segunda-feira, 28 de junho de 2021

172 - A Vida de Santo Antão (Parte IV – 1,2)

 



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172

Atanásio de Alexandria (285-373)

A Vida de Santo Antão (Parte IV – 1,2)

 

Parte IV

 

I - Discernimento dos Espíritos

1.      Agora, pois, quando se lhes apareçam de noite e queiram contar-lhes o futuro ou lhes digam: 'Somos os anjos', ignorem-nos porque estão mentindo.

2.      Se louvam sua prática da vida ascética ou os chamam santos, não os ouçam nem tenham nada que ver com eles.

3.      Façam antes o sinal da cruz sobre si mesmos, sobre sua morada e oração, e vê-los-ão desaparecer. São covardes e têm terror mortal do sinal da cruz de Nosso Senhor, desde que na cruz o Senhor os despojou e escarmentou-os.

4.      Se insistem, porém, com maior cinismo, bailando em torno e mudando de aparência, não os temam nem se acovardem nem lhes prestem atenção como se fossem bons; é totalmente possível distinguir entre o bem e o mal com a garantia de Deus.

5.      Uma visão dos santos não é turbulenta, 'pois não contenderá nem gritará' e ninguém ouvirá sua voz nas ruas (Mt 12,19; cf Is 42,2). Essa visão chega tão tranquila e suave, que logo haverá alegria, gozo e valor na alma. Com eles está nosso Senhor, que é nossa alegria, e o poder de Deus Pai. E os pensamentos da alma permanecem desembaraçados e sem agitação, de modo que em sua própria brilhante transparência é possível contemplar a aparição.

6.      Um anelo das coisas divinas e da vida futura se apossa da alma, e seu desejo é unir-se totalmente a eles e com eles poder partir. Se alguns, porém, por ser humanos, têm medo ante a visão dos bons, então os que aparecem expulsam o temor pelo amor, como o fez Gabriel com Zacarias (Lc 1,13), e o anjo que apareceu às mulheres no santo sepulcro (Mt 28,5) e o anjo que apareceu aos pastores. 'Não temam' (Lc 2,10). Temor, nestes casos, não é covardia da alma, antes, porém, consciência da presença de seres superiores. Tal é, pois, a visão dos santos.

7.      Por outro lado, o ataque e a aparição dos maus estão cheios de confusão, acompanhada de ruídos, bramidos e alaridos; bem poderia ser o tumulto produzido por homens grosseiros ou salteadores.

8.      Isto no começo ocasiona terror na alma, distúrbios e confusão de pensamentos, desalento, ódio da vida ascética, tédio, tristeza, lembrança dos parentes, medo da morte; e logo vem o desejo do mal, o desprezo da virtude e completa mudança do caráter.

9.      Por isso, se vocês têm uma visão e sentem medo, mas se o medo se afasta logo e em seu lugar lhes vem inefável alegria e contentamento, recuperação da força e da calma do pensamento e tudo o mais que mencionei, e valentia de coração e amor de Deus, então alegrem-se e orem; seu gozo e a tranquilidade da alma dão prova da santidade Daquele que está presente.

10.  Assim, Abraão, vendo o Senhor, alegrou-se (Jo 8.56), e João, ouvindo a voz de Maria, a mãe de Deus, saltou de alegria (Lc 1.41).

11.  Se, porém, visões os surpreendem e confundem e há abertamente tumulto e aparições terrenas e ameaças de morte e tudo o mais que mencionei, saibam então que a visita é do mau.

12.  Tenham, também este outro sinal: se a alma prossegue com medo, o inimigo está presente.

13.  Os demônios não tiram o medo que produzem, como o fez o grande arcanjo Gabriel com Maria e Zacarias, e o que apareceu às mulheres no sepulcro.

14.  Os demônios, ao contrário, quando veem que os homens têm medo, aumentam suas fantasmagorias para aterrorizá-los ainda mais, depois descem e os enganam dizendo-lhes: 'Prostrem-se e adorem-nos' (cf Mt 4.9).

15.  Assim enganaram aos gregos, pois entre eles os havia, tomados falsamente por deuses.

16.  Nosso Senhor, porém, não permitiu que fôssemos enganados pelo demônio, quando uma vez repeliu-o quando intentava utilizar suas alucinações com Ele: 'Aparta-se, Satanás, porque está escrito: Adorarás ao Senhor, teu Deus, e só a Ele servirás' (Mt 4,10).

17.  Por isso, desprezemos sempre mais o autor do mal, pois o que nosso Senhor disse foi por nós: quando os demônios ouvem tais palavras, são expulsos pelo Senhor que com essa palavras os repreendeu.

18.  Não devemos jactar-nos de expulsar os demônios nem vangloriar-nos por curas realizadas; não devemos honrar só ao que expulsa os demônios e desprezar o que não o faz.

