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Estudo sobre os Pais da Igreja: Vida e
Obra
Cipriano de Cartago (210-258)
A Unidade da
Igreja – Partes 1 e 2
Introdução:
Composta em 251, imediatamente depois do De
lapsis (mesmo ano),
provavelmente seja a obra cipriânica de maior influência, reprodução e
discussão ao longo dos tempos. Cipriano exorta os fiéis a não abandonarem o
único rebanho de Cristo para seguir aqueles que deste se separaram, criando
comunidades próprias, iludindo-se e iludindo seus seguidores. É neste único
rebanho, a Igreja, que está a vida do Espírito; e sua unidade, fundada no
Cristo, expressa-se na comunhão dos e com os apóstolos. Os bispos são os
zeladores dessa unidade. Esse é o primeiro tratado – mesmo se não no senso
contemporâneo do termo – de eclesiologia da história da Igreja.
1.
Desmascarar o mal e superá-lo pela obediência a Cristo
O Senhor nos admoesta e diz: “Vós
sois o sal da terra”;[Mt 4.13] e nos manda ser simples até a inocência, e, no
entanto, apesar da simplicidade, prudentes.[Mt 10.16]
O que, então, irmãos caríssimos, nos é mais
conveniente que nos precaver – vigilantes e solícitos de coração – contra as
insídias do traiçoeiro inimigo, e igualmente descobri-las e evitá-las, para não
parecermos descuidados em conservar a salvação, nós que nos vestimos do
Cristo,[Rm 13.14] “sabedoria de Deus Pai”?[I Co 1.24].
Com efeito, a perseguição não é o
único perigo; tampouco tudo que irrompe em franca oposição para arruinar e
lançar por terra os servos de Deus. A precaução é mais fácil quando é manifesto
o temor; o ânimo se dispõe para o combate quando o adversário se declara.
O inimigo é mais temível e perigoso
quando se insinua furtivamente; quando, aparentando paz, serpeja (andar como
serpente) por sendas ocultas – daí seu nome de serpente. Tal é sua astúcia, tal
sua capacidade de enganar o homem em invisíveis e enigmáticas trapaças.
Assim como mentiu logo no princípio
do mundo (Gn 3.1-5) e frustrou a credulidade desprevenida das almas rudes,
seduzindo-as com palavras falaciosas, também aproximou-se veladamente do
próprio Senhor para tentá-lo, como se pudesse enganar e surpreender de novo.
Foi, porém, percebida e rechaçada; justamente por ter sido reconhecida e
descoberta, foi abatida.[Mt 4.1-11].
Donde o exemplo para fugirmos aos
caminhos do velho homem, e nos mantermos nas pegadas de Cristo vencedor.
Não sejamos, de novo, incautos,
envolvidos na armadilha da morte; mas, previdentes no perigo, gozemos a
imortalidade recebida. E que outro modo há de podermos gozar a imortalidade,
senão guardando os mandamentos do Cristo, com os quais é expulsa e vencida a
morte?
Ele próprio nos admoesta dizendo:
“Se queres alcançar a vida, guarda os mandamentos”;[Mt 19.17] e ainda uma vez:
“Se fizerdes o que eu vos mando, já não vos chamo servos, mas amigos”.[Jo15.14,15]
Estes são chamados por ele fortes e
estáveis, fundados na pedra com sólida ligadura, consolidados em firmeza imóvel
e inabalável, contra todas as tempestades e furacões do século: “Quem ouve
minhas palavras e as cumpre, compará-lo-ei a um homem sábio que edificou sua
casa sobre a pedra. Caiu a chuva, vieram as torrentes, sopraram os ventos e se
desencadearam sobre aquela casa, e ela não desabou. Pois fora construída sobre
a pedra”.[Mt 7.24-25]
Devemos nos apoiar em suas palavras,
aprender e fazer tudo que fez e ensinou. Além disso, como pode declarar que
acredita em Cristo quem não cumpre o que o Cristo mandou fazer? Ou, como
chegará à fé quem não quer observar a fé do mandamento?
Necessariamente vacilará,
extraviar-se-á; arrebatado pelo sopro do erro, será sacudido como o pó que o
vento afasta todo aquele que não conserva a verdade do caminho salutar.
2.
A expansão da Igreja não diminui sua unidade, na qual foi fundada.
Não só as coisas claras e evidentes
requerem precaução; também as ilusões sutis de uma astuta cilada o exigem.
[Em nossos dias] veio a luz para os
povos, brilhou o lume da salvação [Lc 2.30-32] para os homens que suspiravam
liberdade; os surdos recebem a Boa-nova da graça espiritual, os cegos abrem
seus olhos para Deus, os doentes recuperam a eterna salvação, os coxos correm
(Mt 11.5) à igreja para orar, com cânticos e súplicas.
Mas o inimigo, desmascarado e
derrotado pela vinda do Cristo, vendo seus ídolos desprezados, seus templos
abandonados pela multidão dos crentes, trama – que haverá de mais astuto e
sutil? –, trama uma nova emboscada para iludir os incautos sob o rótulo do
próprio nome de cristão.
O inimigo inventa heresias e cismas
para subverter a fé, corromper a verdade e quebrar a unidade. Assalta e engana,
com o desvio do novo caminho, aqueles que ele não pôde manter na cegueira da
estrada antiga.
