domingo, 5 de maio de 2019

94 - Orígenes de Alexandria (185-253) As Homilias sobre São Lucas (Homilia 2. Lucas 1.6)


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94
Estudo sobre os Pais da Igreja: Vida e Obra
Orígenes de Alexandria (185-253)
As Homilias sobre São Lucas (Homilia 2. Lucas 1.6)


HOMILIA 2
Leia Lucas 1.6
Sobre o que foi escrito: (Zacarias e Isabel, os pais de João) “Ambos, porém, eram justos diante de Deus, andando segundo todos os mandamentos e preceitos do Senhor, de um modo irrepreensível, sem censura”.

Ser sem pecado
1. Os que querem dar a seus pecados alguma desculpa, julgam que não existe ninguém isento de pecado e invocam o testemunho que se acha escrito em Jó: “Ninguém está imune da sordidez, nem se fosse de um só dia sua vida sobre a terra; seus meses, porém, são contáveis”.
Deste testemunho, só proferem o conteúdo verbal, mas ignoram profundamente seu conteúdo. Em resposta a esses, brevemente responderemos, haja vista que ser sem pecado nas Escrituras deve ser entendido de dois modos, seja [o primeiro] não ter nunca pecado, e o outro ter cessado de pecar. Se afirmam, pois, que não se pode dizer isento de pecado senão aquele que nunca pecou, nós estamos de acordo em que ninguém está isento do pecado, porque todos os homens pecamos uma vez ou outra, embora em seguida tenhamos seguido a senda da virtude. Se, na verdade, assim entendem que não há homem isento de pecado, a tal ponto que neguem que alguém com uma vida pregressa nos vícios possa se voltar para as virtudes, para que nunca mais peque, é falsa opinião destes. Pode acontecer, com efeito, que um pecador veterano, ao cessar de pecar, seja declarado sem pecado.
Assim também nosso Senhor Jesus Cristo fez aparecer diante dele uma Igreja resplandecente, que não tem mancha, não porque o homem que pertence à Igreja nunca tenha tido mancha, mas porque, a partir de então, não será mais manchado; que não tem ruga, não porque a ruga do homem velho não tenha existido nele uma outra vez, mas porque a tenha cessado de ter. Desse modo, também se deve entender aquilo que se segue: “que seja santa e imaculada”, não porque tenha sido imaculada desde o princípio – isto não se pode sequer suspeitar acerca do homem, que sua alma não tenha sido manchada –, mas porque se estima pura e intacta aquela que tenha cessado de se manchar.
Fizemos todas essas observações, com efeito, para que fizéssemos entender que o homem, pelo fato de ter cessado de pecar, pode ser chamado isento de pecado e imaculado. Também, a partir disso, está escrito muito claramente sobre Zacarias e Isabel: “ambos, porém, eram justos aos olhos de Deus, andando segundo todos os mandamentos e preceitos do Senhor, de um modo irrepreensível, sem censura”.

Ser justo aos olhos de Deus
Contemplemos de mais perto o elogio de Zacarias e de Isabel que o santo Lucas relata em sua história, não tanto para que saibamos que eles foram louváveis, mas para
que também nós próprios nos tornemos dignos de louvor, fazendo nosso seu santo zelo. Ele teria podido simplesmente escrever: “ambos, porém, eram justos, andando segundo todos os mandamentos e preceitos do Senhor, de um modo irrepreensível”.
Mas era necessário acrescentar: “ambos, porém, eram justos aos olhos de Deus”. Pode, com efeito, acontecer a alguém ser justo aos olhos do homem, não o sendo aos olhos de Deus. Por exemplo: um homem não encontra nenhum mal e, examinando tudo o que me diz respeito, não encontra nada para me censurar: eu sou justo aos olhos dos homens.
Imagina que todos os homens têm de mim a mesma opinião, se eles procuram em mim um assunto de crítica sem poder descobri-lo e me louvam com uma boca unânime, eu sou justo aos olhos de vários homens. Ora, com efeito, o julgamento dos homens não é seguro: eles ignoram se pequei um dia no recôndito do meu coração, se olhei uma mulher desejando-a, ou se nasceu em meu coração um adultério.
Ignoram os homens, quando me tiverem visto segundo meus meios dar a esmola, se [o] fiz por causa do mandamento de Deus ou se busquei o louvor e o favor dos homens.
Coisa difícil é ser justo aos olhos de Deus, para que não faças algo de bom não por outra causa senão pelo próprio bem, e busques somente a Deus, retribuidor da boa ação. Semelhante fato também o Apóstolo atesta: “Seu louvor não vem dos homens, mas de Deus”. Feliz aquele que é justo e louvável aos olhos de Deus.
Os homens, com efeito, embora pareçam ter um julgamento certo, não podem, porém, pronunciar [um julgamento] certo. E de fato acontece, às vezes, que louvem àquele que não merece elogio, e àquele, que não é nem um pouco digno de crítica, façam críticas. Apenas Deus é justo juiz no louvor e no vitupério.
Daí é normal que acrescentemos ao louvor dos justos: “ambos, porém, eram justos aos olhos de Deus”. Salomão igualmente exorta-nos a uma atitude semelhante, dizendo nos Provérbios: “Procura o bem aos olhos de Deus e dos homens”.

Andar segundo os mandamentos e julgamentos do Senhor
Zacarias e Isabel recebem em seguida outro elogio: “andando segundo todos os mandamentos e preceitos do Senhor, de um modo irrepreensível”.
Quando nossos julgamentos são justos e corretos, andamos segundo os preceitos do Senhor; mas quando fazemos isto ou aquilo, andamos segundo seus mandamentos. É por isso que, a meu ver, São Lucas, querendo fazer deles um elogio perfeito, acrescentou: “ambos, porém, eram justos aos olhos de Deus, andando segundo todos os mandamentos e preceitos do Senhor”.

Fugir da vanglória
Alguém me diria: se este louvor é perfeito, o que quer dizer esta expressão: “sem censura”? Bastava, pois, dizer: “andando em todos os caminhos e preceitos do Senhor”, não poderia dar-se que ande alguém em todos os mandamentos de Deus, e, porém, não ande “sem censura”.
E como pode acontecer que alguém, andando em todos os mandamentos e preceitos de Deus, possa estar sob censura? A isso brevemente
responderei: se não fosse possível, nunca teríamos conhecido este texto, reportado em outra passagem: “segue com justiça o que é justo”.
Se não fosse justa, pois, alguma coisa, que não seguíssemos com justiça, seria vão prescrever-nos que seguíssemos com
justiça o que é justo.
Quando, com efeito, cumprimos o mandamento de Deus, mas, em nossa consciência, somos respingados pelas manchas da vanglória, de modo a [querer] agradar aos homens, ou então [quando] qualquer outra causa que não agrade a Deus precede nosso bem agir, ainda que cumpramos o preceito de Deus, não o fazemos, porém, isentos de censura, e seguimos sem justiça o que é justo. Difícil é, portanto, andar “em todos os mandamentos e preceitos do Senhor sem censura”, segundo o testemunho e o louvor de Deus em Cristo Jesus, que há de ser rendido no dia do Juízo por Aquele “diante do tribunal de quem nós devemos todos ser postos a descoberto para que cada um reencontre o que tiver cumprido durante sua vida, seja de bom ou de ruim”. “Todos, com efeito, apareceremos diante do tribunal de Deus” para receber o que merecemos no Cristo Jesus, “a quem pertencem a glória e o poder nos séculos dos séculos. Amém”.

O que você destaca no Texto?
Como ele serve para sua espiritualidade?

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