terça-feira, 25 de fevereiro de 2025

O que é o Novo Monasticismo praticado pela OESI?


Mosteiro Terra Santa em Ji-paraná - RO.


O que é o Novo Monasticismo peticado pela OESI? 

        O "novo monasticismo" da Ordem Evangélica dos Servos Intercessores (OESI) é uma expressão contemporânea da vida monástica cristã, adaptada para o contexto do século XXI. Ele busca resgatar os valores e práticas do monasticismo tradicional, como a oração, a contemplação, a vida comunitária e o serviço ao próximo, mas de uma forma que seja relevante e acessível para as pessoas que vivem no mundo moderno.

Principais características do novo monasticismo da OESI:

  • Interdenominacional: A OESI é uma ordem interdenominacional, o que significa que ela acolhe pessoas de diferentes tradições cristãs. O novo monasticismo da OESI busca promover a unidade entre os cristãos, valorizando a diversidade de expressões da fé.
  • Contemplativo e ativo: O novo monasticismo da OESI busca equilibrar a vida contemplativa com a vida ativa. Os membros da ordem são chamados a cultivar a oração e a meditação, mas também a se engajar no serviço ao próximo, especialmente aos mais necessitados.
  • Comunitário e individual: A OESI valoriza tanto a vida comunitária quanto a vida individual. Os membros da ordem são chamados a viver em comunidade, compartilhando a oração, o trabalho e o lazer, mas também a cultivar a sua própria vida espiritual.
  • Adaptado ao mundo moderno: A OESI busca adaptar as práticas monásticas tradicionais ao contexto do mundo moderno. Isso significa que os membros da ordem podem viver em comunidades monásticas, mas também podem viver em suas próprias casas, mantendo um compromisso com a oração, a contemplação e o serviço.
  • Servos Intercessores: A OESI tem como um de seus focos a intercessão, ou seja, a oração em favor de outras pessoas e causas. Os membros da ordem buscam ser servos intercessores, dedicando tempo e energia à oração e ao serviço.

        O novo monasticismo da OESI é uma forma de viver a fé cristã evangélica que busca resgatar os valores e práticas do monasticismo tradicional, adaptando-os para o contexto do século XXI. Ele oferece um caminho para aqueles que buscam uma vida de maior profundidade espiritual, equilíbrio e serviço ao próximo, com um foco particular na intercessão.

sábado, 22 de fevereiro de 2025

273 - SÃO BASÍLIO MAGNO, ou de CESAREIA (330-379) - Tratado sobre o Espírito Santo (Capítulos 01 ao 05)

 



273

SÃO BASÍLIO MAGNO, ou de CESAREIA

(330-379)

Tratado sobre o Espírito Santo (Capítulos 01 ao 05)

 

I. Prefácio. Apurem-se até as mínimas parcelas da linguagem teológica

Capitulo 1.

1.     Considero muito louvável teu empenho em aprender e tua aplicação ao trabalho. Causa-me extraordinário prazer não deixar tua mente firme e sóbria de ponderar palavra alguma das utilizadas nas exposições sobre Deus, caro amigo (kefalé = cabeça), querido entre todos, meu irmão Anfilóquio. Entendeste bem a exortação do Senhor: “Todo o que pede, recebe; o que busca, acha” (Lc 11,10).

2.     Tendo em vista a justeza de teu pedido, mesmo com o mais hesitante, a meu ver, poderias iniciar uma discussão. Mais admirável, porém, é o fato de não formulares perguntas, como acontece atualmente na maioria dos casos, para armar ciladas, e sim com o propósito de investigar a verdade.

3.     Facilmente aparecem os que nos espreitam e nos interrogam continuamente, mas é dificílimo encontrar uma alma desejosa do saber e que procura a verdade, a fim de curar a própria ignorância.

4.     Ora, como um laço de caçadores e uma emboscada de guerra, são ciladas ocultas, bem planejadas, essas perguntas de muitos, cuja intenção não é tirar proveito para si, mas, ao contrário, quando as respostas não correspondem a seus desejos, conseguir pretexto de ataque aparentemente justo.

