O Tratado está dividido em 12 livros, subdivididos em capítulos.
O livro I começa com alguns traços biográficos, falando de sua
busca de Deus e conversão. Refere-se às heresias e apresenta um plano geral do
trabalho.
No livro II encontra-se um resumo da doutrina da Trindade.
LIVRO SEGUNDO
1. O
Pai é Aquele a partir de quem tudo o que é subsiste. Ele é, em Cristo e por
Cristo, a origem de tudo. Tem em si mesmo o seu ser, não recebendo de outra
parte o que é; Ele o tem de si mesmo e em si mesmo. É infinito, porque não está
contido em nada, mas tudo está contido nele.
2. Está
sempre fora do espaço, porque não pode ser contido. É sempre anterior ao tempo,
porque o tempo procede dele.
3. Dilata
a tua imaginação, se julgas ter um fim último. Saberás que sempre está
presente. Sempre poderás procurar o lugar onde se encontra, pois seu ser não
tem fim.
4. Sobre
Ele, a palavra falha, sua natureza não poderá ser circunscrita. Revolve os
tempos, mais uma vez, sempre encontrarás que Ele é; quando faltarem os números
para calcular, ao falar dele, a Deus nunca falta o ser sempre.
5. Excita
a inteligência, e abraça com a mente o todo; nada segures.
6. O
todo tem resto, mas este resto está sempre no todo. Portanto, não há todo
quando há resto, nem o que resta é o todo. Pois resto é uma porção; todo,
porém, é o que é inteiro. Deus está todo em toda parte, onde quer que esteja.
7. Aquele
fora do qual nada existe ultrapassa os limites da inteligência, Ele, a quem
pertence o ser sempre. Esta é a verdade do mistério de Deus, este é o nome da
natureza imperscrutável, no Pai, Deus invisível, inefável, infinito.
8. A
palavra se cala ao tentar dizê-lo, o pensamento, ao querer investigá-lo, se
embota, e, ao querer abarcá-lo, a inteligência se estreita.
9. Como
dissemos, o nome de sua natureza é Pai, mas é somente Pai. Não tem outra
origem, à maneira humana, o seu ser Pai. Ele mesmo é ingênito, eterno, sempre
tendo em si o ser sempre.
10. É
conhecido somente pelo Filho, porque ao Pai ninguém conhece a não ser o Filho,
e aquele a quem o Filho quiser revelá-lo, e ao Filho ninguém conhece, senão o
Pai (cf. Mt 11,27). Sua ciência é mútua, o conhecimento recíproco é perfeito.
Visto que ao Pai ninguém conhece, senão o Filho, pensemos sobre o Pai o mesmo
que o Filho que revela, única testemunha fiel (cf. Ap 1,5).
Capítulo
7.
11. A
respeito do Pai, deveria mais sentir do que dizer, pois tenho consciência de
que toda palavra é impotente para dizer aquilo que deveria ser dito. Tem de ser
pensado como invisível, incompreensível, eterno.
12. Aliás,
que Ele seja em si mesmo, e de si mesmo e por si mesmo e que seja invisível,
incompreensível e imortal, nestes atributos está a confissão de sua honra, a
indicação do sentido e certo âmbito de conjecturas, mas a linguagem humana
sucumbe, e as palavras não o explicam tal como é.
13. Pois
se ouves que é em si mesmo, este pensamento não concorda com a razão humana.
14. Para
nós existe uma distinção entre conter e ser contido, e será uma coisa aquilo
que é contido, e outra aquilo em que se contém. Se ainda aceitas que seja por
si mesmo, ninguém é, para si mesmo, o doador e o dom.
15. Se é
imortal, então haverá algo que não vem dele, e que a ele não esteja sujeito;
nem é só o que pelo enunciado desta palavra é reivindicado por outro.
16. Se é
incompreensível, não estará em lugar nenhum, porque se nega que possa ser
alcançado.
17. Se é
invisível, está privado de tudo aquilo que pode ser visto. Falha, portanto, a
nossa palavra ao enunciá-lo, pois a nossa linguagem não é capaz de dizer como é
Deus e quão grande Ele é.
18. A
perfeita ciência consiste em conhecer a Deus de tal forma que, embora não o
ignoremos, saibamos, no entanto, que é inenarrável. Deve ser crido, escutado,
adorado e é preciso falar de seus benefícios.
Capítulo
8.
19. Arrancados
de inacessíveis lugares sem portos, estamos em agitado mar alto; não é
possível, sem perigo, retroceder nem progredir. Há, no entanto, maiores
dificuldades em ir adiante do que as já encontradas.
20. O
Pai é como é, e, como é, deve ser crido.
21. A mente
se atemoriza em querer atingir o Filho, e treme ao dizer qualquer palavra. Pois
é progenitura do Ingênito.
22. Um
que procede do que é Um, Verdadeiro do Verdadeiro, Vivo do que vive, perfeito
do que é perfeito, virtude da virtude, sabedoria da sabedoria, glória da
glória, imagem de Deus invisível, forma do Pai ingênito.
23. Que
ideia teremos a respeito da geração do Unigênito pelo Ingênito? Várias vezes,
clama dos céus o Pai: Este é o meu Filho dileto, em quem tenho meu prazer (Mt 3.17).
24. Não
há cisão nem divisão, pois é impassível o que gera e é imagem do Deus invisível
o que dele nasce, como atesta: O Pai está em mim e eu no Pai (Jo 10.38).
