segunda-feira, 13 de abril de 2020

130 - Cipriano de Cartago (210-258) A Oração do Senhor (8 - 9)


Domingo de Páscoa – Verdadeiramente Ele ressuscitou! | Glória

130
Estudo sobre os Pais da Igreja: Vida e Obra
Cipriano de Cartago (?-258)
A Oração do Senhor (8 - 9)


Ministração do Estudo 130



8. Seja feita a tua vontade assim na terra como no céu.
Acrescentamos ainda o seguinte: “seja feita a tua vontade, assim na terra como no céu”; não para que Deus faça o que quer, mas para que nós possamos fazer o que Deus quer.
Com efeito, quem impediria Deus de fazer o que quer?
Porque nós, porém, somos perturbados pelo diabo, que impede que sigamos a Deus inteiramente, com toda a nossa alma e a nossa ação, oramos e suplicamos para que se faça em nós a vontade de Deus.
Para que se faça em nós, é indispensável essa mesma vontade de Deus, isto é, a sua ajuda e proteção; pois ninguém se sustenta por suas próprias forças, mas graças à indulgência (tolerância, clemência) e à misericórdia de Deus.
Finalmente, o próprio Senhor indica a debilidade do homem, que ele carregava [em si], dizendo: “Pai, se é possível, afasta de mim este cálice”; e, deixando aos discípulos um exemplo para que não fizessem a própria vontade, mas a de Deus, acrescentou: “Contudo, faça-se não o que eu quero, mas o que tu queres” (Mateus 26.39).
Também diz, em outro lugar: “Não desci do céu para fazer a minha vontade, mas a vontade
daquele que me enviou” (João 6.38).
Se o Filho esteve atento para cumprir a vontade do Pai, quanto mais deve estar atento o servo para fazer a vontade do Senhor; como São João instrui igualmente, em sua epístola, exortando a cumprir a vontade de Deus, dizendo: “Não ameis o mundo, nem o que está no mundo. Se alguém ama o mundo, a caridade do Pai não está nele. Pois tudo que está no mundo é concupiscência da carne, concupiscência dos olhos e ambição do século, que não vem do Pai, mas da concupiscência do mundo. O mundo passará, e igualmente a sua concupiscência; aquele, porém, que cumprir a vontade de Deus permanece eternamente” (I João 2.15-17).
Nós que queremos permanecer eternamente devemos cumprir a vontade de Deus, que é eterno.
E a vontade de Deus é a que Cristo praticou e ensinou: Humildade na vida, estabilidade na fé, veracidade nas palavras; justiça no agir, misericórdia nas obras, disciplina nos costumes; não saber praticar a injúria e saber tolerar a recebida, manter a paz com os irmãos; amar a Deus com todo o coração, amando nele o que é Pai e temendo o que é Deus; nada prepor (antepor) ao Cristo, porque ele também, em relação a nós, nada prepôs; aderir inseparavelmente à sua caridade, unir-se à sua cruz com firmeza e fé.
Se houver luta pelo seu nome e sua honra, [é] manifestar a constância na palavra com que o confessamos; na tortura, [é manifestar] a firmeza com que combatemos e, na morte, a paciência pela qual somos coroados.
Isso é querer ser co-herdeiro do Cristo; isso é praticar o preceito de Deus; isso é cumprir a vontade do Pai.
