sexta-feira, 26 de dezembro de 2025

O Uso da Vela na Espiritualidade Protestante

 

altar da Igreja Luterana com vela. 


O Uso da Vela na Espiritualidade Protestante

Edson Cortasio Sardinha

 

1. A luz na espiritualidade bíblica: fundamento comum

            Desde o início da revelação bíblica, a luz aparece como um dos símbolos mais profundos da ação de Deus:

            “Disse Deus: Haja luz; e houve luz.” (Gn 1.3)

            A luz precede todas as outras obras criadoras e torna-se sinal da presença ordenadora de Deus, da vida, da verdade e da salvação. Tanto no judaísmo quanto no cristianismo histórico, a vela não é objeto mágico, mas sinal visível de uma realidade invisível: Deus que se revela, guia e habita no meio do seu povo.

 

2. O uso das velas na prática judaica

           

2.1 A Menorá: luz permanente diante do Senhor

            No culto do Tabernáculo e depois do Templo, Deus ordena a confecção da Menorá, o candelabro de sete lâmpadas:

            “Farás também um candelabro de ouro puro… e as suas lâmpadas se acenderão para alumiar diante dele.” (Êx 25.31,37)

 

A Menorá simbolizava:

·         A  presença contínua de Deus

·         A Torá como luz

·         A vida que procede do Senhor

 

            O profeta Zacarias interpreta a Menorá como sinal da ação do Espírito de Deus:  “Não por força nem por poder, mas pelo meu Espírito, diz o Senhor dos Exércitos.” (Zc 4.6)

 

2.2 As velas do Shabat

            No lar judaico, o acendimento das velas do Shabat marca a entrada do tempo santo:

 

·         Luz como separação do sagrado

·         Luz como paz no lar (shalom bayit)

·         Luz como memória da criação e da libertação

 

 “O mandamento é lâmpada, e a instrução é luz.” (Pv 6.23)

 

2.3 Hanukkah: a luz que vence as trevas

            Na festa de Hanukkah, as velas recordam a fidelidade de Deus em tempos de opressão, proclamando que a luz do Senhor não pode ser apagada:

            “O Senhor é a minha luz e a minha salvação; de quem terei medo?” (Sl 27.1)

 

3. Cristo, a luz definitiva: cumprimento neotestamentário

 

            O Novo Testamento não abandona o símbolo da luz; ao contrário, o cumpre em Cristo:  “Eu sou a luz do mundo; quem me segue não andará nas trevas, mas terá a luz da vida.” (Jo 8.12)

                        A luz deixa de estar apenas no candelabro e passa a estar na Pessoa do Filho. O prólogo de João ecoa Gênesis: “Nele estava a vida, e a vida era a luz dos homens.” (Jo 1.4)

 

4. O uso de velas nas igrejas protestantes tradicionais

 

4.1 Reforma e continuidade simbólica

            A Reforma Protestante não rejeitou os símbolos, mas rejeitou seu uso supersticioso ou meritório. Lutero, Calvino e Wesley reconheceram que sinais visíveis podem ensinar, recordar e apontar para Cristo, desde que não substituam a fé.

 

“Tudo seja feito para edificação.” (1Co 14.26)

 

            Assim, em muitas igrejas luteranas, anglicanas, metodistas e reformadas históricas, as velas permaneceram:

 

·         No culto dominical

·         No Advento e Natal

·         Na Páscoa

·         Em vigílias e celebrações solenes

 

4.2 Significados teológicos no protestantismo

            Nas igrejas protestantes tradicionais, a vela simboliza:

 

1. Cristo, a luz do mundo

    “O povo que andava em trevas viu grande luz.” (Is 9.2; cf. Mt 4.16)

 

2. A Palavra de Deus

    “Lâmpada para os meus pés é a tua palavra, e luz para o meu caminho.” (Sl 119.105)

 

3. A presença do Espírito Santo

    “Porque Deus… brilhou em nossos corações.” (2Co 4.6)

 

4. A oração e a vigilância

   “Vigiai, pois, porque não sabeis o dia nem a hora.” (Mt 25.13)

 

            A vela não “leva” a oração, mas **recorda que oramos diante de Deus**, que é luz inacessível (1Tm 6.16).

