segunda-feira, 25 de março de 2019

89 - Tertuliano de Cartago (155-220) Apologia (Capítulo 24 - 27)



89
Estudo sobre os Pais da Igreja: Vida e Obra
Tertuliano de Cartago (155-220)
Apologia (Capítulo 24 - 27)


 CAPÍTULO XXIV A explanação inteira desse assunto pelas quais se deduz que eles não são deuses, e que não existe senão um Deus - o Deus que adoramos - é perfeitamente suficiente para nos isentar do crime de traição, principalmente contra a religião romana. Pois, se está claro que tais deuses não existem, não há religião, no caso. Se não existe religião - porque esses deuses não existem - somos certamente inocentes de qualquer ofensa contra a religião.
Em vez disso, a responsabilidade recai sobre vós. Por adorardes uma mentira, sois de fato culpados do crime de que nos acusais, não simplesmente porque recusais a verdadeira religião do verdadeiro Deus, mas porque ousais perseguí-Lo.
Mas, concedendo que esses seres objetos de vossa adoração sejam realmente divindades, não se deve reconhecer universalmente que há um Deus mais elevado e mais poderoso, como ordenador principal do mundo, dotado de poder e majestade absolutos?
De modo usual, se atribui a Deus um poder imperial e supremo, enquanto suas tarefas são distribuídas por muitas divindades, como Platão descreve a respeito do supremo Júpiter habitando nos céus, cercado por uma organização de divindades e demônios.
Convém-nos, portanto, mostrar igual respeito aos procuradores, prefeitos e governadores do Império divino. E por maior crime que alguém cometa, quando, entre nós, uma transgressão capital está restrita à apelação da mais alta autoridade, ninguém além de César, tal pessoa delega seus esforços e suas esperanças a outro, com o objetivo de obter um maior favor do Imperador. Ele não sai declarando que o apelo a Deus ou ao Imperador depende somente do Supremo Senhor.
Que um homem adore Deus, outro a Júpiter; que um levante as mãos suplicantes para os céus, outro para o altar de Fides; outro (se tendes esse ponto de vista) faça sua prece às nuvens, outro aos objetos do teto; que um consagre sua própria vida a seu Deus, e outro a uma cabra. Por ver que não dais importante valor à acusação de irreligião, proibindo a liberdade religiosa ou a escolha livre de uma divindade, não sei como não posso adorar de acordo com minha inclinação, mas sou obrigado a adorar contra ela.
Nem também um ser humano gostaria de receber homenagem prestada a contragosto, e assim os próprios egípcios receberam permissão para o uso legal de sua ridícula superstição, liberdade para fazer de pássaros e feras seus deuses, assim como para condenar à morte quem quer que mate um deus dessa espécie.
Mesmo cada província e cada cidade tem seu deus. A Síria tem Astartéia, a Arábia tem Dusares, os Nórdicos têm Beleno, a África tem sua Celeste, a Mauritânia também suas próprias dignidades.
Eu falei, penso, das Províncias Romanas, e contudo não falei que seus deuses são romanos. Pois que eles não são adorados em Roma, tanto quanto outros que são listadas como divindades em toda a própria Itália por consagração municipal, como Delventino de Cassino, Visidiano de Narnia, Ancária de Áusculo, Nórcia de Orvieto, Valência de Ocrículo, Hóstia de Sátrio, o Pai Curls de Falisco, em honra do qual, também, Juno recebeu seu sobrenome.
De fato, somente nós somos proibidos de ter uma religião própria nossa. Ofendemos aos romanos, somos excluídos de direitos e de privilégios dos romanos porque não adoramos os deuses de Roma. Seria bom que houvesse um único Deus para todos, do qual todos fôssemos adoradores, quiséssemos ou não.
Mas com vossa liberalidade permitis adorar qualquer deus exceto o verdadeiro Deus, como se Ele não fosse o Deus que todos devessem adorar, ao qual todos pertencem. »

