seu pai Vespasiano nada de mal
planejou contra nós.
XVIII - Sobre o apóstolo João e o "Apocalipse"
1.
É tradição[9] que, neste
tempo, o apóstolo e evangelista João, que ainda vivia, foi
condenado a habitar a ilha de Patmos por ter dado testemunho do Verbo de Deus.
2.
Pelo menos Irineu, quando escreve acerca do número do nome
aplicado ao anticristo no chamado Apocalipse
de João[10],
diz no livro V Contra as heresias, textualmente sobre
João o que segue:
3.
Mas se fosse necessário atualmente
proclamar abertamente seu nome[11], seria feito
por meio daquele que também viu o Apocalipse, já que não faz muito tempo que foi visto, mas quase em nossa geração, ao final do império
de
Domiciano."
4. Mas deve-se saber que de tal maneira brilhou por aqueles dias o
ensinamento de nossa fé, que até os escritores alheios a nossa doutrina não vacilaram
em transmitir em suas narrativas a perseguição e os martírios que então ocorreram. Indicaram inclusive com total exatidão
a data ao referir que no décimo quinto ano de Domiciano, Flávia
Domitila, filha de uma irmã de Flávio
Clemente, um dos cônsules daquele ano em Roma, junto com muitos outros,
foi castigada com o desterro à ilha de Pontia, por causa de seu testemunho
sobre Cristo.
XIX - De como Domiciano ordena a morte aos descendentes de
Davi
1. O próprio Domiciano deu ordem de executar os membros da
família de Davi, e uma antiga tradição diz que alguns hereges acusaram os
descendentes de Judas - que era irmão do Salvador segundo a carne —, com o pretexto de que eram da família de Davi e
parentes do próprio Cristo[12]. Isto é
o que declara Hegesipo quando diz textualmente:
O que mais te chamou a
atenção neste texto?
O que o texto contribui
para a sua espiritualidade?
[1]
Nasceu
no primeiro ano de Calígula (37-38 d.C), entrou em contato com os romanos em 64. Em 66 comanda parte das forças
revolucionárias da Galiléia e cai prisioneiro dos romanos em 67. Desde sua
libertação em 69 toma parte dos acontecimentos ao lado dos romanos e
vive em Roma o resto de seus dias.
[2] Esta é a
única referência que existe sobre esta estátua.
[3]
Conserva-se apenas a versão grega, perdeu-se a aramaica.
[4] Esta
obra não foi escrita por Josefo, mas por um autor contemporâneo ou pouco
posterior.
[5] Lc
24:18; Jo 19:25. Escrito Cléopas em português.
[6] Não há
outro registro sobre esta ordem e a perseguição conseqüente; é difícil avaliar
o valor histórico desta citação.
[7] O
duodécimo ano do reinado de Domiciano corresponde a 93 d.C.
[8] Fp 4:3,
a identificação com este Clemente não tem o menor fundamento.
[9] Tradição
escrita, consta das Memórias de Hegesipo.
[10] Ap
13:17-18.
[11] O do
anticristo.
[12] Não se
sabe quem eram estes hereges.