 

 5. A comunidade como portadora da luz

            Jesus transfere o símbolo da luz para o seu povo: “Vós sois a luz do mundo.” (Mt 5.14)

 

            Aqui ocorre uma profunda continuidade com o judaísmo: assim como Israel foi chamado a ser luz para as nações (Is 42.6), a Igreja é chamada a refletir a luz de Cristo.

 

A vela acesa no culto aponta para essa vocação:

·         Não esconder a fé

·         Viver de modo visível

·         Testemunhar no mundo

 

6. Símbolo, não sacralização do objeto

            Tanto no judaísmo quanto no protestantismo fiel às Escrituras, a vela:

 

·         Não é adorada

·         Não substitui a Palavra

·         Não produz graça por si mesma

 

Ela é sinal pedagógico e espiritual, subordinado à revelação: “Deus é luz, e não há nele treva nenhuma.” (1Jo 1.5)

 

Conclusão

            O uso das velas na prática judaica e nas igrejas protestantes tradicionais revela uma continuidade simbólica bíblica: a luz como manifestação da presença de Deus, da verdade revelada e da esperança escatológica.

            No judaísmo, a luz aponta para a fidelidade do Senhor à Aliança.

No cristianismo protestante, a luz encontra seu centro em **Cristo, a Luz verdadeira**, e se torna chamado ético e missionário para a Igreja.

            “Levantai-vos, resplandecei, porque vem a tua luz.” (Is 60.1)

 

Bibliografia

Obras de tradição judaica e estudos judaicos

  1. BÍBLIA HEBRAICA. Tanakh: a Bíblia Hebraica. Tradução e notas da Editora Sêfer. São Paulo: Sêfer, 2016.
  2. GREENBERG, Moshe. Compreendendo o Êxodo. São Paulo: Sêfer, 2001.
  3. HESCHEL, Abraham Joshua. O sábado: seu significado para o homem moderno. São Paulo: Perspectiva, 2005.
  4. SACKS, Jonathan. A dignidade da diferença. São Paulo: Sêfer, 2010.
    (Contém reflexões sobre símbolos, luz e ética bíblica no judaísmo.)
  5. SCHLESINGER, Hugo. O simbolismo do culto judaico. São Paulo: Paulinas, 1988.

Obras cristãs (bíblicas, litúrgicas e teológicas)

  1. BRUEGGEMANN, Walter. Teologia do Antigo Testamento: testemunho, disputa e defesa. São Paulo: Paulus, 2014.
  2. CALVINO, João. As Institutas da Religião Cristã. São Paulo: Cultura Cristã, 2006.
  3. CULLMANN, Oscar. Cristologia do Novo Testamento. São Paulo: Hagnos, 2008.
  4. RATZINGER, Joseph. O espírito da liturgia. São Paulo: Paulus, 2001.
    (Obra útil para compreensão cristã do simbolismo litúrgico, inclusive a luz.)

 

terça-feira, 23 de dezembro de 2025

300 - Estudo do Ícone da Natividade do Senhor - Ícone de Theófanes de Creta - Ano 1546 - Monastério Stavronikita - Monte Athos - Grécia.

 

300

Estudo do Ícone da Natividade do Senhor

Ícone de Theófanes de Creta - 1546
Monastério Stavronikita - Monte Athos - Grécia
)

 


Introdução

            Este ícone segue o esquema tradicional da representação do nascimento de Jesus Cristo, segundo a Igreja Ortodoxa, que reúne em um mesmo ícone narrações dos Evangelhos e dos Apócrifos.

            O ícone da Natividade é o prólogo dessa grande epopéia que é a história da Salvação. E, como no Prólogo dos poemas encontramos sintetizados os pontos destacados do que se cantará, assim, no ícone da Natividade contemplamos o conjunto dos mistérios do cristianismo: a encarnação, a morte e a ressurreição.

