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Estudo sobre os Pais da Igreja: Vida e Obra
Cipriano de Cartago (210-258)
O
Bem da Paciência – 4-6
4. Cristo ensinou a paciência com palavras e
obras
Jesus Cristo, irmãos
diletíssimos, Senhor e Deus nosso, não ensinou isso somente por palavras, mas
também o cumpriu em obras.
E porque dissera ter
descido para isto, para fazer a vontade do Pai, entre outros admiráveis
prodígios, pelos quais manifestou os sinais da majestade divina, conservou
também a paciência paterna pela perseverança da tolerância.
Com efeito, todos os
seus atos, a contar da própria chegada, são assinalados pela paciência que os
acompanha. Primeiro, descendo daquela altura celeste para as coisas da terra, o
Filho de Deus não desdenha revestir-se da carne do homem e, apesar de não ser ele
pecador, assumir os pecados alheios. Posta de parte por algum tempo a
imortalidade, consente também em se tornar mortal, a fim de, inocente, ser
morto para a salvação dos culpados.
O Senhor é batizado
pelo servo; e ele, que ia dar a remissão dos pecados, não desdenha lavar o
corpo no lavacro da regeneração.
Jejua durante
quarenta dias aquele pelo qual os outros são nutridos; sente e passa fome, para
que sejam saturados com o pão celeste os que tinham fome da palavra e da graça.
Luta com o diabo, que o tenta, e, contente com ter apenas vencido o inimigo,
nada empreende além das palavras.
Não dirigiu os
discípulos como servos, com domínio de Senhor, mas, benigno e brando, os amou
com caridade fraterna.
Dignou-se também a
lavar os pés dos Apóstolos, para, com o seu exemplo, já que o Senhor assim age
em relação aos servos, ensinar de que modo um servo deve agir em relação aos
seus companheiros e semelhantes.
Não é de admirar que
se tenha ele mostrado assim entre os obedientes, quando, com longa paciência,
pôde suportar Judas até o fim, tomar a refeição com o inimigo, conhecer o
comensal hostil sem denunciá-lo claramente, e não recusar o beijo do traidor.
Quanta equanimidade
e quanta paciência em tolerar os judeus! Em levar com persuasões os incrédulos
para a fé, em acalentar os ingratos com obséquios, em responder afavelmente aos
contraditores, em suportar clementemente os soberbos, em retirar-se
humildemente diante dos perseguidores, em querer, até a hora da cruz e da paixão,
ganhar os matadores dos profetas, sempre rebeldes contra Deus.
Durante a própria
paixão e na cruz, antes que se chegasse à crueldade da morte e à efusão do
sangue, quanta infâmia afrontosa pacientemente ouvida, quantas irrisões injuriosas
toleradas! Recebeu as cusparadas dos que o insultavam aquele que, pouco antes,
reconstituíra com a sua saliva os olhos do cego.
Aguentou os açoites
aquele em cujo nome e por cujos servos é agora o diabo flagelado com os seus
anjos. Foi coroado de espinhos aquele que coroa os mártires com flores eternas.
Foi agredido no rosto pelas palmas zombeteiras aquele que dá aos vencedores as
verdadeiras palmas.
Foi despojado das
vestes terrenas aquele que reveste os outros com o indumento da imortalidade.
Foi alimentado com fel aquele que deu um alimento celeste. Àquele que ofereceu
o cálice da salvação deram vinagre para beber!
Ele, o inocente,
ele, o justo, ou melhor, a própria inocência e a própria justiça, é contado
entre os criminosos; a verdade é oprimida por falsos testemunhos; é julgado quem
há de julgar; e a Palavra de Deus é conduzida calada para a imolação.
Diante da cruz do
Senhor, enquanto os astros ficam desorientados – os elementos se perturbam: a terra
treme, a noite põe termo ao dia; o sol, a fim de não ser obrigado a contemplar
o crime dos judeus, esconde tanto os seus raios como os seus olhos –, ele não
fala, não se move, nem ao menos durante a própria paixão dá a conhecer a sua
majestade. Tudo é suportado até o fim com perseverança e sem interrupção, a fim
de que a paciência plena
e perfeita seja consumada no Cristo.
