O que é uma Poustínia?
Catherine de Hueck Doherty explica o que é uma Poustínia
Este assunto de
poustinia é tão importante para mim, que não me posso furtar ao desejo de
partilhálo com o leitor em tantos pormenores. Por isso passo a apresentar uma
ou duas dessas cartas escritas a membros ausentes de nossa comunidade. As
cartas fazem parte do desenvolvimento histórico dos poustinias em Madonna House
e testificam também que Deus, aos poucos, foi vestindo de carne e sangue aquilo
que eu guardava na mente e no coração como meras lembranças e saudades do meu
país. Eis uma das cartas:
“Um poustinia deve ser quase rude na sua pobreza e simplicidade. Deve conter uma mesa e uma cadeira. Haja sempre uma Bíblia sobre a mesa, juntamente com papel e lápis. O leito seja um catre com simples tábuas em vez de colchão; mas não faltem dois cobertores ou colcha e um travesseiro, se for necessário. Pode dar-se o caso em que não haja leito. Num dos cantos do quarto ponha-se uma bacia e um jarro para higiene pessoal. Eis tudo o que deve ser oferecido em questão de comodidade para dormir. Haverá água para beber e um pão dividido em três pedaços: um para a manhã, outro para o almoço e outro para o jantar. Se alguém não estiver acostumado a comer seu pão apenas com água, pode haver utensílios necessários para fazer chá ou café. Uma simples cruz de madeira, sem o Cristo, de dois metros de altura por um de largura, deve estar pregada na parede, em lugar bem destacado... ...A cruz sem o Cristo é para lembrar o que ela é para nós, pois os que amam apaixonadamente Jesus Cristo desejam ser crucificados com ele a fim de chegarem às alegrias da Ressurreição. Isto é suficiente para definir o aspecto externo do poustinia. Mas, evidentemente, há outros aspectos mais importantes. O deserto é o símbolo da austeridade, pobreza e simplicidade. É Deus quem leva a alma ao deserto e ela não pode permanecer aí a não ser que seja alimentada por Deus. Eis porque aí se faz abstenção do alimento material pelo jejum e, de certo modo, até de alimento espiritual que possa vir 71 de outros livros que não a Bíblia. Nela está Deus como o alimento fundamental. Gostaria de saber quais as reações de todos vocês a respeito destes dois aspectos do poustinia. É provável que tenham manifestado boa dose de curiosidade e, talvez, se tenham sentido envolvidos emocionalmente quando estiveram naquela casa de campo para lavá-la e pintá-la. Esta reação emocional é compreensível por tratar-se de uma ideia nova e realmente excitante, não só do ponto de vista emocional como também espiritual. Permitam-me, porém, que os previna: vocês poderão achar o deserto um lugar terrível, como aconteceu com Cristo. Eu sei porque nele estive já muitas e muitas vezes. Não quer isto dizer que se deva ter medo do poustinia; o temor de que falo é o que pode surgir ocasionalmente e morar com vocês dentro da solidão. É o medo que todo homem experimenta em sua alma, fruto da presença de Satanás que, mais ainda do que qualquer um de nós, tem um verdadeiro pavor do poustinia! O medo é um tipo de tentação. Não haja dúvida que, no principio, o simples fato de estar num poustinia será uma novidade muito excitante. Mas quando se começa a repetir a experiência, digamos uma vez por mês, então a coisa muda e um problema sério começa a surgir dentro de vocês; um sofrimento que eu chamaria de "dor de parto espiritual". Haverá, por vezes, um tremendo tédio, secura interior e o tempo se arrastará numa lentidão irritante. Esta é uma das razões pela qual não lhes será permitido passar mais de 24 horas no poustinia, numa primeira experiência. Talvez uma licença especial do padre espiritual possa prolongar esse tempo a 36 e até 48 horas. É indispensável que o "deserto" seja um lugar de simplicidade total, como já deixei expresso. Portanto, nada de cortinas, livros, quadros etc. A única exceção, quanto a quadros, é a imagem de Nossa Senhora. Ninguém se iluda tampouco com a ideia de que o poustinia deva estar sempre no campo: uma cabana feita de troncos, como as temos aqui em Madonna House. Seria uma concepção falsa do poustinia, do "deserto" que pode estar em qualquer parte uma vez que, fundamentalmente, ele está mais dentro do que fora de nós. Como foi dito atrás, até um quarto vazio, na própria casa em que se mora, pode preencher essa finalidade ou, quem sabe, até um armário ou guarda-roupa bastante grande! Sem dúvida alguma, o poustinia vai desnudar você. O Senhor do Deserto fará o mesmo. Como ele, você também será tentado; mas, no fim, uma imensa serenidade transbordará de sua alma, a paz como resultado da ordem interior vinda de Deus. Lembre-se de que você irá ao deserto pelas seguintes razões:
- para jejuar, para viver em silêncio,
- para orar, de modo que você possa morrer para si mesmo mais depressa, podendo assim comunicar Deus ao mundo também mais rapidamente. Porque o mundo tem fome de Deus!
- para oferecer reparação, tanto pelos seus pecados como pelos pecados dos outros. para orar pela humanidade, pela paz, pelas missões, pela união dos cristãos, mesmo dentro da própria Igreja...
- para tornar-se santo, isto é: amante de Jesus Cristo, em verdade, e pelo testemunho das obras.
- para imitar Jesus Cristo,
- para salvar sua alma e a dos seus irmãos,
- para aprender mais rapidamente a entrega total a Deus, porque já o fizemos esperar demais!
Título original:
Poustinia: Christian Spirituality of the East for Western Man Catherine de
Hueck Doherty (antes de casar-se: Kolyschkine) Ave Maria Press, Notre Dame,
Indiana, USA 1975 - Deserto Vivo:
Poustínia Edições Loyola, São Paulo, SP, Brasil 1989 Tradução: Héber Salvador
de Lima, S.J. PP 69-73
Nenhum comentário:
Postar um comentário