 

Capítulo 2.

5.     Se até o estulto, quando interroga, passa por sábio (Pr 17,28), o que não há de merecer o ouvinte inteligente, pelo profeta assimilado ao “conselheiro maravilhoso” (Is 9,5)?

6.     É justo dar-lhe todo apoio, estimulá-lo, partilhar seu zelo, e vir em ajuda daquele que insta a irmos até o fim.

7.     Não ouvir superficialmente os termos teológicos, mas tentar descobrir o sentido oculto de cada palavra, de cada sílaba, não é próprio dos tíbios, e sim daqueles que conhecem a finalidade de nossa vocação, pois nos é proposto assemelharmo-nos a Deus, quanto possível à natureza humana.

8.     Todavia, não há semelhança sem conhecimento (gnosis), e este conhecimento se obtém por meio de ensino.

9.     Ora, o discurso, base de todo ensino, compõe-se de partes: sílabas e termos. Por isso, não é fora de propósito examinar as sílabas. Questões aparentemente insignificantes, mas nem por isso menos merecedoras de atenção.

10. Ao contrário, visto ser difícil ir à caça da verdade, temos de investigá-la em todas as direções. Quer se trate das artes, quer da aquisição da piedade, em que lentamente se progride, nada negligenciem os que são introduzidos no conhecimento (gnosis), pois quem menosprezar os primeiros elementos, como sendo ínfimos, de modo algum atingirá a perfeição da sabedoria.

11. O “sim” e o “não” não passam de duas sílabas. Mas estas pequeninas palavras muitas vezes abrangem tanto o maior dos bens, a verdade, quanto o último limite da maldade, a mentira.

12. Mas, que digo? Basta um aceno com a cabeça, para testemunhar a Cristo, e já se considera cumprido o dever da piedade. Sendo assim, que termo teológico será pequeno demais para se tornar expressivo, ou inexato, inclinando o fiel da balança de um lado ou de outro?

13. E se da Lei não haverá de passar nem um iota, nem um só traço sem se cumprir (Mt 5,18), poderia ser seguro transgredir até mesmo os menores mandamentos?

14. Com efeito, estas partículas, das quais procuras obter de nós um exame atento, apesar de breves, são realmente grandes.

15. Breves pela concisão com que se apresentam, e em consequência disso talvez menosprezáveis; grandes pela força de seu significado, conforme a figura do grão de mostarda, a menor de todas as sementes de hortaliças, mas que devidamente cresce, com o desabrochar de suas forças, quando cercada de convenientes cuidados.

16. Se alguém se rir de nossa loquacidade — para falar como o salmo (Sl 118,85) — em torno de sílabas apenas, fique ciente de que deste riso colherá um fruto imprestável; nós, porém, não haveremos de abandonar a pesquisa, nem nos haveremos de dobrar diante da crítica dos homens, nem de desanimar em vista deste desprezo.

17. Bem longe de me envergonhar por causa da brevidade destas sílabas, se conseguisse apreender apenas uma pequenina parte de seu valor, alegrar-me-ia como merecedor de grande aplauso, e diria ao irmão que conosco investiga não ser pequeno o lucro que daí retiraríamos.

18. Como verifico ser muito grande a contestação, embora se trate de pequenas palavras, não recuso o labor, na esperança da recompensa, considerando que para mim será frutuosa labuta, e para os ouvintes, de grande utilidade.

19. Por isso, explicarei agora, auxiliado pelo mesmo Espírito, ser lícito dizer: “com” o Espírito Santo. E se te apraz que me ponha a caminho, volto um pouco atrás, ao início da questão.

Capítulo 3.

20. Há pouco, estava orando com o povo. Glorificava a Deus Pai com ambas as formas de doxologia: ora com o Filho, com o Espírito Santo; ora pelo Filho, no Espírito Santo.