19.  Que cada um observe atentamente a vida ascética do outro, e então imite-a e emule, ou a corrija; quanto a fazer milagres, não nos compete. Isto está reservado ao Salvador, que, por outro lado, disse a seus discípulos: 'Alegrem-se, não porque os demônios se lhes submetem, mas porque têm seus nomes escritos no céu' (Lc 10,20).

20.  E o fato de estarem nossos nomes escritos no céu é testemunho para nossa vida de virtude, mas quanto a expulsar demônios, é dom do Salvador.

21.  Por isso, aos que se gloriavam não de sua virtude, mas de seus milagres e diziam: 'Senhor, não expulsamos demônios em teu nome e não operamos milagres, também em teu nome?' (Mt 7.22). Ele respondeu: 'Em verdade lhes digo que não os conheço' (Mt 7.23), pois o Senhor não conhece o caminho dos ímpios (cf Sl 1.6).

22.  Em resumo, deve-se orar, como já disse, pelo dom do discernimento dos espíritos, a fim de que, como está escrito, não creiamos em todo espírito (cf 1 Jo 4.1).

 

II - Antão narra suas experiências com os Demônios

23.  Em realidade, queria agora deter-me e não dizer nada mais que viesse de mim mesmo, já que basta o que foi dito.

24.  Mas para que vocês não pensem que simplesmente digo estas coisas por falar, mas para que se convençam de que o faço por verdadeira experiência, por isso quero contar-lhes o que vi quanto às práticas dos demônios.

25.  Talvez me chamem de tonto, mas o Senhor que está ouvindo o sabe que minha consciência é limpa e que não é por mim mesmo mas para vocês e para alentá-los que digo tudo isto.

26.  Quantas vezes me chamaram bendito, enquanto eu os maldizia em nome do Senhor! Quantas vezes faziam predições acerca da água do Rio! E eu lhes dizia: 'Que têm vocês a ver com isto?

27.  'Uma vez chegaram com ameaças e me rodearam como soldados armados até os dentes. Noutra ocasião encheram a casa com cavalos e bestas e répteis, mas eu cantei o salmo: 'Uns confiam nos carros, outros em sua cavalaria, mas nós confiamos no nome do Senhor nosso Deus' (Sl 19,8), e a esta oração foram rechaçados pelo Senhor.

28.  Outra vez, no escuro, chegam com uma luz fátua dizendo: 'Vimos trazer-te luz, Antão'. Fechei, porém os olhos,  orei, e de um golpe apagou-se a luz dos ímpios.

29.  Poucos meses depois chegaram cantando salmos e citando as Escrituras. Mas 'eu fui como um surdo que não ouve' (Sl 37,14).

30.  Uma vez sacudiram a cela de um lado a outro, mas eu orei, permanecendo inalterável em minha mente. Voltaram então e fizeram um ruído contínuo, dando golpes, sibilando e fazendo cabriolas.

31.  Pus-me então a orar e cantar salmos, e então começaram a gritar e lamentar-se como se estivessem extenuados, e eu louvei ao Senhor que reduziu a nada seu descaramento e insensatez e lhes deu uma lição.

32.  Uma vez apareceu-me em visão um demônio realmente enorme, que teve a desfaçatez de dizer: 'Sou o Poder de Deus' e: 'Sou a Providência. Que favor desejas que te faça?' Então soprei-lhe meu bafo, invocando o nome de Cristo e fiz empenho de golpeá-lo. Parece que tive êxito, porque logo, grande como era, desapareceu, e todos seus companheiros com ele, ao nome de Cristo.

33.  Outra vez, estava eu jejuando e chegou-se a mim o velhaco trazendo pães ilusórios. Pôs-se a dar-me conselhos: 'Come e deixa-te de privações. Também tu és homem e estás a ponto de adoecer.' Mas eu, percebendo seu embuste, levantei-me para orar e ele não aguentou: desapareceu como fumaça através da porta.

34.  Quantas vezes me mostrou no deserto uma visão de ouro que eu podia pegar e levar! Opus-me cantando um salmo e se dissolveu.

35.  Bateu-me muitas vezes e eu dizia: 'Nada poderá separar-me do amor de Cristo' (cf Rm 8.35), e eles então se golpeavam uns aos outros.

36.  Não fui eu, porém, quem deteve e paralisou seus esforços, mas o Senhor que disse: 'Vi Satanás caindo do céu como um relâmpago' (Lc 10.18).

37.  Filhinhos meus, lembrem-se do que disse o Apóstolo: 'Apliquei-me isto a mim mesmo' (1 Cor 4.6), e aprenderão a não descoroçoar-se em sua vida ascética e a não temer as ilusões do demônio e de seus companheiros.