CAPÍTULO XXV Eu penso que ofereci prova suficiente sobre a questão da falsa e da verdadeira divindade, mostrando que a prova está não simplesmente fundamentada em debate ou argumento, mas no testemunho dos próprios seres em quem pondes a vossa fé, de modo que esse assunto não precisa mais de discussão.
Contudo, tendo começado a naturalmente falar dos romanos, não posso evitar a controvérsia que é provocada pela divulgada afirmação daqueles que afirmam que, como uma recompensa de sua singular homenagem à religião, os romanos progrediram a tais alturas de poder que se tornaram senhores do mundo.
E, portanto, são certamente divinas os deuses que adoram, porque prosperam acima dos outros aqueles que sobrepujam todos os outros na honra às divindades. Isso, certamente, é o preço que os deuses pagaram aos romanos por sua devoção.
O progresso do Império deve ser atribuído a Estérculo, a Mutuno e Larentina. Pois que dificilmente poderia pensar que deuses estrangeiros estivessem dispostos a favorecer mais uma raça estrangeira do que à sua própria, e entregar sua própria terra, na qual nasceram, na qual se tornaram adultos, ficaram famosos, e, enfim, foram enterrados, em benefício de invasores do outras plagas.
Assim Cibele, se põe suas afeições na cidade de Roma, como herdeira da progênie troiana salva dos exércitos da Grécia, ela própria sendo, certamente, da raça troiana - como se previsse sua transferência para o povo vingador pelo qual a Grécia, conquistadora da Frígia, seria subjugada, e o preferisse mais do que a seu país natal conquistado pela Grécia.
Por que, igualmente, em nossos dias, a Mãe Magna (Cibele) deu uma notável prova de sua grandeza, conferindo como que uma dádiva à cidade, quando, logo após a perda da estátua de Marco Aurélio, em Sírmio, no dia 17 antes das Calendas de Abril, o mais sagrado de seus sacerdotes havia oferecido, uma semana depois, libações impuras de sangue retirado de seus próprios braços, e ordenado que preces usuais deveriam ser feitas pela saúde do imperador, já morto.
Ó mensageiros tardios! Ó correio dorminhoco! Por cuja falta Cibele não recebeu uma notícia atualizada da morte imperial, para que os cristãos não tivessem oportunidade de ridicularizar uma divindade tão indigna. Júpiter, de novo, nunca deveria ter permitido que sua própria Creta caísse, de repente, diante das forças romanas, esquecido totalmente daquele caverna amada e dos címbalos das festas de Cibele, e do doce odor daquela que ali o amamentou.
Não queria Júpiter que seu próprio túmulo fosse exaltado sobre o Capitólio inteiro, porque, preferencialmente, a terra que cobriu suas cinzas poderia vir a ser a senhora do mundo? Desejaria Juno a destruição da cidade Púnica, amada a ponto de negligenciar Samos, e isso por uma nação primitiva? Sim, eu sei, "aqui estavam seus exércitos, aqui estava sua carruagem, este reino, porque permitam os fados, a deusa desejava e sonhava ser a senhora das nações".
A malfadada mulher e irmã de Júpiter não tinha poder para prevalecer contra os fados! "Júpiter mesmo foi ajudado pelo fado". E contudo os romanos nunca prestaram tal homenagem aos fados!
Eles que lhes deram Cartago contra o propósito e a vontade de Juno, assim como da abandonada meretriz Larentina. É indubitável que senão poucos de vossos deuses tiveram poder na terra como reis. Se, então, eles agora possuem mais poder de agraciar um Império do que quando eles mesmos eram reis, de quem receberam suas honras reais?
A quem Júpiter e Saturno adoravam? A um Estérculo, suponho. Mas, os romanos primitivos junto com os nativos adoraram depois também a quem nunca tinha sido rei? Nesse caso, então, estavam sob o reinado de outros, a quem nunca sujeitaram, já que não se elevaram à liderança divina. Esta, então, pertencia a outros, que podiam presentear os reinos, já que havia reis antes daqueles deuses terem tido seus nomes no rol das divindades.
Mas que loucura agora é atribuir a grandeza do nome romano aos méritos da religião, já que foi depois que Roma se tornou um Império, ou, se quiserdes, um reinado, que a religião que ela professa promoveu seu imenso progresso! É agora o caso?
Foi sua religião a fonte da prosperidade de Roma? Embora Numa Pompílio tenha estabelecido com ardor observâncias supersticiosas, contudo a religião entre os romanos não constava, contudo, de imagens ou templos.
Era frugal em seus modos, seus ritos eram simples, não havia capitólios ascendendo aos céus; mas os altares eram improvisados de turfa, os vasos sagrados eram utensílios de barro do Sâmnio, deles vinha o odor de rosa, e não se viam imagens de Deus. Naquele tempo a habilidade dos Gregos e Toscanos na confecção de imagens não tinha ainda chegado à cidade com os produtos de sua arte.
Os romanos, portanto, não foram conhecidos por sua devoção aos deuses antes de terem alcançado a grandeza. Assim, sua grandeza não foi resultado de sua religião. Como poderia a religião tornar grande um povo que deveu sua grandeza à sua irreligião? Pois que, se não estou errado, reinos e impérios são adquiridos pelas guerras, e são ampliados por vitórias. Mais do que isso, vós não podeis conquistar guerras e vitórias sem a presa e muitas vezes a destruição de cidades. Isto é uma calamidade na qual os deuses têm sua parte de responsabilidade.
Casas e templos sofreram, por isso, igualmente. Há um indiscriminado morticínio de sacerdotes e cidadãos. A mão da rapina se dirige igualmente ao tesouro sagrado e ao tesouro do povo. Assim os sacrilégios dos romanos são tão numerosos como seus troféus. Eles se vangloriam tanto de triunfos sobre os deuses como sobre as nações.
Apropriam-se tanto de despojos de batalha, como de imagens das divindades cativas. Os pobres deuses se submetem a ser adorados por seus inimigos, e ainda proporcionam um Império ilimitado àqueles de cujas mãos receberam por retribuição mais injúrias do que homenagem simulada. Mas as divindades inconscientes são desonradas impunemente, exatamente como são em vão adoradas.
Certamente nunca podeis acreditar que a devoção à religião fez evidentemente progredir a grandeza um povo que, como disse, cresceu seja por injuriar a religião, seja ter uma religião injuriada por seu crescimento. Igualmente, aqueles cujos reinos se tornaram parte desse grande todo que é o Império do Romano, não eram sem religião, quando seus reinos lhes foram tomados. »