21. Alguns dos presentes nos acusaram de empregar palavras estranhas e até contraditórias entre si. Tu, porém, pensando antes no bem deles, ou ao menos, se o mal for inteiramente irremediável, para premunir seus companheiros, pediste um ensinamento bem claro sobre o alcance destas sílabas.

22. Seremos concisos, na medida do possível, quais pessoas já de acordo no ponto de partida.

 

II. Base da tese dos hereges sobre as partículas

Capítulo 4.

23. Não é tão fácil, como parece, compreender as sutilezas destes hereges sobre sílabas e palavras. Não versam sobre erros insignificantes, mas revelam profundos e obscuros desígnios contra a piedade.

24. Empenham-se por demonstrar não ser semelhante o enunciado dos nomes do Pai e do Filho e do Espírito Santo, a fim de extrair daí uma fácil demonstração da diferença das naturezas. Adotam um antigo sofisma, formulado por Aécio, o chefe de sua seita, que escreveu em certa passagem de suas cartas: “Os seres dessemelhantes por natureza são denominados de maneira diferente”, e reciprocamente: “Os seres denominados de modo diferente diferem também quanto à natureza”.

25. E Aécio quer apoiar esta opinião no testemunho do Apóstolo: “Existe um só Deus, o Pai, de quem tudo procede, e um só Senhor, Jesus Cristo, por quem tudo existe” (1Cor 8,6).

26. Assim, segundo sua opinião, as naturezas significadas pelas palavras se relacionam mutuamente como as palavras entre si. Ora, a locução de quem é diferente da locução por quem.

27. Por conseguinte, o Filho não é semelhante ao Pai. Desta afecção, com efeito, provém a loquacidade destes hereges sobre as mencionadas expressões.

28. Daí vem que eles destinam a Deus Pai, como porção de escol, a expressão de quem. Determinam para Deus Filho a expressão por quem; quanto ao Espírito Santo, reservam-lhe a expressão em quem.

29. E afirmam que de forma alguma o emprego destas partículas deve ser alterada, a fim de que, como já disse, a diferença das denominações revele simultaneamente a diversidade das naturezas.

30. Mas, efetivamente, evidencia-se que esta sutil discussão de palavras serve apenas para manifestar a impiedade da doutrina.

31. Pela locução de quem querem assinalar o Artífice; com a expressão por quem indicam um auxiliar ou instrumento; pelos termos em quem determinariam tempo ou lugar.

32.   Com isso, pretendem que se conceba o Artífice do universo apenas como um instrumento e se evidencie que o Espírito Santo nada acrescenta aos seres, a não ser as circunstâncias de espaço e de tempo.

 

III. A tecnologia das partículas se origina da sabedoria profana

Capítulo 5.

33. Efetivamente, estes hereges foram induzidos em erro, devido a uma tese de pensadores “de fora”. Estes atribuem a seres de diferente natureza os termos de quem e por quem. Segundo eles, de quem indicaria a matéria; quanto à locução por quem, representaria um instrumento, ou de modo geral, qualquer auxílio.

34. Ou antes (Que nos impede, depois de ter apreendido o conjunto de seus ensinamentos, rapidamente convencer a estes homens de incoerência perante a verdade e de desacordo em relação àqueles filósofos?), os que empregaram seu tempo em estudar a vã filosofia, expõem de várias formas a natureza das causas, que classificam em várias espécies.

35. Umas são denominadas causas “principiadoras”, outras chamam-se “causas de manutenção” ou “cooperadoras”, outras ainda, “necessárias”.

36. De cada qual, porém, delimita-se a peculiaridade e a expressão. Assim, de um modo se assinala o artífice e de outro, o instrumento.

37. Ao artífice, julgam eles, convém a locução por quem. Diz-se, com razão, de um banco, que foi feito por marceneiro. Ao instrumento convêm os termos por meio de quem, pois, dizem eles, o objeto foi feito por meio do machado, da verruma etc.

