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Estudo sobre os Pais da Igreja: Vida e Obra
Justino Mártir (†165)
I Apologia:
Capítulos 13 ao 20
Profissão de fé cristã
13.
1 Que não somos ateus, quem estiverem são juízo não o dirá, pois cultuamos o
Criador deste universo, do qual dizemos, conforme nos ensinaram, que não tem
necessidade de sangue, libações ou incenso. Em lugar de todas as ofertas, nós o
louvamos conforme nossas forças, com palavras de oração e ação de graças.
Aprendemos que o único louvor digno dele não é queimar no fogo o que por ele
foi criado para nosso alimento, mas oferecê-lo para nós mesmos e para os
necessitados. 2 Depois, mostrando-nos a ele agradecidos, dirigir-lhe por nossa
palavra louvores e hinos por ter-nos criado, por todos os meios de saúde, pela
variedade das espécies e mudanças das estações, ao mesmo tempo que lhe
suplicamos que nos conceda de novo a incorruptibilidade pela fé que nele temos.
3 Em seguida, demonstramos que, com razão, honramos também Jesus Cristo, que
foi nosso Mestre nessas coisas e para isso nasceu, o mesmo que foi crucificado
sob Pôncio Pilatos, procurador na Judéia no tempo de Tibério César. Aprendemos
que ele é o Filho do próprio Deus verdadeiro, e o colocamos em segundo lugar,
assim como o Espírito profético, que pomos no terceiro. De fato, tacham-nos de
loucos, dizendo que damos o segundo lugar a um homem crucificado, depois do
Deus imutável, aquele que existe desde sempre e criou o universo. É que ignoram
o mistério que existe nisso e, por isso, vos exortamos que presteis atenção
quando o expomos.
Homens novos pela fé em Cristo
14.
1 De antemão vos avisamos que tenhais cuidado, para não serdes enganados por
esses mesmos demônios que acabamos de acusar e assim eles vos impeçam
totalmente de ler e entender o que dizemos, pois eles lutam para tê-los como
seus escravos e servidores. Por aparições em sonhos ou por artes de magia, eles
se apoderam de todos aqueles que, de um ou outro modo, não trabalham por sua
própria salvação. Depois de crer no Verbo, nós nos afastamos deles e, por meio
do Filho, seguimos o único Deus unigênito. 2 Antes, nós nos comprazíamos na
dissolução; agora, abraçamos apenas a temperança; antes, nos entregávamos às
artes mágicas; agora, nos consagramos ao Deus bom e ingênito; antes, amávamos,
acima de tudo, o dinheiro e as rendas de nossos bens; agora, colocamos em comum
o que possuímos e disso damos uma parte para todo aquele que está necessitado;
3 antes, nós nos odiávamos e nos matávamos mutuamente e não compartilhávamos o
lar com aqueles que não pertenciam à nossa raça pela diferença de costumes;
agora, depois da aparição de Cristo, vivemos todos juntos, rezamos por nossos
inimigos e tratamos de persuadir os que nos aborrecem injustamente, a fim de
que, vivendo conforme os belos conselhos de Cristo, tenham boas esperanças de
alcançar conosco os mesmos bens que esperamos de Deus, soberano de todas as
coisas. 4 Todavia, para que não pareça que pretendemos vos enganar, acreditamos
ser oportuno, antes da demonstração, recordar alguns ensinamentos do mesmo
Cristo, deixado para vós, como poderosos imperadores, a tarefa de examinar se,
de fato, é isso que nos ensinaram e que nós ensinamos. 5 Seus discursos, porém,
são breves e sintéticos, pois ele não era nenhum sofista, mas sua palavra era
uma força de Deus.