25. Não
se trata de adoção, pois é verdadeiro Filho de Deus e clama: Quem me vê, vê
também o Pai (Jo 14.9). Mas também não lhe é concedido o ser por meio de uma
ordem, como aos outros seres, pois o Unigênito vem do que é Um e tem a vida em
si, assim como tem a vida Aquele que o gerou, pois diz: Assim como o Pai tem a
vida em si mesmo, também deu ao Filho ter a vida em si mesmo (Jo 5.26).
26. O
que é Filho também não é parte do Pai. Atesta-o o Filho, ao dizer: Tudo o que é
do Pai, é meu (Jo 16.15); e de novo: Tudo o que é meu é teu, e tudo o que é teu
é meu (Jo 17.10).
27. Tudo
o que o Pai tem deu-o ao Filho. Também o Apóstolo o comprova quando diz: Porque
nele habita toda a plenitude da divindade corporalmente (Cl 2.9).
28. Não
é próprio da natureza que aquilo que é parte seja todo. O perfeito vem do
perfeito, porque quem tem tudo, tudo deu. Não se julgue não ter dado, porque
tem, ou não ter, porque deu.
Capítulo
9
29. O
segredo deste nascimento pertence a um e outro. Talvez alguém atribua à própria
inteligência não poder compreender o mistério desta geração, quando não entende
de modo algum quem seja o Pai nem, também, o Filho.
30. Saiba
que maior dor sinto eu em ignorar isto. Não sei, não pergunto; consolo-me, no
entanto.
31. Os
arcanjos não sabem, os anjos não ouviram, os séculos não alcançam, o Profeta
não vê, o Apóstolo não interrogou, o próprio Filho não declarou. Cesse a dor
das queixas.
32. A
ti, quem quer que sejas, que investigas estas coisas, eu não chamo para as
alturas, não atraio para a amplidão, não levo às profundezas.
33. Acaso
não poderás ignorar com serenidade o nascimento do Criador, se ignoras a origem
da criatura? Pergunto apenas se tu te reconheces como gerado e compreendes o
que de ti foi gerado.
34. Não
indago de onde te veio a capacidade de sentir, como foste agraciado com a vida,
donde recebeste a inteligência, como existe em ti o olfato, o sentido da visão,
o ouvido.
35. Sem
dúvida ninguém desconhece o que faz; pergunto donde vem aquilo que concedes aos
que geras, como lhes incutes os sentidos, iluminas seus olhos, dá-lhe o
coração. Estas coisas, descreve-as, se puderes.
36. Tens,
portanto, o que não conheces, e dás o que não compreendes, tranquilamente
ignorante do que te pertence, insolentemente néscio do que diz respeito a Deus.
Capítulo
10.
37. Ouve,
portanto, o Pai ingênito, ouve o Filho unigênito; escuta: O Pai é maior do que
eu (Jo 14,28); ouve: Eu e o Pai somos Um (Jo 10,30); ouve: Quem me vê, vê
também o Pai (Jo 14,9); ouve: Eu saí do Pai (Jo 16,28); Aquele que está no seio
do Pai: Tudo que o Pai tem, entregou-o ao Filho; O Filho tem a vida em si
mesmo, assim como o Pai tem a vida em si mesmo (Jo 5,26), escuta ser o Filho
imagem, sabedoria, virtude, glória de Deus, e entende o Espírito Santo a
proclamar: Sua geração, quem a descreverá? (Is 53,8) e tenta censurar o Senhor,
que atesta: Ninguém conhece o Filho senão o Pai, e ninguém conhece o Pai senão
o Filho e aquele a quem o Filho quiser revelar (Mt 11,27).
38. Procura
esgueirar-te no interior deste segredo e, entre o único Deus ingênito e o único
Deus unigênito, tenta mergulhar no mistério do inconcebível nascimento.
39. Começa,
avança, persiste; mesmo que eu saiba que não conseguirás chegar, pelo menos
alegrar-me-ei com o teu adiantamento, pois quem piedosamente procura, sem
descanso, o infinito, ainda que afinal não o alcance, há de tirar proveito do
seu progresso. Aí termina a compreensão das palavras.
Capítulo
11
40. O
Filho procede do Pai que tem o ser, é o Unigênito que procede do Ingênito,
descendência do Pai, Vivente que procede do Vivente.
41. Como
o Pai tem a vida em si mesmo, também foi dado ao Filho ter a vida em si mesmo.
É o Perfeito que procede do Perfeito, porque é todo do todo, sem divisão nem
separação, porque um está no outro, e a plenitude da divindade está no Filho.
42. É o
Incompreensível que procede do Incompreensível, não é conhecido por ninguém,
mas somente um conhece o outro.
43. É o
Invisível que procede do Invisível, por ser a imagem do Deus invisível, e
porque quem vê o Filho, vê também o Pai.
44. Um
procede do outro, porque são Pai e Filho, possuindo a mesma natureza da
divindade, porque são Um. Deus de Deus, Deus unigênito que procede do único
Deus ingênito; não dois deuses, mas Um, que procede do que é Um; não são dois ingênitos,
porque o que nasceu procede do inato, em nada diferindo um do outro, porque a
vida do Vivente está no que vive.
45. Estas
ideias sobre a natureza da divindade, apenas as tocamos de leve, sem atingir
por inteiro a sua compreensão, mas compreendendo ser incompreensível aquilo
sobre o que falamos.
46. Dizes
que não há lugar para a fé, se nada se pode compreender. Ao contrário, aqui se
declara o mistério da fé, porque ela sabe ser incompreensível o que procura.
O que você destaca em cada capítulo?
Como este texto auxilia sua espiritualidade?
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