Mas pedimos que seja feita a vontade de Deus, assim na terra como no céu, porque ambos dizem respeito à nossa segurança e salvação.
Pois, como possuímos um corpo da terra e um espírito do céu, assim nós somos terra e céu; e oramos para que em ambos, isto é, no corpo e no espírito, seja feita a vontade de Deus.
Há, na verdade, uma luta entre a carne e o espírito e uma mútua discórdia diária [entre ambos], de modo que fazemos o que não queremos: enquanto o espírito procura o que é celeste e divino, a carne deseja o que é secular e terreno.
Por isso pedimos que, pela intervenção e auxílio de Deus, se estabeleça a harmonia entre eles, a fim de que, enquanto a vontade de Deus se realiza na carne e no espírito, a alma por ele renascida [assim] se mantenha.
Isso é o que declara de maneira nítida e precisa a palavra do apóstolo: “A carne”, diz ele, “tem desejos contrários aos do espírito e o espírito, contrários aos da carne. São, portanto, adversários um do outro. Desse modo, não fazeis o que quereis. Mas as obras da carne são evidentes; são os adultérios, as fornicações, a impureza, a libertinagem, a idolatria, o malefício, o homicídio, a inimizade, a contenda, a emulação (sentimento que leva o indivíduo a tentar igualar-se a ou superar outrem), os ciúmes, a ira, a rixa, a discórdia, o sectarismo, a inveja, a embriaguez, a glutonaria e as coisas como essas tais. Aqueles que praticam essas coisas não possuirão o Reino de Deus. Mas os frutos do Espírito são a caridade, a alegria, a paz, a magnanimidade, a bondade, a fidelidade, a mansidão, a continência, a castidade” (Gl 5.17-23).
Peçamos, pois, isto em orações diárias, mesmo em orações contínuas: que se faça sobre nós a vontade de Deus, assim na terra como no céu; e esta é a vontade de Deus: que as coisas terrenas cedam lugar às celestes e que prevaleça o que é espiritual e divino.
Pode-se ainda, irmãos caríssimos, entender [esta petição] assim: que – como o Senhor ordena e adverte que amemos também os inimigos e que oremos também pelos que nos perseguem – supliquemos também por aqueles que ainda são terra e nem sequer começaram a ser celestes, para que sobre eles se realize a vontade de Deus, que o Cristo cumpriu conservando e reintegrando o homem.
Com efeito, como os [seus] discípulos não são chamados por ele de terra, mas de sal da terra, (Mateus 5.13) e como o apóstolo chama o primeiro homem terrestre e o segundo de celeste, (I Coríntios 15.47) com razão nós também, que devemos ser semelhantes a Deus Pai – que “faz nascer o seu sol sobre os bons e os maus, que faz chover sobre os justos e os injustos” (Mateus 5.45) –, assim oramos e pedimos ao Cristo, que nos adverte que façamos [nossa] prece pela salvação de todos; a fim de que, assim como a vontade de Deus foi feita no céu, isto é, em nós, que pela nossa fé nos tornamos céu, assim também ela se faça na terra, isto é, naqueles que ainda não creem; para que eles, que ainda são terrenos pelo primeiro nascimento, comecem a ser celestes, nascidos da água e no Espírito.