            «Este é o acontecimento pelos quais os Patriarcas suspiravam, os Profetas predisseram e os justos desejavam ver». (S. João Crisóstomo, Sermão 34).

            «Deus se manifestou nascendo, a Palavra toma expressão, o invisível se faz visível, o inatingível se faz palpável, o intemporal entra no tempo, o Filho de Deus se torna Filho do Homem». S. Gregório Naziazeno. Sermão 38

            «Que podemos te oferecer, ó Cristo, por nos teres te mostrado sobre a terra, como homem? Cada uma de tuas criaturas traz seu testemunho de gratidão: os Anjos te oferecem o canto, os céus a estrela, os Magos seus presentes, os Pastores seu assombro, a Terra uma gruta, o deserto um presépio. Nós, porém oferecemos-te uma Mãe Virgem».

Hino de Vésperas - atribuído a Anatólio

 

A montanha

            A cena está enquadrada por uma montanha em forma piramidal que se estende por todo espaço visual do ícone. É a montanha messiânica tal como Isaias o profetizou: «O Monte do Senhor será erigido acima das montanhas e será mais alto que as colinas"... «Ele agitará a mão até o Monte da Filha de Sião, até a Colina de Jerusalém»... «Não se terá mais dano nem mal sobre meu monte santo, porque o país estará cheio do conhecimento do Senhor» (Is 2, 2; 10, 32; 11, 9)

            A Montanha do Senhor, resplandecente, vem ao mundo, transpassa e transcende cada colina e cada montanha, quer dizer, a altura dos Anjos e dos homens. A montanha é Cristo.

            Em alguns casos o monte apresenta dois cumes: as duas naturezas de Cristo, a humana e a divina.

            O centro da cena é ocupado por uma plataforma onde Maria esta ajoelhada, pela gruta do nascimento na que Deus se manifesta. Nesta Montanha, o Novo Sinai, de onde Deus se revela, Deus é quem está à entrada da gruta e a humanidade, simbolizada por Maria, pode ver face a face a Deus sem cobrir o rosto, pois Deus está sob o véu da carne em Jesus Cristo. Deus se fez homem. Deus se fez visível e acessível ao homem.

            O contrário se passou na revelação do Sinai a Moisés: este se esconde na gruta e se cobre diante de Deus, só o pode ver a sombra, já que o homem não pode resistir ao esplendor e a beleza divina.

            Por isso Deus se encarna, para fazer-se acessível ao homem, e para que este O possa ver sem medo e nem ter de cobrir seu rosto.

 

Os anjos

            Acima se fazem representar um grupo de anjos que cantam, contemplando o céu e a terra: «Glória a Deus nas alturas e na Terra paz aos homens que o Senhor ama». Representam a natureza angélica que acode o evento extraordinário; um deles destacado do grupo, encontra-se falando com um ou mais pastores.

            Este anjo anuncia ao pastor a grande alegria da salvação e o faz estendendo a mão e fazendo o sinal da encarnação trinitária: dois dedos juntos e três tocando-se pelas pontas. Seu significado é a salvação vinda de Deus Uno e Trino, através da encarnação de Cristo.

            O pastor e o Anjo estão em diálogo. Com a encarnação de Jesus Cristo, o mundo divino e o humano iniciam um diálogo que nunca mais se perderá. Deus estará no meio dos homens Ele mesmo lhes falará, e cada homem poderá falar diretamente com Deus, sem intermediários.

 

O pastor

            O Pastor, ou pastores, representam o povo «que caminha nas trevas e que viu uma grande luz» (Is 9,1). Com efeito, havia aparecido a luz sobre os habitantes da terra de sombras e de morte. Disse o anjo: «Anuncio-lhes uma grande alegria, lhes trago uma boa notícia, para todo o povo, pois nasceu para vós um Salvador, que é o Messias, o Senhor, na cidade de Davi. Isto tereis como sinal: encontrareis um menino envolto em panos e reclinado num presépio» (Os 10,12; Is 61,11).