38. De modo semelhante, eles atribuem os termos de quem à matéria. O objeto manufaturado é de madeira. Os termos segundo o qual referem-no ao projeto, o modelo proposto ao artífice. Ora, ou ele previamente esboçou na mente o objeto, e depois fê-lo passar da imaginação à obra concreta; ou considera o modelo que tem sob os olhos, e trabalha de acordo com a aparência deste modelo.

39. A expressão para quem, referem-na ao fim. O banco foi feito para a utilidade dos homens. Os termos em que assinala o tempo ou o espaço.

40. Quando foi feito? Naquele tempo. E onde foi feito? Naquele lugar. Embora essas circunstâncias nada acrescentem aos fatos, sem elas nada é possível. Tempo e lugar são indispensáveis para qualquer ação.

41. Tendo aprendido e admirado tais opiniões, observações vãs e ilusões fúteis, eles querem introduzi-las na doutrina simples e sem artifícios sobre o Espírito, visando a depreciar o Verbo de Deus e rejeitar o Espírito Santo.

42.   Os vocábulos que os sábios “de fora” aplicam aos instrumentos inanimados, ou os termos com que assinalam um serviço subalterno e em extremo humilhante, isto é, por quem, eles não hesitam empregá-los relativamente ao Senhor do universo, e não se envergonham esses cristãos de atribuir ao Artífice da criação uma expressão usada para a serra ou o martelo.

 

 

O que você destaca neste texto?

Como serve para a sua espiritualidade?


Hereges

Facilmente aparecem os que nos espreitam e nos interrogam continuamente, mas é dificílimo encontrar uma alma desejosa do saber e que procura a verdade, a fim de curar a própria ignorância. SÃO BASÍLIO MAGNO - (330-379) - Tratado sobre o Espírito Santo (Capítulos 01 ao 05).

 

Hereges

Daí vem que eles destinam a Deus Pai, como porção de escol, a expressão de quem. Determinam para Deus Filho a expressão por quem; quanto ao Espírito Santo, reservam-lhe a expressão em quem. E afirmam que de forma alguma o emprego destas partículas deve ser alterada, a fim de que, como já disse, a diferença das denominações revele simultaneamente a diversidade das naturezas.  SÃO BASÍLIO MAGNO - (330-379) - Tratado sobre o Espírito Santo (Capítulos 01 ao 05).

 

 

Ensino – Importância do

É justo dar-lhe todo apoio, estimulá-lo, partilhar seu zelo, e vir em ajuda daquele que insta a irmos até o fim. Não ouvir superficialmente os termos teológicos, mas tentar descobrir o sentido oculto de cada palavra, de cada sílaba, não é próprio dos tíbios, e sim daqueles que conhecem a finalidade de nossa vocação, pois nos é proposto assemelharmo-nos a Deus, quanto possível à natureza humana. Todavia, não há semelhança sem conhecimento (gnosis), e este conhecimento se obtém por meio de ensino. SÃO BASÍLIO MAGNO - (330-379) - Tratado sobre o Espírito Santo (Capítulos 01 ao 05).

 

Ensino – Importância do

Mas, que digo? Basta um aceno com a cabeça, para testemunhar a Cristo, e já se considera cumprido o dever da piedade. Sendo assim, que termo teológico será pequeno demais para se tornar expressivo, ou inexato, inclinando o fiel da balança de um lado ou de outro? SÃO BASÍLIO MAGNO - (330-379) - Tratado sobre o Espírito Santo (Capítulos 01 ao 05).

 

Ensino – não abandonar a pesquisa

Se alguém se rir de nossa loquacidade — para falar como o salmo (Sl 118,85) — em torno de sílabas apenas, fique ciente de que deste riso colherá um fruto imprestável; nós, porém, não haveremos de abandonar a pesquisa, nem nos haveremos de dobrar diante da crítica dos homens, nem de desanimar em vista deste desprezo. SÃO BASÍLIO MAGNO - (330-379) - Tratado sobre o Espírito Santo (Capítulos 01 ao 05).