A doutrina de Cristo
15. 1 Sobre a temperança, ele disse o
seguinte: "Aquele que olhar para uma mulher para desejá-la, diante de Deus
já cometeu adultério em seu coração"a . 2 E: "Se o teu olho direito
te escandaliza, arranca-o, pois é melhor entrar no reino dos céus com um só
olho do que ser mandado para o fogo eterno com os dois"b . 3 E:
"Aquele que se casa com a divorciada de outro marido comete
adultério"c . 4 E: "Há alguns que foram mutilados pelos homens, há
também aqueles que já nasceram mutilados; mas há aqueles que se mutilaram a si
mesmos por causa do reino dos céus. Mas nem todos compreendem isso"d . 5
De modo que, para o nosso Mestre, não só são pecadores os que contraem duplo
matrimônio, conforme a lei humana, mas também os que olham para uma mulher para
desejá-la. Com efeito, para ele não só se rejeita aquele que de fato comete
adultério, mas também aquele que quer cometê-lo, pois diante de Deus, tanto as
obras como os desejos estão manifestos. 6 Entre nós há muitos homens e mulheres
que, tornando-se discípulos de Cristo desde criança, permanecem incorruptos até
os sessenta e setenta anos. E eu me glorio de mostrá-los entre toda a raça dos
homens. 7 Isso sem contar a multidão inumerável dos que se converteram de uma
vida dissoluta e aprenderam esta doutrina, pois Cristo não veio chamar os
justos e os temperantes para a penitência, mas os ímpios, intemperantes e injustos.
8 De fato, ele disse: "Não vim chamar os justos, mas os pecadores para a
penitência”e . O Pai celestial prefere a penitência do pecador ao seu castigo.
9 Sobre amar a todos, ensinou o seguinte: "Se amais os que vos amam, que
novidade fazeis? Os fornicadores também não fazem isso? Eu, porém, vos digo:
Orai por vossos inimigos, amai os que vos odeiam e orai pelos que vos
caluniam" Mt 5,28 b Mt 5,29; 18,9 c Mt 5,32 d Mt 19,11-12 e Lc 5,32 Mt
5,44-46. 10. Sobre repartir o que temos com os necessitados e não fazer nada
por ostentação, ele disse: "Dai a todo aquele que vos pedir, e não vos
afasteis daquele que quer pedir-vos um empréstimo. De fato, se emprestais
apenas àqueles de quem esperais receber, que novidade fazeis? Até os publicanos
fazem isso . 11Vós, porém, não entesoureis para vós sobre a terra, onde a traça
e a ferrugem destroem e os ladrões escavam, mas entesourai para vós nos céus,
onde nem a traça, nem a ferrugem destroem.12.
Com efeito, o que adianta ao homem ganhar o mundo inteiro, se perder a
sua alma? O que dará em troco dela? Entesourai, portanto, nos céus, onde nem a
traça, nem a ferrugem destroem".13E: "Sede bons e misericordiosos,
assim como vosso Pai é bom e misericordioso e faz sair o seu sol sobre
pecadores, justos e maus.l 14Não vos preocupeis sobre o que comer ou vestir.
Não valeis mais do que os pássaros e as feras? E Deus as alimenta. 15Não vos
preocupeis, portanto, sobre o que comereis ou que vestireis, pois vosso Pai
celeste sabe que tendes necessidade dessas coisas. 16Buscai antes o reino dos
céus, e tudo isso vos será dado em acréscimo. Com efeito, onde está o tesouro,
aí também está o pensamento do homem"n . 17 E: "Não façais essas
coisas para serdes vistas pelos homens, pois nesse caso não tereis recompensa
de vosso Pai que está nos céuso ”.
16.