            Aos pés do Pastor, há um menino tocando uma flauta, é antítese da música celestial e faz referência a um hino de matinas da vigília: «interrompendo o som das flautas dos pastores, a armada celestial gritava»...

 

A gruta

            No centro do ícone se abre uma gruta que mostra as entranhas da montanha. Representa o inferno e a morte sobre as quais encontra-se Cristo, e que tentam engoli-Lo. É a mesma voracidade obscura que se fala no ícone da Ressurreição.

 

A Virgem

            Fora da gruta está representada a Virgem, a Teotókos. Geralmente está recostada, algumas vezes sentada e outras, ainda, joelhada, como neste caso. Esta postura última denota a influência ocidental.

            A Virgem geralmente não olha para o menino, mas para o infinito, custodiando e refletindo em seu coração tudo aquilo que de extraordinário aconteceu com ela. (Lc 2,19) Sobre seu rosto se lê a tristeza humana de uma mãe que queria dar algo maior a seu Senhor e parece dizer:

 

«Quando Sara trouxe ao mundo um filho, este recebeu vastos territórios como homenagem; eu, ao contrário, não tenho nada: emprestaram-me esta gruta onde quiseste habitar, meu pequeno, Deus antes dos séculos» (Romano o Melode XIII,14).

 

A Mãe de Deus é colocada próxima ao coração da Montanha; «representa a luz que emana da sarça do Sinai». (S. Gregório de Nicéia, sermão 21,119)

 

            Maria estava vestida com seu manto donde as estrelas (frente a ambos os ombros) proclamam sua virgindade. Representam o sinal da santificação trabalhada nela pela Trindade para que fosse progenitora de Deus.

 

            Adora a seu Filho e Deus em atitude de serva do Senhor, disposta a fazer tudo o que o diga, assim as expressam suas mãos cruzadas no peito.

 

O Menino

            Entre a Virgem e a entrada da Gruta aparece o Menino envolto em panos colocado mais que em um presépio, em um sepulcro de forma tradicionalmente retilíneo. O Menino está envolto como numa mortalha. Evoca a figura mortuária, em concreto, a imagem de Lázaro que o presépio-sarcófago contribui para o evidenciar.

            «Está envolto em panos por quantos haviam revestido então as túnicas da piedade» (Romano o Melode XIII-14 e Gn 3,21).

            Os panos serão para os pastores sinal de reconhecimento do menino, como o serão sinal tangível da Ressurreição para as mulheres, Pedro e João ante o sepulcro vazio. (Lc 2, 13; Jo 20, 1ss)

            Os panos do menino são as vendas mortuárias que, depois, aparecerão espalhadas pelo sepulcro, quando ressuscitou. Este Menino é, doravante, o que vai vencer a morte com sua Ressurreição. Nascemos para morrer e ressuscitar com Ele.

            Já desde o princípio da Vida de Jesus, a Igreja o proclama Vencedor da Morte na representação de seu nascimento. É Ele o Sol das trevas que nos tirou dos braços da morte.

 

[...] «Seu corpo foi como um servo, jogado nos braços da morte, a quem o dragão infernal esperava devorar; tivera, no entanto, que vomitar aqueles que já havia devorado. Ele venceu a morte para sempre e secou as lágrimas dos olhos de todos». (S. Cirilo de Jerusalém. Catequese 12, 15).

 

«Da Virgem nasceu o Rei da Glória, revestido de púrpura de sua carne, que visitou os prisioneiros e proclamou a libertação aos quantos habitavam nas sombras». (S. João Damasceno, sermão 54).

 

«Como Jonas, no ventre da baleia, Cristo entrou na face da morte, como novo Adão, para recuperar a dracma perdida: o gênero humano. Os céus se inclinam até a profundeza dos abismos, nas profundas sombras do pecado. Chama portadora de luz, a carne de Deus, dissipa as sombras do inferno sob terra. A luz resplandece nas trevas, mas as sombras não a viram». (Orígenes).

