terça-feira, 1 de outubro de 2019

113 - Orígenes de Alexandria (185-253) As Homilias sobre São Lucas (Homilia 24, 25)


Resultado de imagem para icone batismo do Senhor

113
Estudo sobre os Pais da Igreja: Vida e Obra
Orígenes de Alexandria (185-253)
As Homilias sobre São Lucas (Homilia 24, 25)


HOMILIA 24 - Lc 3.16
Sobre o que está escrito: “Quanto a mim, evidentemente vos batizo na água” até aquela passagem que diz: “Ele vos batizará no Espírito Santo e no fogo”.

O mistério do batismo
O povo acolheu João, que era menor que o Cristo, pensando e imaginando que ele talvez fosse o Cristo.
Mas não recebeu aquele que tinha vindo e que era maior que João. Queres saber a causa? Ei-la: o povo via o batismo de João, [mas] o batismo de Cristo era invisível.
“Pois eu, dizia João, vos batizo na água; quem vem, porém, depois de mim, é maior que eu, esse vos batizará no Espírito Santo e no fogo.
Quando Jesus batiza “no Espírito Santo”, e quando, por outro lado, batiza “no fogo”? É num só e mesmo instante que ele batiza “no Espírito Santo e no fogo”, ou é em momentos distintos e diferentes?
“Vós sereis batizados no Espírito Santo não daqui a muitos dias”. Os apóstolos foram batizados “no Espírito Santo” depois da sua ascensão aos céus, mas a Escritura não menciona que eles tenham sido batizados “no fogo”.
Mas do mesmo modo que João, às margens do Jordão, esperava os que vinham receber o batismo e enxotava os outros com estas palavras: “Raça de víboras”, e o que se segue, enquanto admitia os que confessavam seus vícios e seus pecados, assim o Senhor Jesus estará de pé no rio de fogo.
Aí ele estará com a “espada flamejante”, de modo que quem quer que seja que, saindo desta vida, deseje passar para o paraíso e tenha necessidade de purificação, ele o batiza neste rio e o faz chegar ao lugar de seu desejo.
Mas aquele que não traz o signo dos batismos anteriores, ele não o batizará no banho de fogo. Pois é necessário ser primeiramente batizado “na água e no Espírito”, para poder, chegando ao rio de fogo, mostrar que se conservaram as purificações “da água e do Espírito” e, desde então, merecer receber também o batismo do fogo no Cristo Jesus “a quem pertencem a glória e o poder nos séculos dos séculos. Amém”.

HOMILIA 25 - Lc 3.15
Sobre a dúvida que o povo tinha a respeito de João, “se não era ele próprio o Cristo?”

Caridade ordenada
Mesmo o amor oferece um perigo, se ultrapassa a medida. Aquele que ama alguém deve, com efeito, considerar a natureza e os motivos do amor e não amar alguém mais do que ele merece.
Pois se transcender a medida e a conveniência na caridade, tanto aquele que ama quanto aquele que é amado estarão em pecado.
Para que isso se torne mais claro, citemos como exemplo João.
O povo o admirava e o amava; e certamente ele – que havia vivido de modo tão diferente de todos os mortais – era digno de admiração e de que se lhe fosse concedida mais admiração do que a outros homens.
Nós todos não nos contentamos com uma comida simples, sem tempero, mas buscamos o prazer de uma alimentação variada; um único vinho para beber não nos basta, mas compramos vinhos de diferentes gostos.
Mas João se alimentava sempre “de gafanhotos”, sempre “de mel silvestre”; e contentava-se com uma simples e frugal comida, para que não engordasse seu corpo com iguarias muito gordurosas nem se tornasse pesado com refeições muito refinadas.
Porque nossos corpos são de uma natureza tal que se tornam pesados com uma alimentação supérflua; e, quando o corpo tiver sido tornado pesado, a alma também – difusa pelo corpo inteiro e sujeita aos seus achaques – sofrerá esse ônus.
Por isso, com razão é preceituado àqueles que o podem observar: “É bom não comer carne nem beber vinho e nada fazer que possa escandalizar teu irmão”.
Portanto, a vida de João era admirável e muito diferente do modo de vida dos outros homens. Ele não possuía nem bolsa, nem servo, nem mesmo uma miserável choupana.
Ele morava no deserto, não apenas “até o dia de sua manifestação a Israel”, mas também naquele tempo em que pregava a conversão ao povo, estava ainda no deserto da Judeia e desalterava-se com água clara, para que fosse diferente dos outros até na escolha de sua bebida.
Nós que vivemos nas cidades, que estamos no meio das multidões, buscamos a elegância no vestuário, na alimentação e na moradia. Mas aquele que morava no deserto, vede com qual vestimenta se vestiu: tinha feito para si uma túnica “com pelos de camelos”, e estava cingido “com um cinto de couro”.
Todas as coisas, portanto, nele eram inéditas, e por causa de sua extraordinária vida, todos os que o viam se admiravam dele e, admirando-o, cultuavam-no com muita paixão em todas as coisas, porque batizava “para a remissão dos pecados” os que se arrependiam.