Sobre sermos pacientes, prontos para servir a todos e alheios à ira, ele disse
o seguinte: "Àquele que te golpeia numa face, oferece-lhe a outra, e a
quem quer tirar-te a túnica ou o manto, não o impeçasp . 2 Quem se irritar,
será réu do fogoq . A quem te contratar para uma milha, acompanha-o duasr . Que
as vossas obras brilhem diante dos homens, a fim de que, vendo-as, admirem
vosso Pai que está nos Céuss ". 3 Portanto, não devemos oferecer resistência,
pois ele não quer que sejamos imitadores dos malvados, mas mandou-nos afastar a
todos da vergonha e do desejo do mal pela paciência e mansidão. 4 E isso vos
podemos demonstrar através de muitos que viveram entre vós, que deixaram seus
hábitos violentos e tirania, vencidos ora contemplando a constância de vida de
seus vizinhos, ora considerando a estranha paciência dos companheiros de viagem
ao ser defraudados, ora pondo à prova companheiros de negócio. 5 Sobre não
jurar nunca mas dizer sempre a verdade, ele nos ordenou o seguinte: "Nunca
jureis; todavia o vosso não seja não, e o vosso sim seja sim, pois tudo que
passa disso provém do maligno"t . 6 Sobre adorar unicamente a Deus, ele
nos persuadiu, dizendo: "O maior mandamento é este: Adorarás ao Senhor teu
Deus e só a ele servirás de todo o teu coração e com toda a tua força, ao
Senhor Deus que te criou"u . 7 Certa vez que alguém se aproximou dele e
lhe disse: "Bom Mestre", ele respondeu: "Ninguém é bom a não ser
Deus, que fez todas as coisas"v . 8 Aqueles, porém, que se vê que não
vivem como ele ensinou, sejam declarados como não cristãos, por mais que
repitam com a língua os ensinamentos de Cristo, pois ele disse que se
salvariam, não os que apenas falassem, mas que também praticassem as obras. 9
De fato, ele disse: Mt 5,42 Lc 6,34 Mt 6,19-20 Mt 16,26 Mt 6,20 Mt 5,45 Mt 6,25
Mt 6,21 Mt 6,21 Lc 6,29 Mt 5,22 Mt 5,41
Mt 11,16 Mt 5,34.37 Mt 22,37-38
Mc 10,17; Lc 13,26 "Não todo aquele
que me diz: "Senhor, Senhor, entrará no reino dos céus, mas aquele que faz
a vontade de meu Pai que está nos céus . 10Porque aquele que me ouve e faz o
que eu digo, ouve aquele que me enviou . 11Muitos me dirão: ‘Senhor, Senhor,
não foi em teu nome que comemos, bebemos e fizemos prodígios?’ Então eu lhes
responderei: -‘Apartai-vos de mim, operadores de iniquidade . 12Então haverá
choro e ranger de dentes, quando os justos brilharem como o sol e os injustos
forem mandados para o fogo eterno. 13Porque muitos virão em meu nome, vestidos
por fora com peles de ovelha, mas por dentro são lobos roubadores. Por suas
obras os conhecereis. Toda árvore que não dá bom fruto é cortada e lançada ao
fogo"aa. 14Aqueles que não vivem conforme os ensinamentos de Cristo e são
cristãos apenas de nome, nós somos os primeiros a vos pedir que sejam castigados.
Súditos do império
17.
1 Quanto a tributos e contribuições, procuramos pagá-los antes de todos àqueles
que estabelecestes para isso em todos os lugares, assim como fomos ensinados
por Cristo. 2 Porque naquele tempo, alguns se aproximaram dele, para perguntar-lhe
se se deveria pagar tributo a César. Ele respondeu: "Dizei-me: que imagem
tem a moeda?" Eles responderam: "A de César." Então ele tornou a
responder-lhes: "Então dai a César o que é de César, e a Deus o que é de
Deus". 3 Portanto, nós somente a Deus adoramos, mas em tudo o mais nós
servimos a vós com gosto, confessando que sois imperadores e governantes dos
homens e rogando que, junto com o poder imperial, também se encontre que
tenhais prudente raciocínio. 4 Todavia, se não atendeis às nossas súplicas, nem
esta exposição pública que vos fazemos de todo o nosso modo de viver, em nada
ficaremos prejudicados, pois cremos, ou melhor, estamos persuadidos de que cada
um pagará a pena, conforme mereçam as suas obras, pelo fogo eterno, e que terá
que prestar contas a Deus, segundo as faculdades que recebeu do próprio Deus,
conforme nos indicou Cristo, dizendo: "A quem Deus deu mais, mais será
exigido por Deus”cc.
A imortalidade da alma
18. 1 Vede o fim que tiveram os imperadores
que vos precederam: todos morreram de morte comum. Se a morte terminasse na
inconsciência, seria uma boa sorte para todos os malvados. 2 Admitindo, porém,
que a consciência permanece em todos os nascidos, não sejais negligentes em
convencer-vos e crer que essas coisas são verdade. 3 De fato, a necromancia, o
exame das entranhas de crianças inocentes, as evocações das almas humanas e os
que são chamados entre os magos de espíritos dos sonhos e espíritos
assistentes, os fenômenos que acontecem sob a ação dos que sabem essas coisas
devem persuadir-vos de que, mesmo depois da morte, as almas conservam a
consciência. 4 Do mesmo modo, poderíamos citar os que são arrebatados e
agitados pelas almas dos mortos, aos quais todos chamam de possessos ou loucos;
aqueles que entre vós são chamados de oráculos de Anfiloco, de Dodona, de Piton
e outros semelhantes; 5 as doutrinas de escritores como Empédocles e Pitágoras,
Platão e Sócrates, aquela caverna de Homero, a descida de Ulisses para
averiguar essas coisas, e outros que disseram coisas parecidas. 6 Recebei-nos,
portanto, pelo menos de modo semelhante a esses, pois não cremos menos do que
eles em Deus e sim mais do que eles: esperamos recuperar nossos próprios corpos
depois de mortos e enterrados, porque dizemos que para Deus não há nada impossível.