38.  Já que me fiz louco entrando em todas estas coisas, escutem também o que segue, para que possa servir-lhes para sua segurança; creiam-me, não minto.

39.  Uma vez ouvi um golpe na porta de minha cela, saí e vi uma figura enormemente alta. Quando lhe perguntei: 'Quem és?', respondeu-me: 'Sou Satanás'. 'Que estás fazendo aqui?' Ele respondeu: 'Que falta encontram em mim os monges e os demais cristãos, sem razão alguma? Por que me expulsam a cada momento?'

40.  'Bem, por que os molestas?, disse-lhe. Ele contestou: 'Não sou eu que os molesto, mas seus embaraços têm origem neles mesmos, pois eu me enfraqueci. Não leste por acaso: O inimigo foi desarmado, arrasaste suas cidades (Sl 9.7)? Agora não tenho nem lugar nem armas nem cidade. Em toda parte há cristãos e até o deserto está cheio de monges. Que se dediquem ao que lhes é próprio e não me maldigam sem causa.

41.  Maravilhei-me então ante a graça do Senhor e lhe disse: 'Ainda que sejas sempre mentiroso e nunca fales a verdade, no entanto desta vez a disseste, por mais que te desagrade fazê-lo. Vês, Cristo, com sua vinda te fez impotente, derrubou-te e te despojou'. Ele, ouvindo o nome do Salvador e incapaz de suportar o calor que isto lhe causava, desvaneceu-se.

42.  Por isso, se até o próprio demônio confessa que não tem poder, deveríamos desprezá-lo totalmente.

43.  O mau e seus cães têm, é verdade, todo um provimento de velhacaria; nós, porém, conhecendo sua impotência, podemos desprezá-los.

44.  Não nos entreguemos, pois, nem nos desalentos, nem deixemos que haja covardia em nossa alma nem nos causemos medo a nós próprio, pensando: 'Oxalá não venha o demônio e me faça cair! Queira Deus que não me leve para cima ou para baixo, ou apareça de repente e me tire dos eixos!

45.  Não deveríamos absolutamente ter semelhantes pensamentos nem afligir-nos como se fôssemos perecer. Antes tenhamos coragem e alegremo-nos sempre como homens que estão sendo salvos.

46.  Pensemos que o Senhor está conosco, Ele que afugentou os maus espíritos e lhes tirou o poder.

47.  Meditemos sempre sobre isto e recordemos que enquanto o Senhor estiver conosco, nossos inimigos não nos causarão dano. Pois quando vêm, atuam como nos encontram, e, no estado de alma em que nos encontrem, apresentam suas ilusões.

48.  Se nos veem cheios de medo, de pânico, imediatamente tomam posse como bandidos que encontram a praça desguarnecida; tudo o que pensemos de nós, aproveitam-no com redobrado interesse.

49.  Se nos veem temerosos e acovardados, aumentam nosso medo o mais que possam em forma de imaginações e ameaças, e assim a pobre alma é atormentada para o futuro.

50.  Se nos encontram, porém, alegrando-nos no Senhor; meditando nos bens futuros e contemplando as coisas que são do Senhor; considerando que tudo isto está em Suas mãos e que o demônio não tem poder sobre um cristão, que, de fato, não tem poder sobre ninguém, absolutamente, então, vendo a alma salvaguardada com tais pensamentos, envergonham-se e voltam atrás.

51.  Assim, quando o inimigo viu Jó fortificado, retirou-se dele, enquanto que encontrando Judas desprovido de toda defesa, aprisionou-o.

52.  Por isso, se quisermos desprezar o inimigo, mantenhamos sempre nosso pensamento nas coisas do Senhor e que nossa alma goze com a esperança (cf Rm 12.12).

53.  Veremos então como os enganos do demônio se desvanecem como fumo e vê-lo-emos fugir em lugar de perseguir-nos. Eles são, como disse, abjetos covardes, sempre receosos do fogo preparado para eles (Mt 25.41).

54.  Observem também isto quanto à intrepidez que devem ter na presença deles. Cada vez que venha uma aparição não se precipitem imediatamente cheios de medo covarde, mas seja como for, perguntem primeiro com coração resoluto: 'Quem és e donde vens?' Se é uma visão boa, há de tranquiliza-los e mudar o medo em alegria. No entanto, se tem que ver com o demônio, vai desvanecer-se logo vendo o ânimo decidido de vocês, pois a simples pergunta: 'quem és e donde vens? 'é sinal de tranquilidade.

55.  Assim o aprendeu o filho de Nun (Js 5.13s) e o inimigo se livrou de ser descoberto quando Daniel o interrogou (citação do apócrifo Dan 13,51-59).

 

O que você destaca no texto e como ele serve para sua espiritualidade?

O que você deseja destacar na fala do seu irmão/irmã?

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