 

domingo, 16 de fevereiro de 2025

272 - SÃO BASÍLIO MAGNO, ou de CESAREIA (330-379) - Introdução ao Tratado sobre o Espírito Santo

 


272

SÃO BASÍLIO MAGNO, ou de CESAREIA

(330-379)

Introdução ao Tratado sobre o Espírito Santo

 

Origem e ocasião do livro

1.      Até o Concílio de Niceia, em 325, a reflexão cristã concentra-se quase exclusivamente em torno de Cristo: quem é ele em relação ao Pai e em relação a nós? Como conseguiu nossa redenção? É Deus igual ao Pai ou uma divindade de grau inferior? Tem realmente uma natureza divina e uma natureza humana?

2.      Com a condenação do arianismo, que afirmava que Jesus era Deus, mas não da mesma natureza nem co-eterno ao Pai, pelo Concílio de Niceia, e com o exílio dos mais ferrenhos defensores do arianismo, seguiram-se duas ou três décadas de trégua.

3.      Até então, nenhuma atenção fora dada à reflexão sobre a natureza do Espírito Santo.

4.      Na aparente calmaria, pessoas influentes movimentavam as forças políticas fazendo retornar do exílio alguns chefes do arianismo, que crescia, desenvolvia-se e conquistava muitos adeptos.

5.      Reagindo contra este crescimento do arianismo, muitos bispos orientais começaram, nas celebrações litúrgicas, a acentuar algumas características antiarianas, orando ao Pai e ao Filho e ao Espírito Santo em lugar de orarem ao Pai e ao Filho no Espírito Santo.

6.      Os cristãos ficavam atentos para ouvir como seus bispos iam pronunciar as palavras finais das doxologias. Conta-se que, em certa ocasião, o bispo Leôncio, simpático aos arianos, mas procurando não ofender os católicos, recitou tão baixo a doxologia, que ninguém pôde ouvi-lo.

7.      Para evitar confusões e polêmicas que poderiam acirrar ainda mais os ânimos, Basílio se calava sobre a consubstancialidade de natureza divina do Espírito Santo. Mas, pressionado pelas circunstâncias, não pôde ocultar por muito tempo sua opinião.

8.      Quando o fez, parece ter criado embaraço para a fé de muitos cristãos. Ele mesmo relata, no início do livro: “Há pouco, estava orando com o povo. Glorificava a Deus Pai com ambas as formas da doxologia: ora com o Filho, com o Espírito Santo; ora pelo Filho, no Espírito Santo. Alguns dos presentes nos acusaram de empregar palavras estranhas e até contraditórias entre si” (1.3).

9.      As acusações vinham também de outras partes. Um monge, conforme relata Gregório de Nazianzo, escreve a este último queixando-se da doutrina ambígua de Basílio sobre a identidade do Espírito Santo: “Tu, dirigindo-se a Gregório, tens afirmado em palavras claras que o Espírito é Deus. Em certa ocasião, no meio de uma grande multidão, falando da divindade do Espírito Santo, tu interrompeste teu discurso para gritar: Até quando esconderemos a luz sob o alqueire? Mas ele, Basílio, expõe confusamente a doutrina da fé…” (Epist. 58).

10.  As perguntas começaram a surgir de todos os lados. Muitas questões eram levantadas. No meio de tantas vacilações e ambiguidades, surge o pedido muito insistente de seu caro amigo bispo de Icônio Anfilóquio: “Tu (Anfilóquio), porém, pensando antes no bem deles, ou ao menos, se o mal for inteiramente irremediável, para precaver seus companheiros, pediste um ensinamento bem claro sobre o alcance destas partículas (com, no, pelo, por quem, de quem, em quem).

11.  O livro sobre o Espírito Santo nasceu, portanto, por instigação de Anfilóquio, nos últimos meses de 374. Seu objetivo imediato, confessado, é responder às demandas de esclarecimentos do bispo de Icônio, Anfilóquio, sobre a doxologia “com o Espírito”, em razão das graves acusações levantadas por parte dos adversários arianos contra Basílio.