w Mt 7,21 x Lc 10,16 y Mt 7,22-23; Lc 13,26 z Mt 13,42-43 aa Mt 7,15 bb Mt
22,17 cc Lc 12,4.8
A ressurreição não é impossível
19.
1 Para quem reflete, o que pareceria mais incrível do que se, estando fora do
nosso corpo, alguém dissesse que de uma pequena gota do sêmen humano seria
possível nascer ossos, tendões e carnes com a forma em que os vemos, e víssemos
isso em imagem? 2 Façamos uma suposição. Se não fôsseis o que sois e de quem
sois e alguém vos mostrasse o sêmen humano e uma imagem pintada de um homem,
afirmando que esta se forma daquele, por acaso acreditaríeis antes de vê-lo
nascido? Ninguém se atreveria a contradizer isso. 3 Do mesmo modo, por nunca
ter visto um morto ressuscitar, a incredulidade agora vos domina. 4 Da mesma
forma, como no princípio não teríeis crido que de uma pequena gota nasceriam
tais seres e, no entanto, os vedes nascidos, assim também considerai que não é
impossível que os corpos humanos, depois de dissolvidos e espalhados como
sementes na terra, ressuscitem a seu tempo, por ordem de Deus e se revistam da
incorruptibilidade. 5 Na verdade, não saberíamos dizer de qual potência digna
de Deus falam aqueles que afirmam que tudo voltará ao lugar de onde procede e
que, fora disso, ninguém pode nada, nem mesmo Deus. Nós, porém, vemos bem isto:
esses mesmos não teriam acreditado ser possível ter nascido tais e quais eles e
o mundo todo se veem ter nascido. 6 Além disso, aprendemos que é melhor crer
naquilo que está acima da nossa própria natureza e que é impossível aos homens,
do que ser incrédulos como o vulgo. Sabemos que Jesus Cristo, nosso Mestre,
disse: "O que é impossível para os homens, é possível para Deus". 7 E
disse mais: "Não temais aqueles que vos matam e depois disso nada mais
podem fazer; temei antes aquele que, depois da morte, pode lançar alma e corpo
no inferno" . 8 Deve-se saber que o inferno é o lugar onde serão
castigados os que tiverem vivido iniquamente e não acreditaram que acontecerão
essas coisas ensinadas por Deus, através de Cristo.
Afinidades pagãs
20.
1 Também a Sibila e Histapes disseram que todo o corruptível deveria ser
consumido pelo fogo; 2 os filósofos estóicos têm por dogma que o próprio Deus
se dissolverá em fogo e afirmam que novamente, por transformação, o mundo
renascerá. Nós, porém, consideramos Deus, o criador de todas as coisas,
superior a todas as transformações. 3 Por fim, se há coisas que dizemos de
maneira semelhante aos poetas e filósofos que estimais, e outras de modo
superior e divinamente, e somos os únicos que apresentamos demonstração, por
que se nos odeiam injustamente mais do que a todos os outros? 4 Assim, quando
dizemos que tudo foi ordenado e feito por Deus, parecerá apenas que enunciamos
um dogma de Platão; ao falar sobre conflagração, outro dogma dos estóicos; ao
dizer que são castigadas as almas dos iníquos que, ainda depois da morte,
conservarão a consciência, e que as dos bons, livres de todo castigo, serão
felizes, parecerá que falamos como vossos poetas e filósofos; 5 que não se
devem adorar obras de mãos humanas, não é senão repetir o que disseram
Menandro, o poeta cômico, e outros com ele, que afirmaram que o artífice é
maior do que aquele que o fabrica.
O que
você deseja destacar neste texto?
O que
serve para a sua espiritualidade?
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