298
SÃO BASÍLIO MAGNO, ou
de CESAREIA
(330-379)
Regra Monástica - Asketikon
As Regras Extensas (55 regras)
Questões 36-40
QUESTÃO 36
OS QUE SE RETIRAM DA COMUNIDADE DOS IRMÃOS
Resposta
1.
Não
é lícito àqueles que uma vez prometeram viver unidos a outros, num mesmo lugar,
retirarem-se facultativamente. Duas seriam as causas de não se manterem o
propósito: ou o prejuízo proveniente da vida determinada numa comunidade, ou a
instabilidade do ânimo de quem muda de parecer.
2.
Quem
se separa dos irmãos por ter sofrido dano, não guarde para si o conhecimento da
causa, mas acuse o prejuízo infligido, segundo o ensinamento do Senhor: Se
teu irmão tiver pecado, vai e repreende-o entre ti e ele somente, etc.
(Mt 18,15).
3.
Se
houver a emenda desejada, lucra o irmão sem infligir afronta à comunidade. Se,
porém, ele observar que persistem no mal e não aceitam a correção,
comunicá-lo-á aos que são competentes para julgar tais decisões, e com o
testemunho de muitos, afaste- se.
4.
Retira-se,
porém, não mais da companhia de irmãos, mas de estranhos, porque o Senhor
compara aquele que se obstina no mal a um pagão e um publicano. Seja,
para ti, disse, como um pagão e um publicano (Mt 18,17).
5.
Se,
contudo, é por própria leviandade que se retira da companhia dos irmãos,
cure-se de sua fraqueza; se não o quiser, seja considerado indesejável à
comunidade. Se, porém, por causa do mandamento do Senhor, alguém for atraído a
outra parte, ele não se retira, mas realiza um desígnio.
6.
Razoavelmente
não se admite outra causa de saída; primeiro, porque é afronta ao nome de Nosso
Senhor Jesus Cristo que os reuniu; segundo, porque a consciência de um não está
pura diante do outro, mas haverá mútuas suspeitas, o que é evidentemente contra
o preceito do Senhor, que diz: Se estás, portanto, por fazer a tua oferta
diante do altar e te lembrares que teu irmão tem alguma coisa contra ti, deixa
lá a tua oferta diante do altar e vai primeiro reconciliar-te com teu irmão e só
então vem fazer a tua oferta (Mt 5,23.24).
QUESTÃO 37
SE É LÍCITO, SOB PRETEXTO DE ORAÇÃO E DE SALMODIA,
DESCUIDAR-SE DO TRABALHO. QUAL O TEMPO APROPRIADO PARA AS ORAÇÕES? EM PRIMEIRO
LUGAR É DEVER TRABALHAR?
Resposta
7.
Como
Nosso Senhor Jesus Cristo diz que o operário merece o seu
sustento (Mt 10,10), e não simplesmente sem discriminação, qualquer um,
e o Apóstolo ordena trabalhar e executar com as suas próprias mãos o que é bom
(Ef 4,28), para se ter com que socorrer aos necessitados (ibid.), evidencia-se
que devemos trabalhar com diligência.
8.
A
piedade não seja considerada pretexto de preguiça, nem fuga do esforço, mas
ocasião de luta e de labor maior, como de paciência nas tribulações, de maneira
que possamos dizer: Trabalhos e fadigas, repetidas vigílias, com fome e
sede (2Cor 11,27).
9.
Este
modo de viver é proveitoso não só para subjugar o corpo, mas ainda por causa da
caridade para com o próximo, a fim de que, por nosso intermédio, Deus forneça o
bastante aos irmãos mais fracos, segundo o modelo apresentado nos Atos pelo
Apóstolo que diz: Em tudo vos tenho mostrado que, assim trabalhando,
convém acudir aos fracos (At 20,35).
10.
E
de novo: Para ter com que socorrer aos necessitados (Ef 4,28).
Assim seremos dignos de ouvir: Vinde, benditos de meu Pai, possuí o reino
que vos está preparado desde o princípio do mundo. Porque tive fome e destes de comer;
tive sede, e destes de beber (Mt 25,34.35).
11.
