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Estudo sobre os Pais da Igreja: Vida e
Obra
Orígenes de Alexandria (185-253)
As Homilias
sobre São Lucas (Homilia 19)
HOMILIA
19 - Lc 2.40-46
Novamente sobre
o que está escrito: “O menino crescia e fortalecia-se” até aquela passagem em
que ele interroga os anciãos no templo.
A
divindade de Jesus
Porque alguns,
que parecem crer na Santa Escritura, negam a divindade do Salvador com relação,
dizem esses alguns, à glória do Deus onipotente, parece-me
justo que recebam, pela autoridade das próprias Escrituras, o ensinamento de
que algo divino veio para um corpo humano; e não somente para um corpo humano,
mas para uma alma também humana.
Aliás, se
consideramos com cuidado o sentido das Escrituras, aquela alma teve algo a mais
que as outras almas dos homens, pois toda alma humana, antes de chegar à
virtude, encontra-se manchada pelos vícios.
Ora, a alma de
Jesus nunca foi maculada pela impureza do pecado.
Porquanto, antes
que tenha chegado ao décimo segundo ano de idade, o Espírito Santo escreve
sobre ele no Evangelho de [São] Lucas: “O menino crescia, porém, e
fortificava-se e estava cheio de sabedoria”.
A natureza dos
homens não recebe isto, que antes dos doze anos esteja repleto de sabedoria.
Uma coisa é ter
uma parte de sabedoria, outra coisa é estar repleto de sabedoria.
Logo, não
duvidemos de que algo divino tenha aparecido na carne de Jesus que ultrapassava
não somente o homem, mas também toda criatura racional.
“Ele crescia”,
diz [o Evangelho]. “Ele tinha se humilhado, com efeito, tomando a forma do
escravo” e, pela mesma virtude, com a qual
“tinha se humilhado”, cresce.
Ele tinha
aparecido fraco, porque tinha tomado um corpo fraco e, por isso, recobrava a força.
O Filho de Deus “tinha se aniquilado” e, por isso, ele está de novo repleto de sabedoria.
“E a graça de
Deus estava sobre ele.” Não estava sobre [só] quando chegou à adolescência, não
[só] quando ensinava publicamente; mas já desde que era ainda pequenino tinha a
graça de Deus; e, como todas as coisas nele tinham sido admiráveis, sua
infância foi também admirável, a tal ponto que possuía em plenitude a sabedoria
de Deus.
Jesus
fica no templo
“Seus pais iam,
portanto, segundo o costume, a Jerusalém para a solenidade do dia da Páscoa. Quando
o menino completou doze anos.”
Observa bem que,
antes do seu décimo segundo ano, ele já possuía em plenitude a sabedoria de
Deus e os outros dons que lhe são atribuídos na Escritura.
Portanto,
conforme dissemos, como fosse o seu décimo segundo ano e, segundo o costume, os
dias da solenidade tivessem expirado e os pais voltassem, “o menino ficou em
Jerusalém, sem que seus pais soubessem”.
Há aí, compreende-o,
algo mais sublime do que a natureza humana é capaz de apreender.
Não basta, pois,
simplesmente dizer “ele ficou” e seus pais ignoravam onde estava.
Mas conforme
está escrito no Evangelho de [São] João, quando
escapou do meio deles e não apareceu, no momento em que os judeus lhe punham em
armadilha, também agora acredito que o menino ficou em Jerusalém assim e que
seus pais ignoravam onde ele tinha ficado.
Não nos
admiremos que tenham sido chamados pais os que mereceram o título de pai e mãe,
um por sua maternidade e outro pelos serviços prestados.
A
procura de Jesus
O texto
continua: “Nós te procurávamos dolorosamente”.
Não penso que
eles se condoíam por acreditar que o menino vagasse sem rumo ou tivesse
morrido.
E não podia
suceder que Maria temesse que seu filho se perdesse vagando sem rumo, ela que sabia
que concebera pelo Espírito Santo, que ouvira o anjo lhe falar, e os pastores correndo
e Simeão profetizando.
Afasta
absolutamente essa interpretação também a respeito de José, que recebera do
anjo o preceito de tomar o menino e se encaminhar para o Egito, que ouvira
estas palavras: “Não temas em tomar Maria por esposa, pois o que nela nasceu é
o fruto do Espírito Santo”.
Nunca poderia
acontecer que ele temesse que a criança, que ele sabia ser divina, estivesse
perdida.
O sofrimento dos
pais e as perguntas que se fazem nos sugerem um sentido diferente daquele que o
leitor comum concebe.
[Esse sofrimento
é] como quando tu, se lês às vezes as Escrituras, buscas nelas um sentido com
certa dor e tormento, não porque consideres que as Escrituras tenham se
enganado ou contenham asserções falsas, mas porque elas contêm intrinsecamente
a linguagem e a razão da verdade, cujo sentido tu não podes descobrir, mas que,
entretanto, é o verdadeiro.
Assim Maria e
José buscavam a Jesus, temendo que por acaso tivesse se apartado deles, temendo
que, deixando-os, tivesse transmigrado a outros lugares e – o que mais creio –
que retornasse aos céus para novamente de lá descer quando lhe aprouvesse.
“Dolorosamente”,
portanto, buscavam o Filho de Deus. E como buscavam, não o encontraram “entre
os parentes”.
E não podia o
parentesco humano reter o Filho de Deus. Não o encontraram entre os conhecidos,
porque a virtude divina era maior que o conhecimento e a ciência mortal.
Onde, então, o
encontram? No templo; aí é encontrado, de fato, o Filho de Deus. Se um dia
também tu buscares o Filho de Deus, busca primeiramente o templo, para lá
apressa-te; aí encontrarás o Cristo, a Palavra e a Sabedoria, isto é, o Filho
de Deus.
Sabedoria
de Jesus
Porque ele era
um pequenino, é encontrado “no meio dos mestres”, santificando-os e instruindo-os.
Porque era um
pequenino, é encontrado “no meio deles”; não lhes ensinava, mas “os
interrogava”.
E nisso, segundo
as obrigações de sua idade, ele nos ensinava o que convém às crianças: ainda
que sejam sábios e instruídos, que escutem seus mestres antes de desejarem
ensinar, e não se jactem por uma vã ostentação.
Ele interrogava,
digo, os mestres, não para que aprendesse algo, mas para que instruísse, interrogando.
Interrogar e
responder com sabedoria emanam de uma só e mesma fonte de doutrina; e é a marca
de uma mesma ciência saber o que interrogas ou o que respondes.
Foi necessário
que primeiramente o Salvador se tornasse mestre da interrogação instruída, para
que posteriormente respondesse às interrogações, segundo a razão e a Palavra de
Deus, “a quem pertencem a glória e o poder nos séculos dos séculos. Amém”.
O que você destaca no texto?
Como ele serve para sua
espiritualidade?