Ainda assim, depois
disso tudo, acolherá os seus matadores, se a ele voltarem arrependidos; benigno
e paciente, com uma salutar paciência para poupar [os homens], a ninguém fecha
a sua Igreja.
Mesmo àqueles
adversários, àqueles blasfemadores, àqueles perpétuos inimigos de seu nome, se
fizerem penitência do pecado, se reconhecerem o crime cometido, não somente
dará acesso ao perdão do ato criminoso, mas também ao prêmio do reino
celestial.
O que se pode
imaginar de mais paciente e de mais benigno? É vivificado pelo sangue do Cristo
mesmo aquele que derramou o sangue do Cristo. Tal e tanta é a paciência do
Cristo que, se não fosse tal e tão grande, a Igreja nem mesmo teria Paulo como
Apóstolo.
5. Imitemos o Cristo por estar nele
Ora, se estamos em
Cristo, irmãos diletíssimos, se dele nos revestimos, se ele é o caminho da
nossa salvação, nós, que seguimos o Cristo nas suas pegadas salutares, caminhemos
pelos exemplos do Cristo, conforme o Apóstolo João ensina, dizendo: “Quem diz
que permanece em Cristo, deve também caminhar como ele caminhou”.[ 1Jo 2,6.]
Pedro, sobre quem,
por escolha do Senhor, foi fundada a Igreja, igualmente dispõe e diz na sua
Epístola: “O Cristo padeceu por vós, deixando-vos o exemplo, a fim de que sigais
as suas pegadas; ele que não cometeu pecado, e em cuja boca não se encontrou engano;
ele que, quando era amaldiçoado, não respondia com maldições; quando padecia,
não ameaçava; entregava-se, porém, a quem o julgava injustamente”.[ 1Pd 2,21-23.]
6. O exemplo dos patriarcas e dos profetas
Por fim, vemos que
os patriarcas, os profetas e todos os justos – que traziam, qual imagem
antecipada, a figura do Cristo, para louvor de suas virtudes – nada melhor observaram
do que a conservação da paciência com infatigável e estável equanimidade.
Assim, Abel é o
primeiro que, inaugurando e consagrando a origem do martírio e o sofrimento do
justo, não resiste, nem luta contra o irmão fratricida; mas, humilde e brando,
é assassinado pacientemente.
Do mesmo modo
Abraão, crendo em Deus e sendo o primeiro a lançar a raiz e o fundamento da fé,
tentado a propósito do filho, não duvida nem demora, mas atende aos preceitos
de Deus com toda a paciência da devoção.
Também Isaac,
prefigurado à semelhança da vítima divina, se revela paciente quando é
oferecido pelo pai para ser imolado; e Jacó, expulso de sua terra pelo irmão, pacientemente
se retira; e, depois, com a maior paciência, suplicando, leva à concórdia, por
meio de dádivas pacíficas, o irmão que se tornara ainda mais ímpio e
perseguidor.
José, relegado e
vendido pelos irmãos, não só perdoa pacientemente, como também, com largueza e
clemência, lhes dá trigo de graça quando a ele recorrem. Moisés é frequentemente
desprezado e quase lapidado por um povo ingrato e pérfido; e, no entanto,
brando e paciente, por eles roga ao Senhor. Já em Davi, de quem procede o nascimento
do Cristo segundo a carne, quão grande, quão admirável e cristã paciência: teve
muitas vezes ao seu alcance o poder de matar o rei Saul, que o perseguia e lhe queria
tirar a vida; mas, apesar de ter Saul entregue a si e subjugado, preferiu
poupá-lo; não pagou ao inimigo na mesma moeda, mas, ainda por cima, o vingou
depois de morto!
Finalmente, tantos
profetas exterminados, tantos mártires honrados com mortes gloriosas! Todos
chegaram às coroas celestiais pela glória da paciência, pois não é possível
receber a coroa das dores e dos sofrimentos, sem a precedência da paciência na dor
e no sofrimento.
O que você destaca no texto?
Como ele serve para sua espiritualidade?
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