domingo, 31 de outubro de 2021

Encontro 188 - Atanásio de Alexandria (285-373) - Sobre a Encarnação (Capítulo 5 – parte 2)

 


Encontro 188

Atanásio de Alexandria (285-373)

Sobre a Encarnação (Capítulo 5 – parte 2)

 

Outras testemunhas e reflexões sobre os milagres de Cristo

1.      Se tudo isso não lhes basta, deixem-se persuadir por outros textos de que eles mesmos dispõem. A quem se referem os profetas nesses termos: “Consenti em ser buscado pelos que não perguntavam por mim, consenti em ser encontrado pelos que não me procuravam. A uma nação que não invocava o meu nome eu disse: ‘Eis-me aqui!’ Todos os dias estendi as mãos a um povo desobediente e rebelde”? (Is 65,1-2; Rm

2.      10,20-21).

3.      Quem, pois, se revelou? Seja referido aos judeus! Se é do profeta que se trata, digam eles quando se escondeu para logo em seguida se mostrar! Quem é, portanto, esse profeta, que de invisível se tornou visível e estendeu as mãos na cruz? Nenhum dos justos, mas somente o Verbo de Deus, por natureza incorpóreo, fez-se por nossa causa visível corporalmente e por nós sofreu.

4.      E se isto não lhes é suficiente, outros testemunhos causem-lhes confusão, com manifesta refutação. Pois, diz a Escritura: “Fortalecei as mãos abatidas, revigorai os joelhos cambaleantes. Dizei aos corações conturbados: ‘Sede fortes, não temais.’ Eis que o vosso Deus vem para vingar-vos, ele vem para salvar-nos. Então abrir-se-ão os olhos dos cegos e os ouvidos dos surdos se desobstruirão; então o coxo saltará como o cervo e a língua dos surdo-mudos será ágil” (Is 35,3-6). Que replicar diante disso ou como encarar esses fatos? A profecia assinala a vinda de Deus, os milagres revelam a época de sua chegada. Que os cegos vejam, os coxos andem, os surdos ouçam e a língua dos mudos se torne ágil, tudo isso os profetas referem à vinda do Senhor. Digam-nos quando tais sinais se produziram em Israel, onde tal aconteceu na Judéia?

5.      Naaman, o leproso, foi curado, mas não houve surdo que ouvisse, nem coxo que andasse. Elias e Eliseu ressuscitaram mortos, mas não houve cego de nascença que recuperasse a vista. Certamente, grande milagre é ressuscitar um morto, mas o portento operado por eles não foram tão grandes quanto os que o Senhor realizou. E se a Escritura não omitiu a cura do leproso, nem a ressurreição do filho da viúva, sem dúvida se houvesse acontecido antes que um coxo andasse ou um cego visse, a Palavra de Deus não teria deixado de publicar também esses fatos. Visto que não há referências da Escritura a esse respeito, é claro que tais milagres não se haviam produzido anteriormente.

6.      Quando, então, sucederam, senão quando o próprio Verbo de Deus apareceu corporalmente? Quando, pois, veio ele, senão quando os coxos andaram, os mudos falaram com desembaraço, os surdos ouviram, os cegos de nascença viram claramente? Por essa razão, os judeus que o constataram e jamais haviam ouvido falar de fatos idênticos, diziam: “Jamais se ouviu dizer que alguém tenha aberto os olhos a cego de nascença. Se este homem não fosse de Deus, nada poderia fazer” (Jo 9,32-34).

7.      Talvez, incapazes de resistir diante da evidência, não negarão as Escrituras, entretanto assegurem que ainda esperam o Verbo, que é Deus, e ainda não veio. Eis o que eles repetem à porfia, sem saírem de sua ousada oposição aos fatos evidentes. Mas aqui também serão refutados, não por nós, mas por Daniel, que era muito prudente, e anuncia a época atual e o advento divino do Salvador, nesses termos: “Setenta semanas foram fixadas para o teu povo e a tua cidade santa para fazer cessar a transgressão e lacrar os pecados, para expiar e perdoar a iniquidade e instaurar justiça eterna, para selar visão e profeta e para ungir o santo dos santos. Ficarás sabendo, pois, e compreenderás isto, desde a promulgação do decreto sobre o retorno e a reconstrução de Jerusalém até o reino do Ungido” (Dn 9,24-25).

8.      Talvez pudessem encontrar pretextos nos outros profetas, e atribuir ao futuro o que foi escrito. Mas, que poderão dizer ou contrapor a este texto? Nele se indica o Cristo, não se anuncia o Ungido somente como homem, mas como o santo dos santos.  Jerusalém subsiste até a sua vinda, e em seguida cessam em Israel profeta e visão.