CAPÍTULO XXVI Examinai e vede se Ele não é o dispenseiro dos reinos, aquele que é simultaneamente o Senhor do mundo, por quem é governado, e que governa os próprios homens; se Ele não fez as mudanças de dinastias, com suas indicadas seqüências, que existiu antes de todos os tempos e determinou no mundo uma continuidade de tempos.
Se o soerguimento e a queda dos países não são Sua obra, sob cuja soberania a raça humana primitivamente existiu sem nenhuma país. Como explicais que incidis em tal erro? Porque a Roma de simplicidade rural dos tempos primitivos é mais velha do que muitos de seus deuses. Ela reinou antes que seu orgulhoso e imenso Capitólio fosse construído.
Os babilônios também se constituíram em Império antes dos dias dos pontífices, e os medas antes dos qüindecênviros. Os egípcios antes dos sálios.
A Assíria antes de Lupércio, e as amazonas antes das Virgens Vestais. E para acrescentar outro ponto: se as religiões de Roma lhe proporcionaram um Império, a antiga Judéia nunca teve um, desprezando-o como fez com um e todos aqueles ídolos divinizados; a Judéia cujo Deus, vós, romanos, certa vez honraram com vítimas, com presentes de seu Templo, e com tratados de seu povo, ela nunca esteve sob vosso cetro, senão por ocasião dessa última e final ofensa contra Deus, quando rejeitaram e crucificaram Cristo. »

CAPÍTULO XXVII Bastante já foi dito nessas explicações para refutar a acusação de traição contra vossa religião e porque não podemos ser considerados prejudiciais àqueles que não existem... Portanto, quando somos convidados a sacrificar, recusamos resolutamente, apoiados no conhecimento que temos, pelo qual estamos certos sobre a realidade dos seres aos quais esses sacrifícios são oferecidos, sob a profanação de imagens e a deificação de seres humanos.
Muitos, de fato, julgam isso um ato de insanidade, pois estando em nosso poder oferecer logo o sacrifício e nos livrarmos do castigo, mantemos nossas convicções; é que preferimos uma persistência obstinada em nossa confissão, para nossa salvação. Vós nos avisais, é certo, que assim estamos tirando vantagens de vós, mas sabemos de quem procedem tais sugestões, quem está por trás disso, querendo vencer nossa constância, e como faz todo esforço, agora com manhosa persuasão e depois com perseguição sem piedade.
Não é outro senão o espírito, meio demônio, meio anjo que, nos odiando por causa de sua própria separação de Deus, levado pela inveja do favor que Deus nos tem demonstrado, vira vossas mentes contra nós com influências ocultas, moldando-as e instigando-as a todas as perversidades no julgamento, e àquela crueldade indevida que mencionamos no começo de nosso trabalho, quando iniciamos esta discussão.
Porque, embora todo o poder dos demônios e maus espíritos nos esteja sujeito, contudo, como escravos, indispostos muitas vezes, estão cheios de medo: assim são eles também. Por medo, também inspiram ódio.
Além disso, em sua condição desesperada, já que estão condenados, causa-lhes algum conforto quando adiam o castigo e usufruem de suas disposições malignas.
No entanto, quando nossas mãos são levantadas contra eles, ficam subjugados de repente, submissos a seu lugar; e àqueles a quem se opõem à distância, reservadamente pedem misericórdia.
Assim, nas sedes rebeladas, em prisões ou minas, ou em qualquer um desses locais para penas escravas, são aqueles que se revoltam contra nós, seus senhores, sabendo sempre que não são ameaça para nós e, exatamente por isso, de fato, se entregam mais renhidamente à destruição.
Nós lhes resistimos a contragosto, como se fossem nossos iguais, e os enfrentamos perseverando naquilo que eles atacam. Nosso triunfo sobre eles nunca é mais completo do que quando somos condenados pela resoluta adesão à nossa fé. »

O que você destaca no texto?
Como ele serviu para sua espiritualidade?


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