Qual
a necessidade de dizer que constitui grande mal a ociosidade, quando o Apóstolo
claramente preceitua: Quem não quiser trabalhar, não tem direito de comer
(2Ts 3,10)?
12.
Como
é indispensável para todos o alimento cotidiano, assim também é necessário o
trabalho, à medida das forças. Não foi em vão que Salomão escreveu em elogio: Não
comeu o pão da ociosidade (Pr 31,27).
13.
E
ainda o Apóstolo, falando de si mesmo: Não temos comido de graça o pão de
ninguém, mas, com trabalho e fadiga, labutamos noite e dia (2Ts 3,8),
embora pudesse, porque pregava o Evangelho, viver do Evangelho. Também o Senhor
associou a preguiça a malícia, dizendo: Servo mau e
preguiçoso (Mt 25,26).
14.
E
o sábio Salomão não só louva o trabalhador pelas causas já citadas, mas
igualmente censura o preguiçoso, comparando-o a animais minúsculos, ao dizer: Vai
o preguiçoso ter com a formiga (Pr 6,6). Por isso é de temer que no dia
do juízo nos seja isto lançado em rosto, pois quem nos deu forças para o
trabalho, exigirá obras proporcionadas a elas.
15.
Porque:
Quanto mais se confiar a alguém, dele mais se há de exigir (Lc
12,48). Desde que alguns, sob o pretexto de orações e salmodia, furtam-se ao
trabalho, convém saber que há um tempo próprio para cada coisa, segundo o
Eclesiastes que diz: Para tudo há um tempo (Ecl 3,1).
16.
Mas,
para a oração e a salmodia, como para muitas outras ocupações, serve qualquer
tempo, porque enquanto as mãos trabalham, talvez seja possível, ou ao menos
proveitoso para a edificação da fé, com a língua, ou ao menos de coração,
louvar a Deus com salmos, hinos e cânticos espirituais (Cl 3,16),
como está escrito, entregando-nos assim à oração no meio do trabalho.
17.
Demos
graças àquele que deu forças às mãos para o trabalho e inteligência para
adquirirmos a ciência, fornecendo-nos ainda a matéria, tanto a dos
instrumentos, quanto a matéria-prima para as artes que cultivamos. Supliquemos
que as obras de nossas mãos tenham a finalidade de agradar a Deus.
18.
Afastamos
a divagação do espírito quando, em cada ação, impetramos de Deus o bom
andamento da obra, agradecemos àquele que nos concede a energia para a ação e
conservamos o propósito de lhe agradar, conforme foi dito acima.
19.
Porque,
de outro modo, como se conciliarão as duas palavras do Apóstolo: Orai sem
cessar (lTs 5,17), e: Labutando noite e dia (2Ts 3,8)? Se também a
lei determina se dê graças em todo o tempo e a natureza e a razão demonstram a
necessidade desta ação de graças em nossa vida, nem por isso podemos omitir as
horas determinadas, que escolhemos por necessidade, para a oração nas comunidades
dos irmãos, pois cada uma constitui uma espécie de memória dos bens recebidos
de Deus.
20. A hora matutina,
para dedicarmos a Deus os primeiros movimentos da alma e da mente e nada
cuidarmos antes de nos alegrarmos com o pensamento de Deus, como está escrito:
Lembrei-me de Deus e senti-me cheio de gozo (SI 76,4). Que o corpo não se
mova para o trabalho antes de fazer o que foi dito: É a vós que eu invoco,
Senhor, desde a manhã; escutai-me. Porque, desde o raiar do dia, a vós
apresento minhas súplicas e espero (SI 5,4.5).
21.
De
novo, à hora terça, levantem-se para a oração, convoque-se a comunidade, mesmo
se acontecer que alguns estejam ocupados em diversos trabalhos. Lembrados do
dom do Espírito, concedido aos apóstolos na hora terceira, unânimes, prostrem-se
todos, para se tornarem dignos também de receber a santificação. Peçam que ele
os dirija no caminho e lhes ensine o que é proveitoso.
22.