Os excessos do amor
Por tudo isso, evidentemente, eles o amavam com muito bons motivos. Mas em sua caridade, não guardavam uma justa medida: cogitavam, com efeito, “se por acaso ele não era o Cristo”.
Precavendo-se contra esse amor desordenado e não espiritual, o apóstolo Paulo dizia a respeito de si mesmo: “Temo, porém, que alguém faça de mim uma ideia superior ao que se vê ou se ouve de mim; e que a grandeza das revelações não me encha de orgulho”, e o que se segue.
Temendo incorrer também ele próprio nesse defeito, Paulo não queria revelar de si mesmo tudo o que sabia, para que alguém não tivesse dele um julgamento superior ao que pudesse observar e que, excedendo a medida da honra, dissesse o que fora dito sobre João: “Que ele fosse o Cristo”.
É o que, evidentemente, vários disseram também de Dositeu, heresiarca dos samaritanos; mas outros também o disseram de Judas, o galileu.
 Finalmente, alguns prorromperam, em tamanho excesso no amor que imaginaram a respeito de Paulo, extravagâncias inauditas e sem precedentes.
Alguns dizem, com efeito, que o que está escrito, “sentar-se à direita e à esquerda do Salvador”, se aplica a Paulo e a Marcião: Paulo se assentaria à direita, Marcião se assentaria à esquerda.
Em seguida, outros que leem: “Eu vos enviarei um intercessor, o Espírito da verdade”, não querem ver nisso a terceira pessoa, distinta do Pai e do Filho, e a sublimidade da natureza divina, mas o Apóstolo Paulo.
Acaso todos não te parecem ter amado mais do que convém e, enquanto admiram a virtude de um e de outro, ter perdido a medida do amor?
Por certo, nós sofremos desse excesso em nossa Igreja: enquanto muitos amam-nos mais do que merecemos, proferem a torto e a direito essas coisas, louvando nossos discursos e nossa doutrina, julgamentos que nossa consciência não aceita.
Seguramente outros caluniam nossas homilias e nos incriminam de professar opiniões que nunca soubemos ter professado.
Mas nem aqueles que nos amam nos amam em excesso, nem aqueles que nos odeiam guardam a regra da verdade; e, uns através do amor, outros através do ódio, mentem.
Por isso, é necessário pôr um freio também ao amor, tanto para não lhe permitir a liberdade de vagar errante quanto para que não se arruíne no despenhadeiro. Está escrito no Eclesiastes: “Não sejas excessivamente justo, não cogites pensamentos assaz vastos, para que não fiques talvez de boca aberta”.
Seguindo esse exemplo, posso dizer algo similar: não ames um homem “de todo o teu coração e com toda a tua alma e com todas as tuas forças”; não ames um anjo “de todo o teu coração, com toda a tua alma e com todas as tuas forças”; mas, segundo a palavra do Senhor, reserva este preceito para Deus unicamente: “Tu amarás o Senhor teu Deus de todo o teu coração, de toda a tua alma e com todas as tuas forças”.

O preceito do Senhor
Alguém me responderia e diria: “O Salvador preceituou: ‘Tu amarás o Senhor teu Deus de todo o teu coração, de toda a tua alma, com todas as tuas forças, e a teu próximo como a ti mesmo’. Quero amar também o Cristo; ensina-me, portanto, como amá-lo, pois, se o amo ‘de todo o meu coração, de toda a minha alma, com todas as minhas forças’, ajo contra o mandamento, amando assim outro diferente do único Deus. Se, ao contrário, amo o Cristo menos que o Pai todo-poderoso, temo ser identificado como ímpio e irreligioso contra ‘o primogênito de toda a criação’. Ensina-me e mostra-me a maneira como devo amar o Cristo, andando em meio aos dois extremos”.

Queres saber com qual amor Cristo deve ser amado?
Escuta brevemente! “Ama o Senhor teu Deus” em Cristo, e não penses que tu podes ter um amor diferente, um para com o Pai, outro para com o Filho.
Ama ao mesmo tempo Deus e o Cristo. Ama o Pai no Filho e o Filho no Pai, “de todo o teu coração, de toda a tua alma, com todas as tuas forças”.
Pois se alguém te interroga e diz: “prova isso que asseveras por meio da Escritura”, que ele ouça o apóstolo Paulo, que tinha um amor espiritual, dizendo: “Eu estou certo, com efeito, que nem a morte, nem a vida, nem os anjos, nem as potestades, nem os principados, nem o presente, nem o futuro, nem o poder, nem a altura, nem a profundidade, nem nenhuma outra criatura poderá me separar do amor de Deus que está em Cristo Jesus, nosso Senhor e Salvador”: “a quem pertencem a glória e o poder nos séculos dos séculos. Amém”.

O que você destaca no texto?
Como ele serve para sua espiritualidade?

Nenhum comentário:

Postar um comentário