segunda-feira, 10 de junho de 2019

99 - Orígenes de Alexandria (185-253) As Homilias sobre São Lucas (Homilia 9,10)


Resultado de imagem para Icone zacarias pai de João Batista

99
Estudo sobre os Pais da Igreja: Vida e Obra
Orígenes de Alexandria (185-253)
As Homilias sobre São Lucas (Homilia 9,10)


HOMILIA 9
Lc 1,56-64- Sobre o que está escrito: “Permaneceu junto a ela por três meses”, até aquela passagem que diz: “E falava, bendizendo a Deus”.

Transformação operada nas almas pela presença de Jesus
A razão, tanto dos ditos quanto dos fatos reportados [nas Escrituras], deve ser digna do Espírito Santo e da fé no Cristo, para a qual fomos chamados como crentes.
Assim, devemos, agora, investigar a razão pela qual Maria, depois de haver concebido, veio para junto de Isabel e “permaneceu junto a ela por três meses”; ou qual foi a causa para que Lucas, que escrevia a história do Evangelho, inserisse nesse este versículo: “permaneceu por três meses, e depois regressou à sua casa”.
Seguramente deve haver  alguma razão, a qual, se o Senhor abrir nosso coração, a homilia que se segue mostrará.
Se, de fato, bastou que Maria viesse até Isabel e a saudasse, para que a criança exultasse de júbilo, e Isabel, cheia do Espírito Santo, profetizasse o que está escrito no Evangelho, e se, em uma hora apenas, tantas transformações ocorressem, resta, para a nossa reflexão, [verificar] quais progressos fez João em três meses, estando Maria junto de Isabel.
É verdadeiramente inconcebível que por três meses nem João nem Isabel tenham feito progressos com a proximidade da mãe do Senhor e com a presença do próprio Salvador, quando, em um segundo, instantaneamente, a criança exultou e, por assim dizer, pulou de alegria, e Isabel foi repleta do Espírito Santo.
Durante esses três meses, João era, pois, treinado e recebia, por assim dizer, a unção na arena dos atletas, e era preparado no ventre da mãe, para que, maravilhosamente nascido, fosse educado mais maravilhosamente ainda.
Porque foi educado de um modo inabitual, a Escritura não relata como ele foi amamentado pelos seios de sua mãe, [nem] como ele foi sustentado nos braços de uma criada, mas imediatamente [diz o que] se segue: “Ele viveu no deserto, até o tempo de sua apresentação a Israel”.

O nascimento de um justo
Depois, lemos: “Para Isabel, porém, o tempo de dar à luz completou-se, e ela deu à luz um filho”. Muitos consideram supérfluo dizer: “Para Isabel, porém, o tempo de dar à luz completou-se, e ela deu à luz um filho”.
Qual mulher, com efeito, pode dar à luz, se não tiver completado o tempo do parto? Mas aquele que medita com muito cuidado a Escritura e ouve [São] Paulo, que diz: “Presta atenção na leitura”, pode procurar, tanto no Antigo quanto no Novo Testamento, se em alguma parte encontra escrito sobre o nascimento de um pecador; nunca absolutamente encontrará que “completou-se o tempo para que desse à luz”.
Mas onde quer que nasça um justo, aí os dias se completam, lá sua vinda para o mundo se completa.
O nascimento de um justo tem sua plenitude, mas o nascimento do pecador é, por assim dizer, vazio e nulo. Isso é o que se refere ao que está escrito: “completou-se o tempo, para que desse à luz”.