Façam
como aquele que disse: ò meu Deus, criai em mim um coração puro. E
renovai-me o espírito de firmeza. De vossa presença não me rejeiteis. E nem me
priveis de vosso santo espírito. Restituí-me a alegria da salvação. E
sustentai-me com uma vontade generosa (SI 50,12.13). E alhures: Que o
vosso espírito de bondade me conduza pelo caminho reto (SI 142, 10). E
assim, voltem ao trabalho.
23.
Se
alguns se afastarem para mais longe, por causa de trabalho, ou da natureza do
lugar, cumpram obrigatoriamente ali, sem hesitações, tudo o que foi
estabelecido em comum, porque: Onde dois ou três estão reunidos em meu nome,
aí estou eu em meio deles (Mt 18,20).
24. À hora sexta,
julgamos necessária a oração, à imitação dos santos, que dizem: Pela tarde,
de manhã e ao meio-dia, narrarei e anunciarei. E ele ouvirá minha voz (SI
54,18).
25.
E
para nos livrarmos do ataque e do demônio meridiano (SI 90,6), também se diga o
salmo 90. À hora nona é dever rezar, como nos ensinaram os apóstolos nos Atos,
onde se narra que Pedro e João iam subindo ao templo para rezar à hora nona (At
3,1).
26.
Já
completo o dia, damos graças pelo que nos foi concedido neste dia, ou pelo bem
que fizemos, e também confessamos nossas omissões, a saber, falta voluntária ou
involuntária, ou qualquer pecado oculto, por palavras, obras, ou só no coração,
aplacando a Deus por tudo com a oração.
27.
É
de grande utilidade examinar o passado, para não recairmos nas mesmas faltas.
Por isso foi dito: Refleti em vossos corações, quando estiverdes em vossos
leitos e calai (SI 4,5).
28.
Ainda,
ao cair da noite, vem a prece para que o repouso seja inofensivo e livre de
pesadelos.
29.
Recite-se
nessa hora, obrigatoriamente, o salmo 90. Paulo e Silas nos transmitiram ser
preciso orar no meio da noite, conforme os Atos declaram: Pela meia-noite,
Paulo e Silas rezavam e cantavam um hino a Deus (At 16,25). E o salmista
diz: Em meio à noite levanto-me para vos louvar pelos vossos decretos cheios
de justiça (SI 118,62).
30.
E
de novo, antecipando-nos à aurora, levantamo-nos para a oração para não sermos
surpreendidos pelo dia ainda adormecidos no leito, segundo a palavra: Meus
olhos se antecipam à vigília da noite, para meditarem em vossa palavra (ibid.
148).
31.
Nenhuma
dessas horas seja esquecida por aqueles que se decidiram a viver com fervor
para a glória de Deus e de seu Cristo. Julgo ser de vantagem a diversidade e a
variedade nas preces e na salmodia, nas horas estabelecidas, e nestas últimas,
porque pela monotonia muitas vezes a alma se entorpece e se distrai; a mudança
e a variedade da salmodia, como também o sentido de cada hora, renovam o desejo
e a atenção se refaz.
QUESTÃO 38
A EXPLICAÇÃO NOS MOSTROU SUFICIENTEMENTE QUE A ORAÇÃO
NÃO PODE SER OMITIDA E QUE O TRABALHO É INDISPENSÁVEL. SERIA LÓGICO APRENDERMOS
AGORA QUAIS OS OFÍCIOS ADEQUADOS A NOSSA PROFISSÃO
Resposta
32.
Não
é fácil especificar os ofícios, porque devem ser adaptados à natureza do lugar
e às peculiaridades mercantis de cada região.
33.
Em
geral, podem ser designados à escolha os que salvaguardam nossa vida pacífica e
tranquila, sem muitas dificuldades de aquisição de matéria-prima, nem muitas
preocupações com a venda dos produtos e os que não acarretam aglomerações
inconvenientes ou prejudiciais de homens ou mulheres. Mas precisamos considerar
que em tudo nos é proposto um fim peculiar: as coisas simples e baratas.
34.
Evitemos
servir à cupidez desarrazoada e danosa dos homens, produzindo o que eles mais
ambicionam. À arte têxtil peçamos o que entrou na vida corrente e não o que foi
excogitado por homens desregrados para captar os jovens e apanhá-los no laço.