 

Animais

            Os animais representam a palavra do Profeta Isaías: «O boi conhece seu dono e o asno o presépio de seu dono; Israel, no entanto, não entende, meu povo não tem conhecimento» (Is 1,3).

 

José

            Na parte inferior aparece José pensativo e afastado. Diante de um homem vestido com peles e apoiado em um bastão. José personifica o drama humano: o homem ante o mistério. José se interroga frente ao mistério.

 

Demônio-pastor

            A literatura apócrifa atribui a José esta dúvida, e o Pastor que fala com ele, apoiado num bastão, alimenta e confirma os pensamentos de José, já que é o diabo que suscita uma tormenta de sentimentos encontrados no interior de José. O diabo, vestido com peles de cabra, o tenta sobre a virgindade de Maria, dizendo-lhe, segundo os apócrifos: «como este bastão que eu levo não pode produzir brotos, do mesmo modo, um velho como tu não pode engendrar e uma virgem não pode engravidar».

            Como todo tentador é insinuante, amável e sedutor, aparece o diabo sob forma tranquila, coloquial e amistosa com José. Ele está vulnerável sobre a decisão que tem de tomar. Toda tentação nos faz vacilar, se nosso olhar não está posto em Cristo e sobre nós mesmos.

 

A árvore

            A tradição dá ao pastor o nome de Tirso. Na antiguidade pagã, tirso era um grande bastão, atributo típico de Dionísio e de seus sátiros e bacantes, entidades representativas do paganismo e do racionalismo.

            Junto ao pastor-demônio, há um arvoredo que brota de um tronco seco. «Um rebento brota do tronco de Jessé; um broto surge de suas raízes. Sobre ele repousará o Espírito do Senhor; por ele o Senhor resgatará o seu povo» (Is 11, 1-2)

            O Arvoredo representa uma resposta às palavras do pastor-demônio. «Deus não é escravo das leis que regulam a vegetação; é seu Criador e, se fez brotar a vara de Araão, muito mais, pode fazer com que uma Virgem floresça e dê frutos». (Cirilo de Jerusalém. Catequese XII, 28)

 

Nuvem

            Na parte superior do ícone apresenta-se uma nuvem que se retira para o céu. Os apócrifos contam que «no momento do nascimento, a nuvem que recobria a gruta se dissipou e apareceu uma grande luz que a vista não era capaz de suportar. Logo esta luz se diminuiu lentamente e apareceu o menino». Proto-evangelho de São Tiago 19, 2

            A nuvem evoca a presença de Deus que pôs nas sombras seu esconderijo. (Sl 17, 12) A nuvem é de grande tradição e de grande simbolismo no Antigo Testamento, e sempre revela a presença misteriosa de Deus. A Nuvem guia o povo de Israel pelo deserto até a Terra Prometida; a nuvem revela Deus no monte Sinai; no Monte Tabor, Jesus se transfigura tornando-se resplandecente como uma nuvem; na Ascensão, a nuvem vela a visão do Ressuscitado.

            Da nuvem, o céu aberto faz descer um facho de luz até a terra que se divide em três raios em direção ao o menino: é a Santíssima Trindade que se manifesta como luz. Ao mesmo tempo representa a estrela.

            Em alguns ícones aparece dentro uma pomba do Espírito, e em outros uma cruz: Jesus nasce para morrer e ressuscitar.

            «O Filho de Deus é o ícone vivo e idêntico do Pai através do qual tivemos acesso ao Pai. Nossa mente, iluminada pelo espírito, olha o Filho e, no Filho, como num ícone, contempla o Pai» (Macário Crisocéfalo).

 

A Estrela

            A estrela é a realização da Profecia de Isaias: «Levanta-te e resplandece, pois chegou tua luz; e a glória do Senhor amanhece sobre ti, entre a obscuridade envolve a terra e as trevas dos povos; sobre ti vem a aurora do Senhor» (Is 60,1-4).