Rouba homens da própria Igreja e os
imerge, inconscientes, em outras trevas, deixando-os pensar que se aproximam da
luz e escapam à noite do século.
Estes continuam a se dizer cristãos
sem guardarem a Boa nova do Cristo, seus preceitos e sua lei! Julgam ter luz e
caminham nas trevas.
O inimigo sedutor e mentiroso, que,
nas palavras do apóstolo, se transforma em anjo de luz (II Co 11.14) –
apresentando seus ministros como ministros da justiça, anunciando a noite como
dia, a perdição como salvação, o desespero como prêmio da esperança, a perfídia
sob pretexto da fé, o anticristo sob o nome do Cristo –, lhes subtrai a verdade
com a sutileza, apresentando como verdadeiras as coisas ilusórias.
Isto se dá, irmãos caríssimos,
porque não mais se volta à origem da verdade, não se busca mais em sua fonte,
nem se guarda a doutrina do magistério celeste.
Para quem considera e reflete sobre
estas coisas, não há necessidade de um longo tratado e com muitos argumentos. É
fácil provar a fé com o compêndio da verdade.
O Senhor diz a Pedro: “Eu te digo
que tu és Pedro e sobre esta pedra edificarei minha Igreja e as portas dos
infernos não a sobrepujarão. Dar-te-ei as chaves do reino dos céus e o que
ligares na terra será ligado também nos céus, e tudo aquilo que desligares na
terra será também desligado nos céus” (Mt 16.18-19).
E, igualmente, depois de sua
ressurreição, lhe diz: “Apascenta minhas ovelhas”. Assim o Senhor edifica sobre
ele a Igreja e lhe confia suas ovelhas para apascentá-las.
Se bem que dá igual poder a todos os
apóstolos, constitui, todavia, uma só cátedra e dispõe, por sua autoridade, a
origem e o motivo da unidade.
Por certo os demais apóstolos eram
como Pedro; mas o primado é dado a Pedro, e a unidade da Igreja e a da cátedra
são assim demonstradas.
Todos são pastores, mas, como se vê,
um só é o rebanho apascentado pelo consenso unânime de todos os apóstolos.
Julga conservar a fé quem não conserva esta unidade recomendada por Paulo?
Confia estar na Igreja, quem
abandona a Cátedra de Pedro sobre a qual está fundada a Igreja?”
O Senhor edifica sua Igreja sobre um
só, e embora conceda igual poder a todos os apóstolos depois de sua
ressurreição, dizendo: “Assim como o Pai me enviou eu vos envio; recebei o
Espírito Santo: se perdoardes os pecados de alguém, ser-lhe-ão perdoados; se os
retiverdes, reter-se-lhe-ão”; (Jo 20.21-23) no entanto, para manifestar a
unidade, dispôs, por sua autoridade, a origem desta mesma unidade partindo de
um só.
Sem dúvida os demais apóstolos eram
como Pedro, dotados de igual participação na honra e no poder; mas o princípio
parte da unidade, para que se demonstre ser única a Igreja de Cristo.
O Espírito Santo, em nome do Senhor,
designa esta mesma Igreja una no Cântico dos Cânticos, dizendo: “Uma é minha
pomba, minha perfeita; é uma para sua mãe, eleita para sua progenitora” (Ct
6.9).
Julga conservar a fé quem não
conserva esta unidade da Igreja? Confia estar na Igreja quem se opõe e resiste
à Igreja? Quando o próprio bem aventurado Apóstolo Paulo ensina a mesma coisa e
mostra o mistério da unidade dizendo: “Um corpo e um espírito, uma esperança da
vossa vocação, uma fé, um batismo, um Deus”. (Ef 4.4-6).
Principalmente nós, que presidimos a
Igreja como bispos, devemos manter e defender firmemente esta unidade, dando
provas da união e indivisibilidade do episcopado.
Que ninguém iluda perfidamente a
comunidade dos irmãos, nem corrompa a fé na verdade com infiel prevaricação.
O Episcopado é único e suas partes
são possuídas por cada um sem que se divida o todo. A Igreja é una, embora
compreenda uma multidão sempre crescente com o aumento de sua fecundidade;
assim como há uma só luz nos muitos raios de sol, uma árvore em muitos ramos,
um só tronco fundamentado em raízes tenazes, muitos rios de uma única fonte,
assim também esta multidão guarda a unidade de origem, se bem que pareça ser
dividida por causa da abundância inumerável dos que nascem com prodigalidade.
A unidade da luz não comporta que se
separe um raio do centro solar; um ramo quebrado da árvore não cresce; cortado
de sua fonte o rio seca imediatamente.
Do mesmo modo a Igreja do Senhor
que, como a luz derramada estende seus raios em todo o mundo, é uma única luz
que se difunde sem perder sua própria unidade.
Ela desenvolve seus ramos por toda a
terra, com grande fecundidade; ela derrama ao longe seus rios, com toda
liberalidade, e no entanto é uma na cabeça, uma pela origem; uma mãe
imensamente fecunda. Nascemos todos de seu ventre, somos nutridos com seu leite
e animados por seu espírito.
O que você
destaca no texto?
Como ele serve
para sua espiritualidade?
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