12.  Uma carta enviada a Anfilóquio, que deve ser datada pelos fins do ano de 375, indica que o livro já estava terminado: “O livro que escrevemos sobre o Espírito Santo está acabado, como tu o sabes. Mas os irmãos que estão comigo me impediram de o enviar escrito em papiros, dizendo ter recebido ordens de tua nobreza para escrevê-lo em pergaminho. A fim de não parecer ir contra tua ordem, nós o guardamos e o enviaremos em breve, se encontrarmos algum amigo para levá-lo” (Epist. 231).

13.  Nota-se como, neste período, a discussão teológica se deslocou do Filho para o Espírito Santo, cujo desfecho será dado pelo Concílio de Constantinopla, dois anos após a morte de Basílio, em 381.

14.  Este Concílio proclamou a divindade do Espírito Santo, digno de receber a mesma honra e a mesma glória que o Pai e o Filho: “Senhor e doador de vida, que procede do Pai (e do Filho), que com o Pai e o Filho recebe uma mesma adoração e glória, e que falou pelos profetas” (Dz. 86-150).

 

A situação da Igreja

15.  A situação psicológica de Basílio e do povo é aflitiva. O estado geral em que se encontra a Igreja e o episcopado quando escrevia o tratado sobre o Espírito Santo era deprimente: as armadilhas, as defecções, as perseguições, as divisões das dioceses, o estado de exploração e miséria em que vivia o povo, as lutas de toda espécie, tornavam o clima lúgubre. Pessoalmente, sua saúde se enfraquecia, a amargura o consumia.

16.  Confidenciou sua angústia a Atanásio nestes termos: “Toda a Igreja se dissolve, como numerosos navios em alto-mar vagando a esmo, batem-se uns contra os outros sob a violência das ondas. É um grande naufrágio cujo responsável é o mar em fúria e também a desordem dos navios, indo uns contra os outros, despedaçando-se mutuamente. Onde encontrar um piloto à altura da situação, que seja assaz digno de fé para despertar o Senhor, a fim de que ele ordene aos ventos e ao mar? (Epist. 82).

17.  Para completar sua amargura, seu velho amigo, o grande asceta e bispo de Sebástia, Eustácio, torna-se o inspirador dos pneumatômacos, um movimento evangélico radical que negava a divindade do Espírito Santo.

18.  Na Epístola 123,5, Basílio se queixa por ele ter tomado esta atitude: “Quantas vezes não nos visitastes no mosteiro às margens do Íris, quando eu estava com o irmão muito amado de Deus, Gregório, que procurava realizar o mesmo ideal de vida que eu? Quantos dias passamos na vila do outro lado do rio, com minha mãe, ou como amigos nos entretendo mutuamente, discorrendo de dia e de noite?”.

19.  Para evitar ser perseguido, Eustácio tomou posição contra as decisões de Niceia, a favor dos arianos. Desse modo, o exílio dos bispos fiéis a Niceia, a perseguição dissimulada ou a mão armada, as acusações, a miséria generalizada, formam, agora, a trama de sua vida na qual foi escrito o livro sobre o Espírito Santo.

20.  É compreensível que tenha as marcas do combate, de uma dialética que procura aproveitar-se da fraqueza da posição adversária, para arruiná-la.

21.  De um lado, os pneumatômacos negavam que se pudesse glorificar o Espírito Santo com o Pai e com o Filho. O Espírito, diziam, não vem senão em terceiro lugar na invocação batismal. Ele é, portanto, inferior ao Pai e ao Filho e não se pode atribuir-lhe a honra que lhe é dada em algumas igrejas. Ora, os seres da mesma honra são conumerados enquanto se subnumeram aqueles cuja dignidade é menor. Deve-se, portanto, subnumerar o Espírito ao Filho e ao Pai, e glorificá-lo após o Pai e o Filho, e não com ou junto do Pai e do Filho.