Assombro do criado

            Está representado pelas ovelhas ou cabras que estão diante do menino que toca flauta e olham para o alto. Eles expressam o assombro da Criação diante de tão grande mistério: Deus se fez homem. Ninguém consegue prosseguir em sua ação natural, tal é o estupor e o temor do Universo que reconhece a presença de Deus e se extasia ante a sua misericórdia.

            A Criação fica transtornada diante de tanta maravilha. Isto vem narrado nos apócrifos: Proto-evangelho de São Tiago 18, 1-3 e no Hino das Grandes Horas da Natividade.

 

Os magos

            Sob os Anjos, que cantam a glória, aparecem à cavalo os três reis do Oriente, guiados por uma estrela que olham e que tem a forma de cruz dourada e gloriosa; seguem Aquele que morrerá e ressuscitará e dará a toda humanidade a entrada para a vida eterna.

            Os magos representam os homens excluídos da Antiga Aliança que o Novo Reino Messiânico ha de incluir. Os santos, os justos, ainda que não sejam de Israel, são agradáveis a Deus, e Cristo estende sua predileção e primogenitura a todos os povos, representados pelos magos.

            Os magos prefiguram as mulheres miróforas que, a caminho do sepulcro se animavam dizendo: «Apreciemo-No e O adoremos como os Magos, e levaremos como presentes unguentos Àquele que já não está envolto em panos, mas em uma mortalha» (Ode VI do Cânon das matinas da Ressurreição).

            Os magos, por sua vez, como as miróforas, se converteram em «divinas testemunhas que, ao retornar para as suas terras, anunciaram Cristo a todos». (Hino Akasthitos) de Romano Melode XII, 21.

            «Os Magos viram nas mãos da Virgem Aquele que plasmou com as suas mãos os homens; e compreendendo que era o Senhor, ainda que tivesse tomado a forma de servo,

apressaram-se a honrá-lo com um tríplice dom, como o Hino dos Serafins que o proclama três vezes Santo» (Hino Akasthitos - de Romano, o Melode XII, 21.).

            A tradição iconográfica transmitiu uma constante sobre os magos: a idade. Apresentam-no com semblantes: jovem, adulto e velho, representando assim as três idades do homem em uma única síntese visual.

 

Comadre-Eva

            Na parte inferior deste ícone há duas mulheres que preparam o banho do menino. Isto é influência da iconografia helenística que tanto influenciou a Arte Cristã.

            Tem ainda seu desenvolvimento cristão nos Apócrifos, na verdade, no Proto-evangelho de Santiago, 19 e 20. Ali se narra como uma parteira testemunhou a maternidade divina de Maria, e Salomé certifica a Virgindade de Maria e presta a ela sua ajuda banhando o Menino.

            Segundo a tradição, a comadre é Eva que, junto a Salomé, se ocupa do Menino. Eva dá a vida mortal, Maria a imortal. Maria põe nas mãos de Eva a Vida Imortal: seu Filho.

            Neste ícone, o menino se apresenta com feição de gente maior, com entradas nos cabelos porque é desde o princípio, verdadeiramente homem.

 

            O Menino Jesus do banho nas mãos de Eva, acentua sua debilidade e morte, sua humanidade. Como homem necessita de cuidados, atenções e cobre suas necessidades. É, portanto, homem, não só na aparência, mas, realmente. É a síntese de todo o ícone: Jesus Cristo, Deus e Homem.

 

Banho

            A Imagem do banho ganhou um significado todo especial: a imagem do Batismo. O recipiente onde o menino é banhado tem a forma de uma pia batismal, prefiguração de sua morte e descida aos infernos.

            O banho é como um enterro num sepulcro líquido, o mesmo em que está imerso o Cristo no ícone da Epifania.

            «No Sacramento do Batismo, o ato de imergir nas águas e voltar a sair, simboliza a descida aos infernos e a saída desta morada junto com Cristo» (S. João Crisóstomo Homilia 40).

