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Estudo sobre os Pais da Igreja: Vida e
Obra
Orígenes de Alexandria (185-253)
As Homilias
sobre São Lucas (Homilia 9,10)
HOMILIA
9
Lc 1,56-64- Sobre o que está escrito:
“Permaneceu junto a ela por três meses”, até aquela passagem que diz: “E
falava, bendizendo a Deus”.
Transformação
operada nas almas pela presença de Jesus
A razão, tanto
dos ditos quanto dos fatos reportados [nas Escrituras], deve ser digna do
Espírito Santo e da fé no Cristo, para a qual fomos chamados como crentes.
Assim, devemos,
agora, investigar a razão pela qual Maria, depois de haver concebido, veio para
junto de Isabel e “permaneceu junto a ela por três meses”; ou qual foi a causa para
que Lucas, que escrevia a história do Evangelho, inserisse nesse este
versículo: “permaneceu por três meses, e depois regressou à sua casa”.
Seguramente deve
haver alguma razão, a qual, se o Senhor
abrir nosso coração, a homilia que se segue mostrará.
Se, de fato,
bastou que Maria viesse até Isabel e a saudasse, para que a criança exultasse
de júbilo, e Isabel, cheia do Espírito Santo, profetizasse o que está escrito
no Evangelho, e se, em uma hora apenas, tantas transformações ocorressem,
resta, para a nossa reflexão, [verificar] quais progressos fez João em três meses,
estando Maria junto de Isabel.
É
verdadeiramente inconcebível que por três meses nem João nem Isabel tenham feito
progressos com a proximidade da mãe do Senhor e com a presença do próprio Salvador,
quando, em um segundo, instantaneamente, a criança exultou e, por assim dizer,
pulou de alegria, e Isabel foi repleta do Espírito Santo.
Durante esses
três meses, João era, pois, treinado e recebia, por assim dizer, a unção na
arena dos atletas, e era preparado no ventre da mãe, para que, maravilhosamente
nascido, fosse educado mais maravilhosamente ainda.
Porque foi
educado de um modo inabitual, a Escritura não relata como ele foi amamentado
pelos seios de sua mãe, [nem] como ele foi sustentado nos braços de uma criada,
mas imediatamente [diz o que] se segue: “Ele viveu no deserto, até o tempo de
sua apresentação a Israel”.
O
nascimento de um justo
Depois, lemos:
“Para Isabel, porém, o tempo de dar à luz completou-se, e ela deu à luz um
filho”. Muitos consideram supérfluo dizer: “Para Isabel, porém, o tempo de dar
à luz completou-se, e ela deu à luz um filho”.
Qual mulher, com
efeito, pode dar à luz, se não tiver completado o tempo do parto? Mas aquele
que medita com muito cuidado a Escritura e ouve [São] Paulo, que diz: “Presta
atenção na leitura”, pode procurar, tanto no Antigo quanto no Novo Testamento,
se em alguma parte encontra escrito sobre o nascimento de um pecador; nunca
absolutamente encontrará que “completou-se o tempo para que desse à luz”.
Mas onde quer
que nasça um justo, aí os dias se completam, lá sua vinda para o mundo se
completa.
O nascimento de
um justo tem sua plenitude, mas o nascimento do pecador é, por assim dizer,
vazio e nulo. Isso é o que se refere ao que está escrito: “completou-se o
tempo, para que desse à luz”.
Zacarias
recobra a voz
Em seguida,
depois do nascimento de João, “vizinhos e parentes alegravam-se” com a mãe dele
e, em honra do pai, queriam dar o nome dele ao menino e chamá-lo de Zacarias.
Ora, Isabel, sob
inspiração do Espírito Santo, dizia: “João é seu nome”. Em seguida, quando eles
buscavam os justos motivos pelos quais seria melhor que ele fosse chamado de
João, quando ninguém em sua família tinha esse nome, interrogaram ao pai, que,
sendo incapaz de responder, o fez com um gesto com a mão e por escrito.