22.  Por outro lado, Macedônio, bispo de Constantinopla, para defender a unidade de Deus, afirmava que o Espírito Santo está subordinado ao Pai e ao Filho, negando, consequentemente, a divindade do Espírito Santo.

23.  Segundo o historiador eclesiástico Sozomeno, para Macedônio, o Espírito Santo não tinha a mesma dignidade divina do Filho, sendo apenas um ministro, um intérprete, uma espécie de anjo a serviço de Deus (HE IV, 27).

 

O primeiro tratado sobre o Espírito Santo

24.  A primeira menção de um debate sobre o Espírito Santo encontra-se na terceira carta de Atanásio ao bispo Serapião de Thmuis, por volta do ano 360. Até então, as ideias a respeito do Espírito Santo caracterizavam-se por incertezas.

25.  O próprio Concílio de Niceia afirmava a plena divindade e consubstancialidade do Filho, mas proclamava somente a fé “no Espírito Santo”. Nenhuma palavra a respeito da natureza, da substância do Espírito Santo.

26.  É neste escrito a Serapião que Atanásio desenvolve os argumentos negando que o Espírito seja tão somente uma criatura do Logos, como diziam os macedonianos.

27.  Atanásio dizia que era preciso reconhecer também para o Espírito Santo a consubstancialidade com o Pai e com o Filho. O ponto de vista de Atanásio era o mais explícito, até esse momento, sobre o reconhecimento da divindade do Espírito Santo.

28.  De fato, existiam dificuldades para a afirmação da consubstancialidade do Espírito com o Pai e com o Filho. Pareciam faltar testemunhos escriturísticos precisos nesse sentido e queria-se evitar que isso implicasse a noção de dupla divindade gerada (o Filho e o Espírito) ou de duplicidade de Pais (o Filho e o Pai). Além disso, os textos conciliares não definiam os termos empregados nas fórmulas do credo.

29.  As palavras-chave substância, natureza, pessoa, permaneciam suscetíveis de várias interpretações. Eusébio de Cesareia, antigo conselheiro eclesiástico de Lucinius, por exemplo, entendia o termo substância (omooúsios) no sentido genérico: aquilo que há de comum entre dois indivíduos. Já os partidários de Ósio, conselheiro teológico de Constantino, compreendiam o termo “da mesma substância” (omooúsios) como da mesma realidade individual.

30.  No Concílio de Niceia, por falta de unanimidade, o termo “consubstancial” (omooúsios) foi mantido e imposto pelo próprio imperador Constantino.

 

A definição de Basílio

31.  Numa carta dirigida a seu irmão Gregório, bispo de Nissa, Basílio definira assim a substância (ousía = substancia ou essência) e a hypóstasis (união da natureza humana e divina em Cristo. Literalmente em grego significa substância): a ousía é o que é comum aos indivíduos da mesma espécie, o que todos possuem igualmente e que faz com que lhes seja designado a todos com o mesmo vocábulo, sem distinguir a nenhum de modo particular. Porém, esta ousía não pode existir realmente senão na condição de ser completada pelos caracteres individualizantes que a determinam (Epist. 38, 1-3).

32.  Na carta a Anfilóquio, Basílio desenvolve mais explicitamente o que ele entende pelos termos ousía e hypóstasis. O texto, um pouco longo, torna-se necessário nesta introdução: “Entre ousía e hypóstasis, há a mesma diferença que existe naquilo que é comum em relação ao que é individual, por exemplo, o animal em relação a tal homem. Por esta razão, a propósito da deidade, confessa-se, de uma parte, uma ousía única: assim não se presta conta diferentemente da essência; e, de outra parte, uma hypóstasis particularizada: com a finalidade de tornar sem mistura para nós e inteiramente límpida a noção de Pai e de Filho e de Espírito Santo. Porque, se não se consideram as características distintivas de cada um deles, tais como a paternidade e filiação e santificação, mas, a partir da noção comum da essência, se confessava Deus, se tornaria incapaz de dar conta corretamente da fé.