Zacarias recobra a voz
Em seguida, depois do nascimento de João, “vizinhos e parentes alegravam-se” com a mãe dele e, em honra do pai, queriam dar o nome dele ao menino e chamá-lo de Zacarias.
Ora, Isabel, sob inspiração do Espírito Santo, dizia: “João é seu nome”. Em seguida, quando eles buscavam os justos motivos pelos quais seria melhor que ele fosse chamado de João, quando ninguém em sua família tinha esse nome, interrogaram ao pai, que, sendo incapaz de responder, o fez com um gesto com a mão e por escrito.
“Ele escreveu”, com efeito, numa tabuinha: “João é seu nome”. Assim que o estilete imprimiu a palavra sobre a cera, “sua língua”, que antes fora acorrentada, “soltou-se” e recebeu uma elocução que não era humana.
Enquanto sua língua esteve presa, era humana; a incredulidade, com efeito, a havia prendido. Assim que se soltou, cessou de ser humana, e “falava bendizendo a Deus” e profetizou o que está escrito no Evangelho, sobre o qual, quando for o tempo, discorreremos, oferecendo-nos a ocasião o Senhor Jesus Cristo: “a quem pertencem a glória e o poder nos séculos dos séculos. Amém”.

HOMILIA 10
Lc 1,67-76 - Sobre o que está escrito: “Cheio do Espírito Santo, ele profetizou”, até aquela passagem que diz: “Pois tu irás adiante do Senhor, para preparar seus caminhos”.

O Benedictus
Cheio do Espírito Santo, Zacarias anuncia duas profecias de modo geral, a primeira sobre o Cristo, a outra sobre João. Isso claramente se confirma por suas palavras, nas quais fala de um Salvador como já presente e que viveria no mundo e, em seguida, de João.
 “Cheio do Espírito Santo, ele profetizou dizendo: ‘Bendito seja o Senhor, Deus de Israel, porque visitou e concedeu redenção a seu povo’”.
Estando Deus visitando e querendo redimir seu povo, Maria permaneceu com Isabel por três meses, depois que lhe falou o anjo, para que, por um poder especialmente inefável, o Salvador presente preparasse não somente João, como dissemos da última vez, mas também Zacarias, como o Evangelho de hoje nos mostra.
Paulatinamente, de fato, também ele progredia durante esses três meses sob a influência do Espírito Santo e, sem o sentir, recebia a instrução de Deus e fez essa profecia acerca do Cristo, dizendo: “Que concedeu a redenção a seu povo, e suscitou o cume de salvação para nós na casa de Davi”, porque “da raça de Davi segundo a carne” nasceu o Cristo. Em verdade foi “o cume da salvação na casa de Davi”, porque esta profecia já se encontra cantada: “A vinha foi plantada em um cume”.
Em qual cume? Em Cristo Jesus, sobre o qual agora está escrito: “Ele suscitou o cume da salvação para nós na casa de Davi, seu servidor, como foi falado pela boca dos seus santos profetas”.

A libertação
“Para a libertação de nossos inimigos”. Não pensemos que se trata agora de inimigos  no sentido físico, mas dos inimigos espirituais. Veio, com efeito, o Senhor Jesus, “forte no combate”, destruir todos os nossos inimigos, para nos libertar de suas armadilhas; [para nos libertar] da mão de todos os nossos inimigos, “da mão de todos os que nos odeiam”.
“Usar de misericórdia com nossos pais”. Eu considero que, com o advento do Senhor Salvador, Abraão, Isaque e Jacó tenham usufruído da misericórdia de Deus.
É inacreditável que esses homens, que previamente viram o seu dia e se alegraram, posteriormente, na sua vinda e com o [seu] nascimento de uma virgem, não tenham recebido nada de útil.
E o que direi dos patriarcas? Seguindo a autoridade das Escrituras, audaciosamente subirei ao ponto ainda mais alto, porque a presença do Senhor Jesus e a sua Encarnação tiveram proveito não só para as coisas terrenas, mas também para as celestes.
Por isso diz o Apóstolo [Paulo]: “Estabelecendo a paz, pelo sangue de sua cruz, sobre a terra e nos céus”.
Se a presença do Senhor, porém, foi útil, seja na terra, seja nos céus, por que temes em dizer que seu advento também foi útil aos Patriarcas, a fim de que fosse cumprida esta palavra: “Para usar de misericórdia com nossos pais, e recordar-se de sua santa aliança, do juramento feito a Abraão nosso pai”, de nos conceder sermos libertados “sem medo da mão de nossos inimigos”?
Frequentemente homens são liberados da mão de [seus] inimigos, mas não “sem medo”. Pois, quando primeiramente houve medo e perigo, e, assim, alguém tiver sido libertado da mão de seus inimigos, certamente foi libertado, mas não sem temor.
Assim, a vinda do Senhor Jesus nos libertou, “sem medo da mão de nossos inimigos”. Com efeito, não conhecemos nossos inimigos e não os vimos nos atacar, mas, sem o saber, de repente, fomos arrancados de suas armadilhas e de suas ciladas.
“Em um segundo e instantaneamente”, introduziu-nos na “herança e partilha dos justos” e fomos libertados “sem medo da mão dos inimigos, para servir a Deus na santidade e justiça perante ele todos os dias de nossa vida”.