“Ele escreveu”,
com efeito, numa tabuinha: “João é seu nome”. Assim que o estilete imprimiu a
palavra sobre a cera, “sua língua”, que antes fora acorrentada, “soltou-se” e recebeu
uma elocução que não era humana.
Enquanto sua
língua esteve presa, era humana; a incredulidade, com efeito, a havia prendido.
Assim que se soltou, cessou de ser humana, e “falava bendizendo a Deus” e
profetizou o que está escrito no Evangelho, sobre o qual, quando for o tempo,
discorreremos, oferecendo-nos a ocasião o Senhor Jesus Cristo: “a quem
pertencem a glória e o poder nos séculos dos séculos. Amém”.
HOMILIA
10
Lc 1,67-76 - Sobre o que está escrito:
“Cheio do Espírito Santo, ele profetizou”, até aquela passagem que diz: “Pois
tu irás adiante do Senhor, para preparar seus caminhos”.
O
Benedictus
Cheio do
Espírito Santo, Zacarias anuncia duas profecias de modo geral, a primeira sobre
o Cristo, a outra sobre João. Isso claramente se confirma por suas palavras, nas
quais fala de um Salvador como já presente e que viveria no mundo e, em
seguida, de João.
“Cheio do Espírito Santo, ele profetizou
dizendo: ‘Bendito seja o Senhor, Deus de Israel, porque visitou e concedeu
redenção a seu povo’”.
Estando Deus
visitando e querendo redimir seu povo, Maria permaneceu com Isabel por três
meses, depois que lhe falou o anjo, para que, por um poder especialmente
inefável, o Salvador presente preparasse não somente João, como dissemos da
última vez, mas também Zacarias, como o Evangelho de hoje nos mostra.
Paulatinamente,
de fato, também ele progredia durante esses três meses sob a influência do
Espírito Santo e, sem o sentir, recebia a instrução de Deus e fez essa profecia
acerca do Cristo, dizendo: “Que concedeu a redenção a seu povo, e suscitou o cume
de salvação para nós na casa de Davi”, porque “da raça de Davi segundo a carne”
nasceu o Cristo. Em verdade foi “o cume da salvação na casa de Davi”, porque
esta profecia já se encontra cantada: “A vinha foi plantada em um cume”.
Em qual cume? Em
Cristo Jesus, sobre o qual agora está escrito: “Ele suscitou o cume da salvação
para nós na casa de Davi, seu servidor, como foi falado pela boca dos seus
santos profetas”.
A
libertação
“Para a
libertação de nossos inimigos”. Não pensemos que se trata agora de inimigos no sentido físico, mas dos inimigos
espirituais. Veio, com efeito, o Senhor Jesus, “forte no combate”, destruir
todos os nossos inimigos, para nos libertar de suas armadilhas; [para nos
libertar] da mão de todos os nossos inimigos, “da mão de todos os que nos
odeiam”.
“Usar de
misericórdia com nossos pais”. Eu considero que, com o advento do Senhor
Salvador, Abraão, Isaque e Jacó tenham usufruído da misericórdia de Deus.
É inacreditável
que esses homens, que previamente viram o seu dia e se alegraram,
posteriormente, na sua vinda e com o [seu] nascimento de uma virgem, não tenham
recebido nada de útil.
E o que direi
dos patriarcas? Seguindo a autoridade das Escrituras, audaciosamente subirei ao
ponto ainda mais alto, porque a presença do Senhor Jesus e a sua Encarnação tiveram
proveito não só para as coisas terrenas, mas também para as celestes.
Por isso diz o
Apóstolo [Paulo]: “Estabelecendo a paz, pelo sangue de sua cruz, sobre a terra
e nos céus”.