35.
De
modo semelhante procuremos a fabricação de sapatos, a fim de obtermos desta
arte o necessário. Quanto à arquitetura, à carpintaria e à ferraria, à
agricultura são por si indispensáveis e muito úteis; portanto, não há motivo
especial de serem rejeitadas.
36.
Se,
contudo, nos cercam de agitação ou quebram a unidade da vida comum dos irmãos,
então, forçosamente, evitemo-las.
37.
Demos
preferência aos ofícios que mantêm nossa vida sem distrações, continuamente
fiel ao Senhor, e que não reclamam os que perseveram nos exercícios de piedade,
no tempo da salmodia, da oração ou de outras iniciativas louváveis.
38.
Portanto,
se neles nada há que prejudique o essencial de nossa vida, sejam preferidos
entre muitos especialmente a agricultura que produz por si o necessário e livra
os agricultores de muitas saídas e de correrem para cá e para lá; contanto,
como o dissemos, que não nos envolva, da parte dos vizinhos, ou dos que moram
conosco, em tumultos ou confusão.
COMO VENDER OS PRODUTOS E COMO VIAJAR
Resposta
39. Faz-se mister não colocar os produtos muito longe, nem sair
para vender. Seria mais conveniente, mais útil ficar no próprio lugar, tanto
para a edificação mútua como para a perfeita conservação do alimento cotidiano.
40. Por isto, é preferível abaixar um pouco o preço a sair de
casa por causa de pequenos lucros.
41. Se a experiência mostrar ser isto impossível, escolham-se,
para que a viagem seja de proveito, lugares e cidades de homens piedosos; e
vários irmãos juntos, cada qual carregando o próprio produto, partam para o
mercado designado.
42. Partam em grupo a fim de perfazerem o caminho com salmos e
orações para edificação mútua.
43. Quando chegarem ao termo, procurem obter uma só hospedagem,
tanto para a preservação de todos, quanto para não lhes escapar hora alguma de
oração, diurna ou noturna.
44. Deste modo sofrerão menos do que se estivessem sós, ao contato
com homens intratáveis e avaros. Mesmo os mais violentos não querem ter muitas
testemunhas de sua injustiça.
QUESTÃO
40
DAS
TRANSAÇÕES FEITAS COM ASSEMBLÉIAS RELIGIOSAS
Resposta
45. Não nos convêm nem mesmo as transações feitas nos lugares
onde se veneram os mártires, como no-lo declara a Palavra.
46. Não compareçam os cristãos nos locais onde são venerados os
mártires ou nas suas adjacências, a não ser para a oração e a fim de que, pela
comemoração da piedosa firmeza dos santos até à morte, incitem-se a idêntico
zelo.
47. Lembrem-se da terrível ira do Senhor que, embora
mostrando-se sempre e em toda a parte manso e humilde de coração, conforme está
escrito (Mt 11,29), tomou energicamente do flagelo só contra aqueles que
vendiam e compravam no templo (Jo 2,15), porque transformavam pela mercancia a
casa de oração em covil de ladrões.
48. Alguns perderam o costume em vigor entre os santos, fazendo
desse tempo e lugar uma praça pública e um empório, em vez de se entregarem à
oração uns pelos outros, à adoração de Deus com os demais, às lágrimas em comum
diante dele, à propiciação pelos pecados, à eucaristia por seus benefícios, à edificação
com palavras de exortação. (Conforme sabemos de conhecimento próprio, isto era
praticado).
49.
Nem por isso seria consequente que os
seguíssemos e confirmássemos seus absurdos por nossa participação; mas imitemos
as assembleias reunidas em torno de Nosso Senhor Jesus Cristo e descritas nos Evangelhos.
50.
Pratiquemos os preceitos do Apóstolo,
bem conformes a este modelo, ao escrever: Quando vos reunis, cada um de vós tem um cântico, uma
revelação, um discurso em línguas, uma interpretação: que tudo se faça de modo
a edificar (ICor 14,26).
O
que você destaca no texto?
Como
serve para sua espiritualidade?
Nenhum comentário:
Postar um comentário