            «Pelo batismo morremos, para ressuscitar com Ele» (Rm 6, 1-4).

 

Fonte: https://www.ecclesia.org.br/biblioteca/iconografia/meditando_natividade.html


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quinta-feira, 18 de dezembro de 2025

299 - Natal na Teologia dos Pais da Igreja

 

Estudo no Google Meet 
Isaac, Edson, Genisson, Nathalie, Marleide, Edmar e Lili
Oração das Vésperas 
Oração das Vésperas do 4° Domingo do Advento. 
Oração 
Estudo e oração 


Icone Bizantino de Belém. 
 

299

Natal na Teologia dos Pais da Igreja

 

1.      (Leão Magno – 390-461). “A bondade divina sempre olhou de vários modos e de muitas maneiras pelo bem do gênero humano, e são muitos os dons da sua providência, que na sua clemência concedeu nos séculos passados. Porém, nos últimos tempos superou os limites da sua habitual generosidade, quando, em Cristo, a própria Misericórdia desceu aos pecadores, a própria Verdade veio aos extraviados, e aos mortos veio a Vida. O Verbo, coeterno e igual ao Pai, assumiu a humildade da nossa natureza humana para nos unir à sua divindade, e Deus nascido de Deus, também nasceu de homem fazendo-se homem”.

 

2.      (Leão Magno – 390-461). “Nasceu hoje, irmãos, o nosso Salvador. Alegremo-nos! Não pode haver tristeza quando nasce a vida; a qual, destruindo o temor da morte, nos enche com a alegria da eternidade prometida. Ninguém está excluído da participação nesta alegria; a causa desta alegria é comum a todos, porque nosso Senhor, aquele que destrói o pecado e a morte, não tendo encontrado ninguém isento de pecado, a todos veio libertar. Exulte o santo porque está próxima a vitória; rejubile o pecador, porque é convidado ao perdão; reanime-se o pagão, porque é chamado à vida… Por isso é que, quando o Senhor nasceu, os anjos cantaram em alegria ‘glória a Deus nas alturas’ e anunciaram ‘paz na terra aos homens...’. Porque veem a Jerusalém celeste ser formada de todas as nações do mundo, obra inexprimível do amor divino, que, se dá tanto gozo aos anjos nas alturas do céu, que alegria não deverá dar aos homens cá na terra?”

 

3.      (Gregório de Nazianzo 329-390).  “Esta é a nossa festa. Isto celebramos hoje: a vinda de Deus ao meio dos homens, para que, também nós cheguemos a Deus… celebremos, pois, a festa: não uma festa popular, mas uma festa de Deus, não como o mundo quer, mas como Deus quer; não celebremos as nossas coisas mas as coisas daquele que é nosso Senhor”

 

4.      (Efrém, no século IV).  “O menino que se encontra na manjedoura … aquele que rompeu o jugo que a todos oprimia”. “Fazendo-se Ele mesmo servo para nos chamar à liberdade”.

 

5.      (Prudêncio, poeta hispânico do século IV). “Com crescente alegria brilhe o céu e dê-se parabéns a si a gozosa terra: de novo, passo a passo, sobre o astro do dia aos seus caminhos anteriores… Oh! Santo berço do teu presépio, eterno Rei, para sempre sagrado para todos os povos e pelos próprios animais sem voz reconhecida”

 

6.      Pedro Crisólogo  (406-450). “A virgem deu a luz, quem explicará? O Verbo se fez carne; quem explanará este mistério? Se o verbo de Deus vagiu na boca de uma criança, como poderá falar dele o homem cheio de imperfeição? Mas como a estrela iluminou os magos em busca da luz, assim a palavra do pregador deve dar a conhecer a seus ouvintes o nascimento de Deus, a fim de se regozijarem com o encontro com Cristo e, mais que perscrutarem  seus divinos segredos, honrarem com dádivas  o Menino-Deus. Orai irmãos meus, para que se digne crescer, pouco a pouco, em minha palavra, aquele que aceitou crescer num corpo como o nosso.”