Se a presença do
Senhor, porém, foi útil, seja na terra, seja nos céus, por que temes em dizer
que seu advento também foi útil aos Patriarcas, a fim de que fosse cumprida
esta palavra: “Para usar de misericórdia com nossos pais, e recordar-se de sua santa
aliança, do juramento feito a Abraão nosso pai”, de nos conceder sermos
libertados “sem medo da mão de nossos inimigos”?
Frequentemente
homens são liberados da mão de [seus] inimigos, mas não “sem medo”. Pois,
quando primeiramente houve medo e perigo, e, assim, alguém tiver sido libertado
da mão de seus inimigos, certamente foi libertado, mas não sem temor.
Assim, a vinda
do Senhor Jesus nos libertou, “sem medo da mão de nossos inimigos”. Com efeito,
não conhecemos nossos inimigos e não os vimos nos atacar, mas, sem o saber, de
repente, fomos arrancados de suas armadilhas e de suas ciladas.
“Em um segundo e
instantaneamente”, introduziu-nos na “herança e partilha dos justos” e fomos
libertados “sem medo da mão dos inimigos, para servir a Deus na santidade e justiça
perante ele todos os dias de nossa vida”.
A
grandeza do precursor
“E tu, menino,
serás chamado profeta do Altíssimo”. Em minha mente indago [sobre] a razão por
que Zacarias profetiza não como se falasse de João, mas ao próprio João: “e tu,
menino, serás chamado profeta do Altíssimo”, e a sequência.
De fato, era
supérfluo dirigir-se a quem não ouvia e fazer uma apóstrofe a um pequenino e
em lactação.
[Mas] penso que
posso ter encontrado esta razão: porque tudo o que foi escrito a seu respeito
relata feitos maravilhosos: João maravilhosamente nasceu e, com o anúncio de um
anjo, veio ao mundo; depois de Maria ter estado morando na casa de Isabel por
três meses, foi posto no mundo.
Porque, se
duvidas que aquele imediatamente posto no mundo possa ouvir as palavras do pai
e saber o que elas sejam – porque a ele é dito: “e tu, menino, serás chamado
profeta do Altíssimo” –, considera que foram muito mais maravilhosos os
acontecimentos anteriores: “eis que a voz da tua saudação mal chegou aos meus
ouvidos e a criança exultou em júbilo em meu ventre”.
Se, com efeito,
até aqui encerrado no ventre da mãe, ouviu Jesus e, ouvindo-o, exultou e
alegrou-se, por que não crer que ele, uma vez nascido, tenha podido ouvir e
compreender a profecia do pai que lhe diz: “e tu, menino, serás chamado profeta
do Altíssimo; pois irás adiante do Senhor para preparar seus caminhos?”.
Eu penso que Zacarias
se apressou para falar com o pequenino, porque sabia que, pouquíssimo tempo depois,
iria viver no deserto, e que não poderia mais ter a presença dele. “Com efeito,
a criança vivia no deserto até o dia de sua manifestação para Israel”.
Também Moisés
morou no deserto, mas depois de completar quarenta anos de idade; fugiu do
Egito e, durante outros quarenta anos, guardou os rebanhos de Jetro.
João, pelo
contrário, assim que nasceu, passou a viver no deserto e aquele que “foi o
maior entre os nascidos das mulheres”, pareceu digno de uma educação mais elevada.
É dele que fala o profeta: “eis que envio meu anjo diante de tua face”.
Com razão, é
chamado anjo aquele que fora enviado adiante do Senhor e pôde ouvir e
compreender, assim que nasceu, o pai que profetizava. Por isso, nós que
acreditamos em tantas coisas maravilhosas, creiamos igualmente na ressurreição,
creiamos também nas promessas do reino dos céus, que devem se cumprir e que o
Espírito Santo nos garante quotidianamente.
Receberemos tudo
isso, que está escrito de modo maravilhoso, mais do que podemos perceber, em
Cristo Jesus: “a quem pertencem a glória e o poder nos séculos dos séculos.
Amém”.
O que você
destaca no texto?
Como ele serve
para sua espiritualidade?
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