9.      Outrora tinham sido ungidos Davi, Salomão e Ezequias; mas então Jerusalém e o lugar santo subsistiam, e profetizavam Gad, Asaf, Natan, e após estes, Isaías, Oséias, Amós e outros profetas. Além disso, os ungidos eram denominados homens santos, e não: santo dos santos.

10.  Se, porém, apresentarem como objeção o cativeiro e que por causa deste Jerusalém não mais existia, que dirão acerca dos profetas? Com efeito, ao ser outrora o povo levado para Babilônia, viviam Daniel, Jeremias e Ezequiel, Ageu e Zacarias profetizavam.

11.  Pura invenção dos judeus, portanto, que transferem para o futuro fatos presentes. Quando cessaram em Israel profeta e visão, a não ser quando apareceu o santo dos santos, o Cristo? Sinal e marca considerável da presença do Verbo de Deus era não subsistir Jerusalém, não surgir profeta algum, nem revelação por meio de visão. E era perfeitamente exato.

12.  Pois, tendo chegado o que os sinais prenunciavam, que necessidade ainda havia destes sinais? Ao aparecer a realidade, para que ainda as sombras? Por esta razão, os profetas falaram até que chegasse a própria justiça, quem redime os pecados de todos. Jerusalém perdurou muito a fim de que os judeus ali considerassem as figuras da realidade futura.

13.  Mas, agora, com a vinda do santo dos santos, precisamente foram seladas visão e profecia e o reino de Jerusalém deixou de existir. Seus reis foram ungidos até que fosse também ungido o santo dos santos. Moisés profetizou que o reino de Jerusalém duraria até esta vinda, com essas palavras: “O cetro não se afastará de Judá, nem o bastão de chefe de entre seus pés, até que o tributo lhe seja trazido e ele é a expectativa das nações” (Gn 49,10).

14.  O próprio Salvador também exclamava: “Todos os profetas bem como a Lei profetizaram até João” (Mt 11,13). Se, portanto, agora ainda existem entre os judeus, rei, profeta e visão, eles têm razão de negar que Cristo tenha vindo; mas se não há mais rei, nem visão, se toda profecia está selada, se cidade e templo foram destruídos, por que são ímpios e transgressores a ponto de negar Cristo, causa desses eventos, apesar do que se passou? Por que, ao verificarem que os gentios abandonaram os ídolos e por meio de Cristo depositam esperança no Deus de Israel, eles renegam Cristo, oriundo segundo a carne da raiz de Jessé, a reinar de hoje em diante? Se os gentios adorassem outro Deus, sem confessar o Deus de Abraão, de Isaac, de Jacó e de Moisés, os judeus razoavelmente pretenderiam que Deus não veio.

15.  Entretanto, se o Deus adorado pelos gentios é idêntico ao que deu a Lei a Moisés, fez a promessa a Abraão, cujo Verbo os judeus rejeitaram, por que não o reconhecem, ou antes, por que recusam voluntariamente aceitar que o Senhor, prenunciado pela Escritura, resplandeceu na terra inteira e se mostrou presente no corpo? De fato, diz a Escritura: “O Senhor é Deus: ele nos ilumina” (Sl 117,27a) e ainda: “O Senhor enviou sua Palavra para curá-los” (Sl 106,20) e novamente: “Não foi um mensageiro ou um anjo, mas a sua própria face que os salvou” (Is 63,9).

16.  Seu estado assemelha-se ao de demente que veria a terra à luz do sol e negaria a existência do sol que a ilumina. O que restava fazer, se já viera aquele que esperavam? Chamar os pagãos? Mas, ele se antecipara neste chamado. Fazer cessar profeta, rei, visão? Também já haviam cessado. Denunciar a impiedade dos ídolos? De fato, denunciara e condenara. Aniquilar a morte? Ele a aniquilou.

17.  Do que competia a Cristo fazer, o que não fez? Que falta ainda, para os judeus se regozijarem e recusarem crer? No entanto, se, como vimos, eles não têm rei, nem profeta, nem Jerusalém, nem sacrifício, nem visão, e não obstante, a terra inteira está cheia do conhecimento de Deus, e os gentios rejeitam a impiedade para buscarem o Deus de Abraão, por meio do Verbo, nosso Senhor Jesus Cristo, faz-se evidente, até aos mais ousados, que Cristo já veio, que para todos os homens brilha inteiramente sua luz, e ele lhes ministra a respeito do Pai ensinamento verdadeiro e divino.

18.  Por este testemunho e outros mais, extraídos das divinas Escrituras, refutam-se as objeções dos judeus.

 

1.      O que destaco no texto e porquê?

2.      Como ele serve para a minha espiritualidade?

Nenhum comentário:

Postar um comentário