 

7.      (Máximo de Turim - †423). “Preparemo-nos pois, irmãos, para acolher o Natal do Senhor, adornemo-nos com vestes puras e elegantes! Falo, claro está, das vestes da alma, não do corpo… Adornemo-nos não com seda, mas com obras boas! Pois as vestes elegantes ornam o corpo, mas não podem adornar a consciência; pois seria muito vergonhoso trazer sob elegantes vestes elegantes, uma consciência contaminada. Procuremos acima de tudo embelezar os nossos afetos íntimos, e poderemos então vestir belas roupas; lavemos as manchas da alma para usarmos dignamente roupas elegantes! Não adianta dar nas vistas pelas vestes se estamos sujos em pecados, porque quanto a consciência está escura, todo o corpo fica nas trevas”).

 

8.      (Romano Melode, poeta siríaco do século VI). “Terra e céu rejubilem juntamente, diante do Emanuel que os profetas anunciaram, tornado criança visível, que dorme num presépio”. “A alegria acaba de nascer numa gruta. Hoje os coros dos anjos unem-se a todas as nações para celebrar.... Hoje toda a humanidade, desde Adão, dança. Bendito seja Deus, recém-nascido”

 

9.      (Agostinho – 354-430).  “Hoje nasceu para nós o Salvador. Nasceu, portanto, para todo o mundo o verdadeiro sol. Deus Fez-se homem para que o homem se fizesse Deus. Para que o escravo se tornasse senhor, Deus assumiu a condição de servo. Habitou na terra o morador do céu para que o homem, habitante da terra, pudesse encontrar morada nos céus”

 

10.  (Agostinho – 354-430).  “Aquele que estava deitado na manjedoura fez-se frágil, mas não renunciou à sua condição divina; assumiu aquilo que não era, mas permaneceu aquilo que era. Eis que temos diante de nós Cristo menino: cresçamos juntamente com Ele”

 

11.  (Agostinho – 354-430).  “Chama-se dia do Natal do Senhor a data em que a Sabedoria de Deus se manifestou como criança e a Palavra de Deus, sem palavras, imitou a voz da carne. A divindade oculta foi anunciada aos pastores pela voz dos anjos e indicada aos magos pelo testemunho do firmamento. Com esta festividade anual celebramos, pois, o dia em que se realizou a profecia: A verdade brotou da terra e a justiça desceu do céu” (Sl 84.12).

 

12.  (Agostinho – 354-430). “Reconheçamos o verdadeiro dia e tornemo-nos dia! Éramos, na verdade, noite quando vivíamos sem a fé em Cristo. E uma vez que a falta de fé envolvia, como uma noite, o mundo inteiro, aumentando a fé a noite veio a diminuir. Por isso, com o dia de Natal de Jesus nosso Senhor a noite começa a diminuir e o dia cresce. Por isso, irmãos, festejemos solenemente este dia; mas não como os pagãos que o festejam por causa do astro solar; mas festejemo-lo por causa daquele que criou este sol. Aquele que é o Verbo feito carne, para poder viver, em nosso benefício, sob este sol: sob este sol com o corpo, porque o seu poder continua a dominar o universo inteiro do qual criou também o sol. Por outro lado, Cristo com o seu corpo está acima deste sol que é adorado, pelos cegos de inteligência, no lugar de Deus que não conseguem ver o verdadeiro sol de justiça” .

 

13.  (Agostinho – 354-430).  “Ele está deitado numa manjedoura, mas contém o universo inteiro; mama num seio materno, mas é o pão dos anjos; veio em pobres panos, mas reveste-nos de imortalidade; é amamentado, mas é também adorado; não encontrou lugar na estalagem, mas constrói para si um templo no coração dos seus fiéis. Tudo isto para que a fraqueza se tornasse forte e a prepotência se tornasse fraqueza. Por isso, não só não menosprezamos, mas mais admiramos o seu nascimento corporal e reconhecemos neste acontecimento quanto a sua imensa dignidade se humilhou por nós”

 

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