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Estudo sobre os Pais da Igreja: Vida e Obra
Teófilo de Antioquia (†181)
Primeiro Livro a Autólico (Capítulo 1 ao 5)
Capítulo I – Introdução
Boca eloqüente e dicção
agradável fornecem prazer e glória fútil de louvor para os pobres homens que
têm o entendimento corrompido; o amante da verdade, porém, não se prende a
palavras afetadas, mas examina a eficácia da palavra, o que ela é e de que tipo
é. Pois bem, meu amigo: tu me causaste estupor com palavras vãs,
vangloriando-te dos teus deuses de pedra e madeira cinzelados e fundidos,
esculpidos e pintados, deuses que não vêem nem ouvem (de fato, são imagens e
obras de mãos humanas); além disso, tu também me chamas zombeteiramente de
cristão, como se eu portasse um nome infame. Quanto a mim, confesso que sou
cristão e trago esse nome grato a Deus, e espero ser útil ao mesmo Deus. Não há
fundamento, para supores que seja difícil ter o nome de Deus; talvez porque,
sendo inútil para Deus, tu pensas dessa maneira sobre Deus.
Capítulo II – Condições morais para o
conhecimento de Deus
Mas se tu me dizes: “Mostra-me
teu Deus”, eu te poderia responder: “Mostra-me teu homem, e eu te mostrarei o meu
Deus”. Mostra-me, portanto, os olhos de tua alma que vejam e os ouvidos do teu
coração que ouçam. Com efeito, aqueles que vêem com os olhos do corpo observam
aquilo que se passa na vida e sobre a terra, discernindo juntamente as
diferenças entre a luz e a escuridão, entre o branco e o negro, entre o
disforme e a bela forma, entre o que é harmonioso, bem proporcionado e o que é
desarmonioso e desproporcional, desmesurado e truncado; a mesma coisa para
aquilo que cai sob o sentido dos ouvidos: sons agudos, graves e suaves.
Acontece do mesmo modo com os ouvidos do coração e os olhos da alma aos quais é
possível perceber Deus. De fato, Deus é experimentado por aqueles que podem
vê-lo, desde que os olhos de sua alma estejam abertos. Todos têm olhos, mas
alguns os têm obscurecidos e não percebem a luz do sol; e não é porque os cegos
não vêem que a luz do sol deixa de brilhar, mas os cegos devem buscar a causa
em si mesmos e em seus olhos.
Do mesmo modo, Ó homem, tu tens
os olhos de tua alma obscurecidos por tuas faltas e tuas más ações. O homem
deve ter alma pura como espelho brilhante. Quando o espelho fica enferrujado,
não se pode mais ver a face do homem no espelho; assim também, quando há falta
no homem, esse homem já não pode contemplar a Deus. Mostra-te a ti mesmo, se
não és adúltero, se não és devasso se não és pederasta, se não és ladrão, se
não és explorador, se não és colérico, se não és invejoso, se não és impostor,
se não és soberbo, se não és brutal, se não és amante do dinheiro, se não
desobedeces a teus pais, se não vendes teus filhos. Com efeito, Deus não se
manifesta àqueles que cometem essas faltas, a não ser que antes se purifiquem
de toda mancha. Por isso, tudo é obscuro para ti, como a bandagem que se coloca
no olho por não poder contemplar a luz do sol. Assim também, ó homem, tuas
impiedades projetam sobre ti trevas e tu não podes ver a Deus.