33.  É preciso, pois, juntando o caráter próprio de cada um ao que é comum, confessar-se assim a fé: comum a deidade, própria a paternidade. Então, reunindo-os, que se diga: eu creio em Deus Pai. De novo, na confissão do Filho, que se faça o mesmo, ao comum juntando o próprio, e que se diga: em Deus Filho. E semelhantemente para o Espírito Santo, dando ao enunciado uma forma que respeita a ordem da expressão, que se diga: eu creio também no divino Espírito Santo. Assim, se salvará totalmente a unidade na confissão da única deidade e se confessará o caráter próprio das prósopa (pessoa) na distinção das propriedades reconhecidas para cada um.

34.  Quanto àqueles que dizem que ousía (substância ou essência) e hypóstasis são a mesma coisa, se encontram na obrigação de confessar somente as prósopa (pessoa), e na sua recusa de dizer: três hypóstaseis, passam por não evitar o erro de Sabélio” (Epist. 236).

35.  As discussões suscitadas pelos arianos e anomeus levaram Basílio a aprofundar a compreensão das três hypóstasis. Esse é o termo importante para ele. A hypóstasis une a ousía e o prósopon. Para ele, o prósopon seria o aspecto externo sob o qual aparece a hypóstasis característica de um ser, o “rosto” que ele tem.

36.  Dá-se-lhe um falso sentido quando, já naquela época, faziam os latinos traduzindo-o por “persona”. No livro sobre o Espírito Santo, Basílio afirma que o Pai, o Filho e o Espírito Santo são três hypóstasis, cuja estrutura formal é a ousía e cujo rosto, cujo aspecto distintivo, é o prósopon (rosto ou feição).

37.  Assim Basílio distingue entre “essência” (ousía) e existência individual (hypóstasis) e conclui que as três hypóstasis são iguais na essência e distintas como individualidade.

38.  Assim, em Deus, o comum é a ousía (essência), e particular, individualizante, é a hypóstasis (existência individual).

39.  Mas não pense o leitor ter em mãos um livro árido e entregar-se à leitura de uma disputa em torno de vocábulos, de preposições. O próprio autor tem consciência do possível engano do leitor, quando, no capítulo 2, põe-se a esclarecer sua tarefa e a justificá-la: “Bem longe de me envergonhar por causa da brevidade destas partículas, se conseguisse apreender apenas uma pequenina parte de seu valor, alegrar-me-ia como merecedor de grande aplauso, e diria ao irmão que conosco investiga não ser pequeno o lucro que daí retiraríamos”.

40.  Na verdade, não é sobre partículas, nem sobre tal ou tal vocábulo que Basílio se entrega a escrever seu tratado. Se ele se dedica à análise dos termos com, em quem, para quem, por quem, é porque por trás deles se esconde uma teologia, uma realidade cujo sentido e verdade são inteiramente de outra ordem.

41.  Inspirado nas cartas de Santo Atanásio e Serapião de Thmuis, o tratado de Basílio sobre o Espírito Santo constitui a fonte por excelência da teologia trinitária. Sua obra tornou-se documento memorável, de primeiro valor, ao qual se deve voltar toda a vez que se quiser remontar às fontes da teologia do Espírito.

42.  Exerceu considerável influência para que os Padres conciliares chegassem à definição do símbolo de Constantinopla e decisivo, sem dúvida, para o desenvolvimento doutrinal posterior. Inspirou, por sua vez, muitos escritos na época patrística e nos séculos posteriores, sobre a caracterização do Espírito Santo no seio da Trindade.

43.  Com a proclamação da divindade do Espírito Santo e de sua igualdade consubstancial com o Pai e com o Filho, dos quais procede, completou-se o terreno da ortodoxia nicena, católica.

 

O que você destaca no texto?

Como serve para sua espiritualidade?