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Estudo sobre os Pais da Igreja: Vida e
Obra
Orígenes de Alexandria (185-253)
As Homilias
sobre São Lucas (Homilias 38)
HOMILIA 38 - Lc 19.41-45
Sobre o que está escrito: “Como, porém, ele se tinha aproximado,
viu a cidade e chorou sobre ela”, até aquela passagem que diz: “Ele derrubou as
mesas de todos os que vendiam pombas”.
Jesus, realização das bem-aventuranças
“Como tivesse se aproximado de Jerusalém, Nosso Senhor e Salvador,
vendo a cidade, chorou e disse: ‘Se nesse dia tu também tivesses conhecido a
mensagem de paz; porém agora, ela permanece escondida de teus olhos; pois dias
virão sobre ti em que teus inimigos te sitiarão’”. São misteriosas as coisas
ditas por Jesus, e esperamos, desvelando-as Deus [para nós], poder descobrir o
[seu] sentido oculto.
Primeiramente, deve-se ver, então, o significado de seu choro.
Todas as bem-aventuranças, das quais falou Jesus no Evangelho, são confirmadas
por seu exemplo, e ele justifica seu ensinamento por seu próprio testemunho.
Ele diz: “Bem-aventurados os mansos”. Eis
o que diz de si próprio: “Aprendei de mim, que sou manso”. “Bem-aventurados
os pacíficos”.
E quem mais é tão pacífico como o meu Senhor Jesus, que “é nossa
paz, que fez cessar a inimizade e a suprimiu em sua carne?”
“Bem-aventurados
aqueles que sofrem perseguição por causa da justiça”.
Ninguém sofreu perseguição por causa da justiça mais do que o
Senhor Jesus, que
por
nossos pecados foi crucificado. O Senhor mostra, pois, todas as bem-aventuranças
realizadas nele. Em conformidade com aquilo que dissera: “Bem-aventurados os
que choram”, o próprio Jesus chorou para lançar o fundamento dessa bem-aventurança.
Ele chorou, porém, sobre Jerusalém dizendo: “Se neste dia tivesses conhecido tu
também a mensagem de paz; mas agora ela permanece oculta a teus olhos”, e a
sequência, até aquela passagem que diz: “Porque não reconheceste o tempo em que
tu foste visitada”.
Jesus chora sobre Jerusalém
Alguém entre os ouvintes poderia dizer: o sentido de tais palavras
é evidente; elas se cumpriram, de fato, quanto ao que diz respeito a Jerusalém:
o exército romano, com efeito, sitiou-a e devastou-a até o extermínio, e virá um
tempo em que não restará mais dela pedra sobre pedra. Não nego que,
evidentemente, aquela Jerusalém foi destruída por causa dos crimes de seus
habitantes; mas pergunto se por acaso esse choro convenha também a esta nossa
Jerusalém. Nós somos, com efeito, a Jerusalém que é deplorada por Jesus; nós,
cujo olhar espiritual parece ser mais penetrante.
Se, depois de ter conhecido os mistérios da verdade, depois da
palavra do Evangelho, depois da doutrina da Igreja e depois da visão dos mistérios
de Deus, alguém dentre nós tiver pecado, ele será causa de choro e deploração.
Nenhum pagão, com efeito, é causa de choro, mas aquele que foi de Jerusalém e
deixou de ser dela.
Porém,
esta nossa Jerusalém é causa de choro, porque, depois de seus pecados, “os inimigos,
a saber, as potências adversas, os espíritos maus, a sitiarão. Eles lançarão trincheiras
ao seu redor e sitiá-la-ão “até que não deixem pedra sobre pedra”. Isso é o que
acontece sobretudo se, depois de uma perfeita continência, depois de muitos anos
passados na castidade, um homem que tiver sido atraído pelos apelos moles da
carne, tenha perdido a capacidade de suportar a pureza.
Se tiveres cometido uma fornicação, “não deixarão pedra sobre
pedra” em ti. Com efeito, diz em outra passagem: “Eu não me recordarei mais das
obras de justiça que ele praticou; eu o julgarei no próprio pecado em que tiver
sido surpreendido”.
Essa é, portanto, a Jerusalém que é deplorada.
Jesus expulsa os vendilhões
É dito depois disso: “Ele entrou no templo” e, uma vez tendo
entrado, “ele pôs para fora aqueles que vendiam pombas”. Não expulsou os
compradores; quem, com efeito, compra, possui o que compra. Jesus expulsou do
templo de seu Pai aqueles que vendem seus bens e põem fora o
que tinham tido, à semelhança do filho voluptuoso que recebeu uma parte dos
haveres do Pai e pôs a perder todas as coisas, bebendo em demasia.
Se vende, portanto, alguma coisa, é expulso, sobretudo se vendia
pombas.
Por que não citou outras aves, senão pombas? Esse animal é simples
e decoroso. Receio que também em nós um vício desse tipo seja identificado. Se,
com efeito, eu tiver vendido por dinheiro, e não ensinado gratuitamente, o que
me é revelado e confiado pelo Espírito Santo para dá-lo a conhecer ao povo, o
que faço de diferente a não ser vender pombas, isto é, o Espírito Santo?
Quando o tiver vendido, eu serei expulso do templo de Deus.
Por isso, roguemos ao Senhor para que todos sejamos antes
compradores que vendedores. Se, com efeito, não tivermos vendido, teremos o
conhecimento e a compreensão de nossa salvação; caso contrário, os inimigos
sitiarão nossa cidade. E se o exército inimigo nos tiver cercado uma vez, não
mereceremos as lágrimas do Senhor.
Levantemo-nos, portanto, ao romper do dia e rezemos a Deus para
que possamos comer, pelo menos, as migalhas que caem da mesa daquele homem.
A Escritura admira que a rainha de Sabá tenha vindo “da
extremidade da terra para ouvir a sabedoria de Salomão”; e,
depois de ter visto a refeição, e o mobiliário e os serviços de sua casa, ficou
tomada de estupor e toda maravilhada. Quanto a nós, se não abraçarmos de boa
vontade as prodigiosas riquezas de Nosso Senhor, o maravilhoso mobiliário de
sua palavra, a abundância de seus ensinamentos, se não comermos “o pão da vida”, se não
nos nutrirmos da carne de Jesus e não bebermos o sangue de seu sacrifício, se
desprezarmos o banquete de Nosso Salvador, devemos saber que Deus pode ter “tanto
bondade quanto severidade”.
A
partir disso tudo, devemos implorar para nós mais a sua bondade, em Cristo
Jesus, Nosso Senhor, “a quem pertencem a glória e o poder nos séculos dos séculos.
Amém”.
O que você destaca no texto?
Como o texto serve para sua espiritualidade?
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