Capítulo III – Transcendência de
Deus
Então me dirás: “Tu que vês,
descreve-me o aspecto de Deus”. Escuta, homem: o aspecto de Deus é inefável,
inexprimível, e não pode ser visto com os olhos carnais. Por sua glória, ele é
sem limite, inigualável por sua grandeza, acima de qualquer idéia por sua
altura, incomensurável por sua força, sem igual por sua sabedoria, inimitável
por sua bondade, indizível por sua benevolência. Se eu o chamo Luz, é uma de
suas criaturas que nomeio; se eu o chamo Verbo, nomeio o seu princípio; seu eu
o chamo Razão, nomeio a sua inteligência; se eu o chamo Espírito, nomeio a sua
respiração; se eu o chamo Sabedoria, nomeio o que ele gera; se eu o chamo
Força, nomeio o seu poder; se eu o chamo Potência, nomeio a sua atividade; se
eu o chamo Providência, nomeio a sua bondade; se eu o chamo Soberania, nomeio a
sua glória; seu eu o chamo Senhor, digo que é juiz; se eu o chamo Juiz, digo
que é justo; se eu o chamo Pai, digo que é tudo; se o chamo Fogo, nomeio a sua
ira. Tu me dirás: “Deus fica irado?” Eu respondo: Sim, ele se ira contra
aqueles cujas ações são más; no entanto, ele é bom, propício e misericordioso
para com aqueles que o amam e o temem; ele é o educador dos fiéis, o pai dos
justos, o juiz e castigador dos ímpios.
Capítulo IV – A soberania de Deus
Ele não tem princípio, porque
não foi gerado; ele é imutável, porque é imortal. É chamado Deus porque fundou
tudo sobre sua própria estabilidade, e ainda através de théein. Théein
significa correr, ser ativo, trabalhar, alimentar, prover, governar, dar vida a
tudo. Ele é Senhor, porque exerce o senhorio sobre tudo; Pai, porque existe antes
de tudo; Fundador e Criador, porque ele criou e fez tudo; Altíssimo, porque ele
é superior a todas as coisas; Onipotente, porque ele domina e envolve tudo. As
alturas dos céus, as profundezas dos abismos, e os confins da terra estão em
sua mão; não há lugar onde esteja suspensa a sua ação. Os céus são obra sua; a
terra é realização sua; o mar é criação sua; o homem é figura e imagem sua; o
sol, a lua e as estrelas são elementos seus, feitos para medir sinais, medida
de tempo, dias e anos, para utilidade e serviço dos homens. E Deus fez tudo do
não-ser para o ser, a fim de que por suas obras seja conhecida e compreendida a
sua grandeza.
Capítulo V – Condições intelectuais para o
conhecimento de Deus
Do mesmo modo como a alma não pode ser vista
no homem, pois ela é invisível para os homens, mas pode ser imaginada por causa
dos movimentos do corpo, assim também acontece com Deus: ele não pode ser visto
pelos olhos humanos, mas pode ser visto e imaginado pela sua providência e
pelas suas obras. Quando alguém vê no mar um navio com todo o seu apetrecho,
que singra e se aproxima do porto, é evidente que pensa que há um piloto que o
dirige; do mesmo modo, deve-se pensar que existe um Deus, que governa tudo,
embora os olhos carnais não o vejam, porque ele não é circunscrito. Se o sol,
que é o menor elemento existente, não pode ser fixado pelo olhar humano, pois é
muito quente e muito forte, como não será muito mais impossível ao homem mortal
ver face a face a glória inefável de Deus? A romã possui uma casca que a envolve;
dentro tem muitas repartições ou casinhas separadas por membranas e,
finalmente, muitos grãos aí alojados. Do mesmo modo, toda a criação está
envolvida pelo sopro de Deus, e esse sopro que a envolve está com a criação
pela mão de Deus.
Assim como o grão da romã, do interior de seu
habitáculo, não pode ver o que está fora da casca, pois está lá dentro, também
o homem, que é envolvido com toda a criação pela mão de Deus, não pode
contemplar a Deus. Além disso, crê-se que um soberano terrestre existe, embora
ninguém o veja: suas leis, seus editos, seus funcionários, suas autoridades,
suas estátuas o tornam conhecido. E tu não queres reconhecer Deus pelas suas
obras e manifestações de seu poder?
·
O que desejo destacar no texto?
·
Como este texto serviu para a
minha espiritualidade?
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