A grandeza do precursor
“E tu, menino, serás chamado profeta do Altíssimo”. Em minha mente indago [sobre] a razão por que Zacarias profetiza não como se falasse de João, mas ao próprio João: “e tu, menino, serás chamado profeta do Altíssimo”, e a sequência.
De fato, era supérfluo dirigir-se a quem não ouvia e fazer uma apóstrofe a um pequenino e
em lactação.
[Mas] penso que posso ter encontrado esta razão: porque tudo o que foi escrito a seu respeito relata feitos maravilhosos: João maravilhosamente nasceu e, com o anúncio de um anjo, veio ao mundo; depois de Maria ter estado morando na casa de Isabel por três meses, foi posto no mundo.
Porque, se duvidas que aquele imediatamente posto no mundo possa ouvir as palavras do pai e saber o que elas sejam – porque a ele é dito: “e tu, menino, serás chamado profeta do Altíssimo” –, considera que foram muito mais maravilhosos os acontecimentos anteriores: “eis que a voz da tua saudação mal chegou aos meus ouvidos e a criança exultou em júbilo em meu ventre”.
Se, com efeito, até aqui encerrado no ventre da mãe, ouviu Jesus e, ouvindo-o, exultou e alegrou-se, por que não crer que ele, uma vez nascido, tenha podido ouvir e compreender a profecia do pai que lhe diz: “e tu, menino, serás chamado profeta do Altíssimo; pois irás adiante do Senhor para preparar seus caminhos?”.
Eu penso que Zacarias se apressou para falar com o pequenino, porque sabia que, pouquíssimo tempo depois, iria viver no deserto, e que não poderia mais ter a presença dele. “Com efeito, a criança vivia no deserto até o dia de sua manifestação para Israel”.
Também Moisés morou no deserto, mas depois de completar quarenta anos de idade; fugiu do Egito e, durante outros quarenta anos, guardou os rebanhos de Jetro.
João, pelo contrário, assim que nasceu, passou a viver no deserto e aquele que “foi o maior entre os nascidos das mulheres”, pareceu digno de uma educação mais elevada. É dele que fala o profeta: “eis que envio meu anjo diante de tua face”.
Com razão, é chamado anjo aquele que fora enviado adiante do Senhor e pôde ouvir e compreender, assim que nasceu, o pai que profetizava. Por isso, nós que acreditamos em tantas coisas maravilhosas, creiamos igualmente na ressurreição, creiamos também nas promessas do reino dos céus, que devem se cumprir e que o Espírito Santo nos garante quotidianamente.
Receberemos tudo isso, que está escrito de modo maravilhoso, mais do que podemos perceber, em Cristo Jesus: “a quem pertencem a glória e o poder nos séculos dos séculos. Amém”.

O que você destaca no texto?
Como ele serve para sua espiritualidade?

Nenhum comentário:

Postar um comentário