9. O pão nosso de cada dia dá-nos hoje.
Seguindo adiante na oração, pedimos, dizendo: “o pão nosso de cada dia dá-nos hoje”.
[Esse pedido] pode ser entendido tanto no sentido espiritual como no literal, pois são proveitosos, com utilidade divina, para a nossa salvação.
Com efeito, o Cristo é o pão da vida, e esse pão não é de todos, mas é nosso.
Também, como dissemos “Pai nosso”, porque é Pai dos que entendem e creem, assim dizemos “pão nosso”, porque Cristo é pão para aqueles que comem o seu corpo.
Mas pedimos que este pão nos seja dado diariamente a fim de que nós, que estamos no Cristo e recebemos diariamente a Eucaristia como alimento de salvação, não venhamos a ser – por intervenção de algum pecado mais grave, enquanto tivermos sido afastados do pão celeste e formos impedidos da comunhão – separados do Corpo do Cristo.
Ele próprio o adverte, dizendo: “Eu sou o pão vivo que desci do céu. Se alguém comer do meu pão viverá eternamente. E o pão que eu darei é a minha carne para a vida do mundo” (João 6.51).
Quando, portanto, ele diz que viverá eternamente quem comer de seu pão, é evidente que viverão os que pertencem ao seu corpo e recebem a Eucaristia em direito de comunhão; assim, por outro lado, devemos temer que alguém que, tendo sido afastado [da comunhão], seja separado do corpo do Cristo e permaneça afastado da salvação.
Devemos orar para que isso não aconteça, pois é ele próprio que adverte, dizendo: “Se não comerdes a carne do Filho do homem e não beberdes o seu sangue, não tereis a vida em vós” (João 6.53).
Por isso pedimos que o pão nosso, isto é, o Cristo, nos seja dado diariamente, para que nós que estamos e vivemos em Cristo não nos afastemos do seu corpo e de sua santificação.
Mas também se pode interpretar assim, de modo que nós, que renunciamos ao século e rejeitamos as suas riquezas e suas pompas pela fé da graça espiritual, peçamos somente o alimento para o nosso sustento, conforme o Senhor instrui, dizendo: “Quem não renunciar a tudo que possui, não pode ser meu discípulo” (Lucas 14.33).
Quem, porém, começou a ser discípulo do Cristo, renunciando a tudo, segundo a palavra do seu Mestre, deve pedir o alimento quotidiano, não estender os seus desejos em pedidos de longa duração.
Assim ele preceituou, dizendo: “Não penseis no dia de amanhã. O dia de amanhã cogitará em si mesmo. Basta para cada dia as suas próprias penas” (Mateus 6.34).
Com razão, portanto, o discípulo do Cristo, proibido de preocupar-se com o dia de amanhã, pede para si o alimento de cada dia.
Pois é estranho e contraditório que nós que pedimos que o Reino de Deus venha rapidamente, busquemos viver mais longamente no século.
Assim também o bem-aventurado Apóstolo adverte, fortalecendo e consolidando a firmeza de nossa fé e nossa esperança: “Nada”, diz ele, “trouxemos para este mundo; nada, verdadeiramente, podemos levar. Se temos, portanto, o que comer e vestir, estejamos contentes. Os que querem enriquecer caem na tentação, enredados em muitos desejos nocivos que lançam o homem na perdição e na morte. Com efeito, a raiz de todos os males é a cupidez, pela qual alguns, concupiscentes, naufragaram da fé e se meteram em muitas dores” (I Timóteo 6.7-10).
Ele ensina não apenas que as riquezas devem ser desprezadas, mas também que são perigosas; nelas está a raiz dos males que afagam e enganam, com oculta decepção, a cegueira da mente humana.
Daí Deus ter respondido ao rico insensato, que pensava nos seus bens terrenos e vangloriava-se da abundância dos [seus] frutos, dizendo: “Insensato, esta noite entregarás a tua alma. Para quem, então, ficará o que preparaste”? (Lucas 12.20).
Alegrava-se com os [seus] frutos na noite em que estava por morrer e pensava na abundância de alimento o insensato, cuja vida já se afastava.
Por outro lado, porém, o Senhor ensina que se torna perfeito e completo aquele que vende tudo que possui e o dá para uso dos pobres, preparando para si um tesouro no céu (Mateus 19.21).
O Senhor lhe diz que pode segui-lo e imitar a glória de sua paixão aquele que não está envolvido em interesses particulares, mas que, prontamente e sem outro compromisso, livre e desembaraçado, acompanha com sua própria pessoa as faculdades antes postas à disposição do Senhor.
Para que cada um de nós possa preparar-se para isso, [cada um] aprende a orar dessa maneira e a descobrir, a partir dos princípios da oração, como deve ser.
Ao justo, com efeito, não pode faltar o alimento de cada dia, porque está escrito: “O Senhor não mata pela fome a alma justa” (Pv 10.3).
E novamente: “Fui jovem e envelheci; não vi justo abandonado, nem sua posteridade mendigando o pão” (Salmo 37.25).
Igualmente, ainda promete o Senhor: “Não vos preocupeis, dizendo: que comeremos ou que beberemos, ou que vestiremos? Pois isso procuram os gentios. Mas vosso Pai sabe bem de tudo que careceis. Procurai em primeiro lugar o Reino de Deus e a sua justiça e tudo o mais vos será dado por acréscimo” (Mateus 6.31-33).
Ele promete tudo por acréscimo aos que procuram o Reino de Deus e a sua justiça. Pois, como todas as coisas são de Deus, nada faltará a quem tem Deus, desde que não se afaste de Deus.
Assim [foi] com Daniel: lançado na cova dos leões por ordem do rei, recebeu milagrosamente o alimento, e o homem de Deus foi nutrido entre feras famintas que o poupavam (Dn 14.34-37 um texto apócrifo na Septuaginta).
Assim foi sustentado Elias em fuga; durante a perseguição também foi nutrido no deserto por corvos que o serviram e por aves que lhe traziam alimento (I Reis 17.4).
Igualmente – ó detestável crueldade da malícia humana! – as feras poupam, as aves proporcionam alimento, mas os homens armam ciladas e se enfurecem.

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